Morte de Giscard d'Estaing: líderes saúdam "o presidente da modernidade"
Mais jovem presidente da França, quando foi eleito, em 1974, Valéry Giscard d'Estaing morreu na noite de quarta-feira (2), aos 94 anos, por complicações relacionadas à Covid-19. Desde o anúncio de sua morte, homenagens se multiplicam, saudando o papel de "modernizador da sociedade francesa" encarnado pelo ex-líder da centro direita conhecido pela legalização do aborto, entre outros.
Toda a classe política francesa lembra, nesta quinta-feira (3), as principais façanhas de Giscard d'Estaing, considerado como um grande reformista. Ele foi o responsável por importantes reformas sociais, como a legalização do aborto e do divórcio por consentimento mútuo, a criação da primeira secretaria de Estado dedicada à mulher e a redução da idade mínima de votação de 21 anos para 18 anos.
Em um longo comunicado, o presidente francês Emmanuel Macron elogiou as motivações progressistas de Giscard d'Estaing que, em sete anos de governo "transformou a França". "Seu mandato foi um momento de intensas reformas. Esse que hoje chamamos de VGE [iniciais do nome do ex-presidente] soube modernizar a função de chefe de Estado e olhar dentro dos olhos da França", escreveu.
Segundo Macron, o ex-presidente "transformou a França". "Ele permitiu aos jovens o direito de votarem aos 18 anos, às mulheres de interromper uma gravidez não desejada, em toda a legalidade, aos casais de se divorciarem por consentimento mútuo, às pessoas com deficiência de obter novos direitos. Ele trabalhou por uma Europa mais forte, por uma parceria franco-alemã mais unida e contribuiu para estabilizar a vida econômica e política internacional fundando o G7", reiterou.
Reformas na sociedade
O primeiro-ministro francês, Jean Castex, saudou "um homem do progresso e da liberdade", cujas "reformas sociais permanecem atuais". Além de uma "política econômica e social marcada pelo voluntarismo e pela solidariedade", ele fez "avançar, de maneira significativa a construção europeia e o destaque internacional da França".
Outros dois ex-presidentes também se pronunciaram publicamente sobre a morte de Giscard d'Estaing. Para o socialista François Hollande, que exerceu seu mandato entre 2012 e 2017, "o país perdeu um homem de Estado que fez a escolha da abertura ao mundo e que pensava que a Europa era a condição para que a França se tornasse maior". Já segundo o conservador Nicolas Sarkozy, que governou entre 2007 e 2012, VGE "dedicou toda a sua vida para reforçar os laços entre as nações europeias, buscando e conseguindo modernizar a vida política, e consagrou sua inteligência à análise das problemáticas internacionais mais complexas".
Representantes de outras tendências políticas também reagiram. No Twitter, a líder da extrema direita Marine Le Pen, que é candidata às próximas eleições presidenciais na França, em 2022, prestou condolências. "Presidente de uma França em crise, ele foi o artesão de novas liberdades públicas e um ardente apoiador do progresso tecnológico. Em 2018, confessou que seu maior erro foi instaurar o reagrupamento familiar", publicou, referindo-se à lei que permite que um estrangeiro que possui a carteira de residente possa trazer sua família para viver no país.
Classe política europeia
Em toda a Europa, líderes e representantes também prestam homenagem ao ex-presidente. A chanceler alemã, Angela Merkel, prestou condolências, chamando VGE "amigo". "Com Valéry Giscard d'Estaing, a França perdeu um homem de Estado, a Alemanha um amigo e todos nós perdemos um grande europeu". Durante seu governo, o ex-chefe de Estado teve um papel decisivo no estreitamento de laços com os alemães.
O primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, saudou "um grande modernizador da França, cujo trabalho marcou as gerações seguintes". "Durante sua presidência, ele foi também o arquiteto do que se tornou hoje o G7", reiterou o premiê no Twitter.
Dirigentes do bloco, como a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, lembraram que VGE era "um grande europeu que vai continuar nos inspirando". O presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, lembrou que Giscard d'Estaing concretizou "o sonho de uma Europa mais integrada". "Ele criou o Conselho Europeu, que determinou os fundamentos da união monetária, ou seja, do euro", afirmou.
Imprensa lembra maus momentos de VGE
Boa parte dos jornais desta quinta-feira (3) já havia sido impressa quando a morte do ex-presidente foi anunciada. Poucas edições conseguiram inserir a notícia em suas versões impressas.
No vespertino Le Monde, o editorial afirma que o ex-chefe de Estado era um líder incompreendido. Contrastando com as múltiplas homenagens que VGE recebeu nesta quinta-feira, o diário destaca que, na época em que governou, ele era visto como um líder "brilhante, mas egocêntrico, hipersensível e isolado". "Seus próximos o admiravam, mas poucos gostavam dele", afirma o editorial.
Já em seu site, o jornal Libération lembra a impopularidade de Giscard d'Estaing quando deixou a presidência, sete anos após assumi-la, em 1981. Na época, a França enfrentava um grave crise econômica, com altos índices de desemprego. "Mas seu mandato ficou manchado pelo pecado capital do presidente, a arrogância", destaca.
O jornal Le Figaro lembra outro episódio que abalou a imagem do ex-líder: "o caso dos diamantes", revelado pelo jornal Le Canard Enchaîné. Segundo o diário, na época em que era ministro da Economia, em 1973, VGE foi presenteado, em segredo, pelo então presidente da República Centroafricana, o marechal Jean-Bedel Bokassa , com uma placa de diamantes de 30 quilates. Quando veio à tona, o escândalo foi tratado "com desdém e silêncio", pelo ex-chefe de Estado.
Au revoir
Na época, ele era acusado de ter "comportamento de um monarca", reitera a matéria. Pouco tempo depois, ao tentar se reeleger, VGE foi derrotado pelo socialista François Mitterrand.
Em seu último pronunciamento à França, d'Estaing finalizou seu discurso com um teatral "au revoir" (adeus), levantando-se e deixando a cadeira vazia - uma cena que entrou para a história, lembra Le Figaro. Dias, depois, o ex-líder deixaria o Palácio do Eliseu, sede da presidência francesa, da mesma forma como entrou: a pé.
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