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Partido Comunista quer reforçar economia de Cuba, mas sem soltar rédeas

20/04/2021 20h29

Lorena Cantó.

Havana, 20 abr (EFE).- Cumprida a anunciada aposentadoria política de Raúl Castro e outros ortodoxos correligionários de sua geração, o VIII Congresso do Partido Comunista de Cuba deixou poucas surpresas e a certeza de que fortalecer a economia do país é o maior desafio para a legenda.

O principal conclave do único partido permitido em Cuba foi concluído na última segunda-feira com a "continuidade revolucionária" como principal lema e o bastão de comando da legenda agora nas mãos de Miguel Diaz-Canel, presidente do país. A centralização de poderes é a mesma ocorrida nos tempos de Fidel e Raúl Castro.

É agora, com as cortinas abaixadas e as notas de "A Internacional" diluídas que se saberá, na prática, qual será o verdadeiro espaço de manobra - e audácia - que terá o primeiro líder cubano nascido após a Revolução de 1959, que herda um cenário muito difícil: a pior crise econômica em três décadas, a piora da animosidade com os Estados Unidos e o pior momento da pandemia de covid-19.

O Produto Interno Bruto (PIB) cubano despencou 11% no ano passado, os atrasos no pagamento da dívida externa estão se acumulando, e os cubanos estão vivendo exaustos, de fila em fila, tentando superar da melhor forma possível uma ampla escassez de alimentos a remédios.

Mas, em seu último discurso como líder do PCC, Raúl Castro traçou linhas vermelhas que deixaram claro que a mudança geracional não só não vai trazer mudanças ideológicas, como também não haverá mais abertura econômica do que a necessária.

A nova cúpula do partido, cuja composição foi anunciada na segunda-feira antes do encerramento do Congresso, rejuvenesceu sua idade média com a saída da velha guarda - a mais apegada à ortodoxia comunista - e parece buscar o equilíbrio entre os poderes econômico e militar.

Há uma figura que concentra ambas e cuja entrada na cúpula - chamada de Bureau Político - atraiu muita atenção: o brigadeiro general Luis Alberto Rodríguez López-Calleja, genro de Raúl Castro e chefe do conglomerado militar cubano Gaesa, que controla os bens econômicos mais valiosos do país.

Ele também está sob sanções dos Estados Unidos desde setembro de 2020.

"A saída definitiva da velha guarda deixa a Diaz-Canel um caminho claro para governar. A inclusão de Rodríguez López-Calleja no Bureau Político marca a importância da Gaesa como principal gerador de divisas para o país", diz o professor William Leo-Grande, da American University, de Washington.

Para o professor Arturo López-Levy, da Universidade Holy Names (Califórnia), o novo líder da legenda "tem a vantagem de ter ascendido passo a passo e, portanto, uma rede de colaboradores e aliados entre os líderes do partido e a simpatia do alto comando militar".

"O Bureau Político eleito reflete essa correlação de forças", com quatro generais de diferentes gerações e o primeiro-ministro, Manuel Marrero, "com quem o presidente passou a se entender". Marrero desenvolveu sua carreira no setor do turismo, que é crucial para os cofres do estado, mas ele é procedente do estamento militar.

Um movimento que passou mais despercebido, mas que também aborda mudanças é a completa renovação da secretaria do PCC, com perfis mais jovens em departamentos-chave como o agroalimentar e o Comitê Ideológico, este último liderado por um diplomata e jornalista experiente, Rogelio Polanco.

Contra o dogma de que o sistema político é imutável, Leo-Grande acredita que no Congresso houve uma "forte ênfase" no avanço das transformações econômicas, incluindo a metamorfose do setor estatal em um elemento verdadeiramente produtivo, que seria a "chave" para o sucesso a longo prazo das reformas e é, ao mesmo tempo, a parte que mais lentamente se moveu.

Os economistas, entretanto, enfatizam que o que é necessário é banir os monopólios estatais, abrindo mais espaço para a concorrência e o setor privado, utilizando a receita tributária para garantir as conquistas sociais do país.

"O PCC (Partido Comunista Cubano) tentará continuar dominando a vida política em municípios e províncias mais descentralizados e em empresas privadas e cooperativas, tanto quanto antes. Se não conseguir, será porque é obrigado a operar em um contexto diferente", disse López-Levy.

O analista acredita que "seria importante" para Washington colocar a hostilidade de lado e adotar a estratégia da União Europeia.

"Acompanhar as reformas que estão ocorrendo, encorajar os espaços de autonomia e a pluralização das abordagens", afirmou.

Na esfera econômica, também se destaca a saída do Bureau Político e de outras estruturas de poder do partido de Marino Murillo, o "czar" das reformas "raulistas" na última década.

Murillo foi a face mais visível da traumática "tarefa de ordenamento", uma unificação monetária e cambial acompanhada de uma reforma ascendente dos salários e preços que desencadeou inflação, agravando o descontentamento de uma população já insatisfeita com a dolarização parcial do comércio.

A tomada de decisões, de qualquer forma, está condenada ao consenso, porque "o modelo de 'Fidel ao leme', onde o carisma predominou sobre as instituições não foi repetido nem mesmo por Raúl e muito menos por Díaz-Canel, cujo mandato depende de promoções e canais institucionais, regras e normas", concluiu López-Levy.

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