Mercado errou 95% das previsões sobre economia e Bolsa desde 2021

Economistas, especialistas e analistas de mercado fazem previsões sobre o câmbio, a inflação e a taxa de juros a todo momento. No início de cada ano, essas estimativas ganham uma atenção ainda maior.
O UOL fez um levantamento das estimativas feitas pelo mercado no início de cada ano para o Ibovespa, a taxa de juros Selic, o PIB (Produto Interno bruto) do país, a variação do dólar e da inflação, medida pelo IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo).
Foram levados em conta os anos de 2024, 2023, 2022 e 2021. Foi usado o primeiro boletim Focus, do Banco Central, de cada ano. O Focus é uma pesquisa feita semanalmente com mais de 100 economistas do mercado pelo BC. Para as previsões sobre a Bolsa de Valores e o Ibovespa, usamos a primeira edição de cada ano da pesquisa "LatAm Fund Manager Survey", feita pelo Bank Of America com gestores de fundos que aplicam no Brasil. Confira:
As previsões para 2025
- Ibovespa - A maioria vê o índice entre 110 mil e 140 mil pontos, só 9% estimam o Ibovespa acima de 140 mil pontos no fim de 2025
- Selic - sobe a 15%
- PIB - 2,02%
- Dólar - R$ 6,00
- Inflação - IPCA 4,99%
As previsões anteriores e os fatos:
2024
- Ibovespa - a principal aposta, feita por 48% dos entrevistados, era a de que o índice ficaria acima dos 140 mil pontos. Mas ele teve queda de 10,36%, a 120.283,40 pontos -- Errou
- Selic - Esperava-se terminar o ano com taxa de 9%. Os juros foram a 12,25% (a.a.) -- Errou
- PIB - A estimativa era de alta de 1,59%. O resultado de 2024 só sai em 7 de março. Mas a alta acumulada em quatro trimestres até 30 de setembro foi de 3,1%. -- Provavelmente deve errar
- Dólar - A previsão era de R$ 5,00 ao final do ano. A moeda finalizou 2024 a R$ 6,18, alta de 27,3%. Errou
- Inflação/IPCA - Estimava-se alta de 3,90%. Mas o índice foi a 4,83% no ano. -- Errou
2023
- Ibovespa - A principal aposta do mercado, repetida por 40% das projeções, era a de que o índice ficaria entre 110 mil pontos e 120 mil pontos. Mas 2023 fechou em alta de 22,28%, aos 134.185 pontos. -- Errou
- Selic - A estimativa era de 11,75% ao final de 2023. Fechou em 12,25%.-- Errou
- PIB - A previsão era de alta de 0,78%. Mas o PIB fechou em elevação de 2,9%, totalizando R$ 10,9 trilhões. -- Errou
- Dólar - Deveria finalizar o ano a R$ 5,28. Mas a moeda americana caiu 8,06%, encerrando o ano em R$ 4,85 -- Errou
- Inflação/IPCA - Estimava-se alta de 5,36%. O IPCA de 2023 ficou em 4,62%. -- Errou
2022
- Ibovespa - Maioria via o índice abaixo dos 120 mil pontos no fim de 2022. A Bolsa finalizou 2022 com alta de 4,69%, a 109.735 pontos -- Acertou
- Selic - A estimativa era terminar 2022 em 11,75% ao ano. A taxa subiu para 13,75%. -- Errou
- PIB - A previsão era de alta de 0,28%. Mas ela foi de 2,9% em relação a 2021. -- Errou
- Dólar - Esperava-se um dólar a R$ 5,60. A moeda encerrou 2022 com queda acumulada de 5,32%, cotada a R$ 5,27. -- Errou
- Inflação/IPCA - A previsão era de alta de 5,03%. A variação ficou em 5,79% - Errou
2021
- Ibovespa - A maioria (52%) via o Ibovespa encerrando 2021 acima de 120 mil pontos. O índice teve queda de 11,93%, fechando 2021 a 104.822,44 pontos. -- Errou
- Selic - A estimativa era terminar o ano com taxa de 3,25% anuais. Mas no encerramento, a taxa estava a 9,25% ao ano. -- Errou
- PIB - Previa-se alta de 3,41%. Mas o PIB chegou a R$ 9 trilhões, com crescimento de 4,8%. -- Errou
- Dólar - Esperava que a moeda terminasse 2021 a R$ 5. Mas a divisa subiu 7,47% sobre o real, encerrando o ano vendido a R$ 5,57. -- Errou
- Inflação/IPCA - A alta prevista era de 3,34%. A inflação ficou em 10,06% no ano. -- Errou
A taxa de erro é de 95%. De cada 20 quesitos analisados, o mercado só acertou uma vez, ao prever o bom desempenho da Bolsa em 2022.
Houve erros bem grosseiros, como em 2021. A estimativa era terminar o ano com taxa Selic em 3,25% anuais. Mas no encerramento, os juros haviam saltado para 9,25% ao ano.
Por que é tão difícil acertar?
Em uma economia emergente e instável como a brasileira isso é esperado. É o que diz Álvaro Bandeira, coordenador da Comissão de Economia da Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais do Brasil (Apimec). "Nós, economistas, precisamos ajustar previsões periodicamente", diz ele. É por isso que a pesquisa Focus é feita semanalmente, por exemplo.
A economia brasileira é mais difícil de prever porque ela é mais sensível a variações internacionais. Como o Brasil é exportador de bens primários (soja, minério, petróleo) para várias partes do mundo, entram na conta das previsões fatores que estão espalhados pelo mundo, como uma possível guerra, a paralisação de uma economia estrangeira (como aconteceu com a China).
O importante, segundo Claudia Moreno, especialista sênior de economia do C6 Bank é acertar a direção, e não o número em si. "Em 2023 a gente já estava prevendo que o dólar ia chegar a R$ 6 enquanto outras casas falavam em R$ 5,50", explica ela. Demorou mais do que o banco previa, mas a direção da previsão estava certa, diz a economista. "Quanto antes você conseguir prever essa direção, mais o investidor tem tempo de se preparar e ganhar dinheiro", afirma ela.
Como são feitas as estimativas?
As projeções são feitas com base em modelos estatísticos. Essas equações levam em conta dados do passado, disponíveis no momento, explica explica Rafael Ribeiro, professor de economia da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e pesquisador do Made (Centro de Pesquisa em Macroeconomia das Desigualdades), da FEA/USP (Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Atuária da Universidade de São Paulo).
Essa é umas das razões que podem levar a erro. "Todo mundo faz as projeções querendo acertar. Mas ninguém que prevê a inflação hoje sabe se vamos ter uma seca muito grande ou uma enchente como a do ano passado no Rio Grande do Sul", diz Rafael Ribeiro. No conjunto das variáveis que podem fazer as previsões darem errado, as mudanças climáticas cada vez mais desempenham um papel maior.
Além disso, esses modelos estatísticos são ajustados conforme a leitura do horizonte econômico dos profissionais que os realizam. "Ou seja, um economista pode dar maior peso para um fator que outro profissional, conforme a visão de mundo de cada um", explica o professor.
Existe inclinação política no mercado?
Ninguém quer fazer política com dados. As projeções são feitas para balizar os investimentos de bancos e casas de gestão de fortuna. Mudar um dado por conta de visão política pode gerar prejuízo para os economistas que fazem essas projeções. "Mas, como já disse antes, a visão de mundo acaba pesando de alguma maneira", explica Rafael Ribeiro.