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OPINIÃO

No Brasil, efeitos do Trumpnomics, versão do Reaganomics, devem ser mistos

do UOL

Colunista do UOL

06/11/2024 14h23

A forte reação inicial negativa dos mercados de ativos financeiros, à vitória de Donald Trump, no Brasil, nos demais países emergentes e no resto do mundo, nesta quarta-feira (6), é a que se esperava, caso o republicano ganhasse as eleições presidenciais americanas, como ocorreu.

Passado o impacto inicial da volta esmagadora de Trump ao comando dos Estados Unidos, e agora com menos freios, pelo domínio obtido no Congresso e o suporte de um Judiciário com Suprema Corte ultraconservadora, as cotações buscaram um caminho de ajuste.

Se é quase certo que nenhuma economia ao redor ficará imune aos impactos da reviravolta que Trump promete promover, é impossível prever e mais ainda determinar o saldo entre os desdobramentos negativos e positivos que a nova política econômica americana poderá acarretar. Pode-se, contudo, formular hipóteses.

O Brasil, que está na lista dos países em que economia apresenta maior potencial de ser afetada pelas mudanças de orientação nos Estados Unidos, não deverá fugir à regra. Do ponto de vista do ambiente econômico doméstico, um dólar mais forte, por exemplo, como se prevê, trará mais pressão sobre a inflação e as taxas de juros, um roteiro que costuma acabar em freios aos investimentos e à atividade econômica..

Uma contrapartida entre uma lista de contrapartidas, contudo, pode ser localizada no fato de que uma taxa de câmbio mais desvalorizada ajudaria a acelerar ainda mais as exportações, trazendo dólares e, no fim da linha, até aliviando as cotações da moeda americana.

Dólar mais puxado, ao lado de medidas de estímulo a exportadores e práticas comerciais passíveis de não serem consideradas "justas" são fragilidades que podem ser alvo de medidas protecionistas contra o Brasil.

Na Bolsa, os efeitos previsíveis tendem a ser mistos. Empresas como as siderúrgicas com unidades nos Estados Unidos, e outras, que exportam produtos fora das barreiras que podem ser criadas nos EUA, tendem a ser beneficiadas pelo protecionismo tarifário que Trump defende.

Também é possível imaginar um incremento forte nos investimentos chineses no Brasil. Um foco deverá ser o aumento da produção de veículos no país, em reação às pesadas barreiras de importação a produtos chineses nos EUA.

Pode-se imaginar, falando nisso, novos avanços nas relações comerciais e econômicas do Brasil com a China. Na verdade, não seria mais do que a intensificação de uma tendência já bem estabelecida. Pode-se também esperar maior proximidade do país com os Brics e mais estímulos a iniciativas de restrição da influência do dólar nos negócios internacionais.

Embora os Estados Unidos ainda sejam parceiro comercial brasileiro de peso, sobretudo quando se trata do comércio de manufaturados, faz tempo que a China, ainda que com concentração em commodities agrícolas e minerais, se mantém no topo da corrente de comércio brasileira com o mundo.

Todas essas hipóteses dependem do cumprimento das promessas de campanha de Trump. Se cumprir o que prometeu o mundo assistirá à instalação de uma política econômica que poderia ser chamada de Trumpnomics, tal a semelhança com o Reaganomics, implantado por Donald Reagan, ao assumir a presidência dos Estados Unidos em 1981, numa versão mais populista.

Do Reaganomics, que varreu os Estados Unidos e o mundo, a partir dos anos 80 do século passado, e deixou marcas por quase 30 anos, com o predomínio de políticas econômicas mais liberais, até o grande crash global de 2008, a receita prometida por Trump retoma principalmente a ideia de reduzir impostos para estimular a atividade doméstica e restringir o papel do Estado na economia e desidratar o suporte social a estratos mais vulneráveis da sociedade. As Bolsas de Valores, nos EUA, no dia seguinte da vitória de Trump, operam em alta

O Trumpnomics, contudo, resume uma política econômica contraditória. Internamente é ultraliberal, mas fortemente protecionista no comércio exterior, com a volta do slogan populista "America first" (A América em primeiro lugar) nos negócios com o resto do mundo.

Pelo menos num primeiro momento, o resultado deve produzir mais inflação nos EUA e, em consequência, maiores taxas de juros. Nesse cenário, o dólar tende a se fortalecer ante as demais moedas, com capitais globais se redirecionando para o mercado americano.

Sua implantação, se adotada na extensão prometida na campanha eleitoral imporia uma fase de isolacionismo econômico dos Estados Unidos, enfraquecimento das iniciativas multilaterais e um reordenamento de parcerias comerciais mundo afora, sem falar nas consequências do negacionismo de Trump diante da crise climática evidente, e nos riscos autocráticos, para os Estados Unidos e outros países, Brasil inclusive, que a eleição de Trump faz aflorar. Enfim, um ambiente mais instável e perigoso para o mundo.

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