Moraes dá 24 horas para Prefeitura de SP explicar muro na 'cracolândia'

O ministro do STF Alexandre de Moraes determinou nesta quinta-feira (16) que o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes, explique em até 24 horas a construção de um muro na rua dos Protestantes, na "cracolândia", na região central da capital paulista.
O que aconteceu
Determinação ocorreu após pedido de políticos do PSOL de São Paulo. Foi solicitado ao ministro, que é relator de uma ação na Corte sobre a Política Nacional para a População em Situação de Rua, que o muro fosse demolido. O documento foi assinado pela deputada federal Luciene Cavalcante, o deputado estadual Carlos Giannazi e pelo vereador da capital paulista Celso Giannazi.
Na quarta-feira (16), a Defensoria Pública do Estado de São Paulo recomendou à prefeitura a retirada de gradis e demais barreiras físicas instaladas na região. O pedido abarcaria inclusive o muro construído no cruzamento da rua dos Protestantes com a General Couto de Magalhães, que tem 40 metros de comprimento por 2,5 metros de altura.
Recomendação da Defensoria afirma que as instalações representam "arquitetura hostil", com "finalidade espúria de afastar a população em situação de rua". Segundo o órgão, a estratégia "já foi adotada em outras oportunidades e não há qualquer comprovação de sua eficiência para atingir os objetivos declarados [pela Prefeitura] de melhor atender os usuários". A Defensoria cita que há também "desproporcionalidade da medida comparada a outras que possam ser adotadas pela municipalidade".
Ontem mais cedo, Nunes declarou que o muro foi erguido para substituir tapumes de metal. O prefeito disse que local está cercado há muito tempo. "Ali tinha um tapume, tem mais de um ano. Era um negócio de ferro e colocou um muro", afirmou o prefeito em entrevista ao site Exame.
A reportagem tenta um novo contato com a prefeitura. O texto será atualizado tão logo haja manifestação.
Entidades criticam iniciativa
Entidades que atuam no local alegam que a obra teve como objetivo isolar os usuários e dificultar os trabalhos de assistência. O padre Julio Lancellotti, coordenador da Pastoral do Povo de Rua de São Paulo, descreve a construção como o "muro da vergonha". "Em vez criar portas para sair, portas para entrar, pontes para mudar, criam-se muros para segregar. Isso não é solução", disse nas redes sociais.
A ONG Craco Resiste também criticou a medida. "O espaço que foi delimitado para que as pessoas fiquem concentradas não conta com nenhum banheiro ou ponto de água potável próximo. Durante as revistas coletivas são tomados diversos objetos pessoais dessa população, sem nenhum critério objetivo claro, enquanto os guardas proferem xingamentos contra as pessoas", afirmou em nota.
Segundo o psiquiatra Flavio Falcone, o efeito da construção do muro foi espalhar ainda mais os usuários. "Sou morador do centro, moro na [Avenida] Duque de Caxias, e o que vejo, principalmente de dezembro para cá, é que o fluxo está completamente espalhado", falou o médico, que trabalha com pessoas em situação de rua desde 2007 e atua na Cracolândia há mais de uma década.
Falcone afirma que a nova configuração tem dificultado inclusive o tratamento dos usuários. "Não consigo entender a relação do muro com dar mais segurança às equipes e melhorar o atendimento. As equipes dos consultórios de rua não entram no fluxo", disse.
O Ministério Público de São Paulo (MP-SP) afirmou que a Promotoria de Justiça de Habitação e Urbanismo da Capital vai apurar o caso.
(Com Estadão Conteúdo)