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OPINIÃO

Governo e Congresso avançam no represamento de preços; risco fica para 2023

do UOL

14/06/2022 15h28

Ao mesmo tempo em que avançam no Congresso os esforços para limitar ou retirar impostos dos cálculos de tarifas de energia e na formação dos preços de combustíveis, mais evidente vai ficando que os impactos sobre a inflação e o bolso dos consumidores, se houver, serão apenas temporários. A principal razão é que as medidas não atingem os custos de produção e as margens de venda.

Em alinhamento com o Congresso, o governo do presidente Jair Bolsonaro tem batalhado pela redução do ICMS nos valores cobrados nas bombas de combustíveis e nas contas de luz. O imposto estadual é, de fato, o que mais pesa entre os tributos que oneram as tarifas de energia e os preços dos combustíveis.

O projeto de lei limita a cobrança do ICMS a uma alíquota máxima entre 17% e 18% tanto nos preços dos combustíveis quanto nas tarifas de energia, comunicações e transportes coletivos. Aprovado no Senado nesta segunda-feira (13), o projeto voltou para a Câmara, com um adendo segundo o qual o governo federal compensaria estados por perdas de arrecadação acima de 5% do que antes obtinham com tarifas de serviços públicos e combustíveis.

A conferir o que, afinal, será agora decidido sobre o tema na Câmara, mas desde já é quase unânime entre especialistas a convicção de que apenas o corte de tributos não afeta as questões estruturais que determinam as tarifas e os preços dos combustíveis. Sem falar que o espaço eventualmente aberto pela redução ou eliminação de tributos estimula a sua ocupação por jabutis variados, que aumentam custos e ineficiências.

Um exemplo desse tipo de situação é bem visível no processo que resultou na privatização da Eletrobras. Para fazer passar a medida no Congresso, o governo foi obrigado a aceitar a imposição da instalação de usinas termelétricas a gás em locais em que ainda não existem gasodutos. Custos e subsídios dessa decisão influenciarão, negativamente, nos valores das tarifas de energia.

Isso quer dizer que, quando muito, reduções em preços e tarifas serão temporários. Não entram na equação, ações ou medidas para reduzir custos de produção, nas tarifas de energia e nos preços dos combustíveis, ou o valor dos serviços, caso de transportes públicos e comunicação. No fim do roteiro, é uma grande volta ao mundo para não sair do lugar.

Não sair do lugar em relação ao peso no bolso do consumidor, mas com consequências e potencial de promover desarranjos nas contas públicas. Para os governos estaduais, por exemplo, instala-se um problema agudo de redução de recursos sem redução nas obrigações. O grosso do atendimento de saúde, educação e segurança pública é provido pelos estados, e o ICMS é a principal fonte de recursos para sustentar essa obrigação. Cerca de 70% da arrecadação dos estados vêm do ICMS, e desse total, em média, 20% têm origem no tributo embutido nos combustíveis.

Nos planos do governo para conter a inflação, represando preços com a retirada temporária de tributos, a fixação de uma alíquota máxima de ICMS entre 17% e 18% para tarifas de serviços públicos e preços de combustíveis é insuficiente. A intenção do governo é zerar o ICMS no diesel e no gás de botijão, temporariamente, até o fim do ano.

Para tanto, se propõe a promover um novo desarranjo nas contas públicas. Isso porque o governo acena com a possibilidade de queimar algo como R$ 60 bilhões em compensações aos estados, o dobro do capital obtido com a diluição de suas ações na Eletrobras. Tal movimento obrigará a edição de mais uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição), com a qual seria possível uma nova quebra da regra do teto de gastos.

Estimativas de mercado indicam que a manobra poderá resultar em corte de até dois pontos percentuais na variação do IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) projetada para 2022. De acordo com essas previsões, em vez de avançar até 9% no ano, a inflação fecharia com alta em torno de 7%. Ainda assim acima de 5%, o teto do intervalo de tolerância do sistema de metas de inflação para 2022.

No preço do diesel, em resumo, significaria um corte de R$ 1 por litro. Esta redução seria consumida com qualquer aumento acima de 10% nos demais custos de produção, repasse de defasagens em dólar, ou apropriação de margens de venda.

Na contramão do pequeno benefício obtido, especialistas também são quase unânimes em apontar riscos de uma ressaca inflacionária em 2023, quando as restrições forem suspensas. A saída de represamentos de preços costuma produzir fortes pressões inflacionárias. A origem delas se localiza justamente na tentativa de conter preços sem o devido equilíbrio entre oferta e procura.

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