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Artigo que relaciona vacina e risco de morte é questionado por cientistas

22.jan.2025 - Especialistas questionam metodologia e conclusão do estudo; revista incluiu "expressão de preocupação" sobre o artigo - Arte/UOL sobre Reprodução/Instagram
22.jan.2025 - Especialistas questionam metodologia e conclusão do estudo; revista incluiu "expressão de preocupação" sobre o artigo Imagem: Arte/UOL sobre Reprodução/Instagram
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Do UOL, no Rio

22/01/2025 15h59

A Fiocruz, o Ministério da Saúde e especialistas apontam uma série de falhas em estudo que relaciona risco de aumento de morte em pessoas vacinadas contra covid-19. Segundo os cientistas, o estudo apresenta erros metodológicos como, por exemplo, na escolha inadequada do banco de dados, na seleção da amostra, na temporalidade e nas informações que foram comparadas.

O artigo tem sido divulgado por uma instituição de médicos negacionistas. A revista científica que publicou o estudo incluiu uma correção com uma "expressão de preocupação" e disse que investiga o conteúdo.

O que diz o post

Vídeos nas redes sociais compartilham matérias com o título: "Fiocruz: após um ano, vacinados contra covid-19 tiveram mais chances de morrer". Neles, um homem relata o conteúdo do texto. O vídeo possui as seguintes legendas: "A verdade sobre a vacina da Covid-19 que não quiseram admitir" e "Quem vacinou teve mais chances de morrer".

O artigo "Avaliação do risco de mortalidade pós-COVID em casos classificados como síndrome respiratória aguda grave no Brasil: um estudo longitudinal de médio e longo prazo" (aqui - em inglês) é assinado por duas pesquisadoras, uma da Fiocruz e outra da UFRJ.

Por que é distorcido

Fiocruz e o Ministério da Saúde apontam série de erros metodológicos em artigo. O Departamento de Epidemiologia e Métodos Quantitativos em Saúde da Fiocruz entende que os problemas na pesquisa "invalidam seus resultados e conclusões". "Esse conjunto de falhas metodológicas inviabiliza qualquer interpretação dos resultados produzidos pelo referido estudo", destaca a nota da Fiocruz, divulgada no dia 16 (aqui). Já o Ministério da Saúde observou em nota (aqui) que o artigo "possui diversas limitações e erros sistemáticos que não foram considerados pelas autoras" - veja detalhamento abaixo.

Revista científica adicionou correção. O Comitê de Acompanhamento Técnico-Científico das Iniciativas Associadas a Vacinas para a covid-19, formado por pesquisadores da Fiocruz, da UFRJ, da USP e da UFG, enviou à revista Frontiers in Medicine, na qual o estudo foi publicado, uma nota questionando o artigo. Segundo o comitê, o estudo "apresenta conclusões baseadas em metodologias falhas e podem contribuir para uma maior desconfiança em relação às vacinas". Após a repercussão, a revista adicionou uma "manifestação de preocupação" no artigo e diz que está revisando o conteúdo (aqui - em inglês - e abaixo, já traduzido para o português).

22.jan.2025 - Revista na qual artigo foi publicado fez "manifestação de preocupação" e abriu investigação, como mostra declaração em inglês e traduzida para o português - UOL Confere - UOL Confere
22.jan.2025 - Revista na qual artigo foi publicado fez "manifestação de preocupação" e abriu investigação, como mostra declaração em inglês e traduzida para o português
Imagem: UOL Confere

Banco de dados inadequado, apontam especialistas. Entre os erros apontados por especialistas estão a seleção inadequada do banco de dados e vieses, que são erros sistemáticos, segundo o infectologista Julio Croda. Isso foi identificado na amostra, no período analisado e nas informações utilizadas. Segundo os profissionais, a análise utilizou como fonte os dados do Sivep (Sistema de Informação de Vigilância Epidemiológica) Gripe, que não possui informações suficientes sobre vacinação. "A vacina pode ter sido aplicada antes da hospitalização ou depois, ou no período de três meses", explica Croda. O médico afirma que a análise deveria ter sido feita apenas entre pessoas que foram vacinadas antes da hospitalização, o que não foi levado em conta.

Tem um viés de seleção, porque selecionou só os pacientes que tiveram sintomas e morreram três meses depois desse sintoma, isso representa 0,07%. Essa seleção de amostra gera outros vieses importantes. Julio Croda, consultor da Sociedade Brasileira de Infectologia

Tem desde viés de seleção, viés de sobrevida ao tempo de não morte, as pessoas com covid muitas morriam, então não tem como acompanhar e fazer essa comparação com quem tomou a vacina. É comparar dados que não podem ser comparados. Isabella Ballalai, diretora da Sociedade Brasileira de Imunizações

(...) a base de dados utilizada não é apropriada para a análise de eficácia e segurança das vacinas para óbitos após um quadro de SRAG, uma vez que seu propósito é a notificação destes casos agudos até o seu desfecho direto (alta hospitalar ou óbito). A base de dados oficial para o registro de óbitos é o Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM), que utiliza declarações de óbitos e realiza a codificação das causas de morte de forma sistemática. Trecho de nota do Ministério da Saúde

"Amostra reduzida", entende Ministério da Saúde. O estudo considerou cerca de de 5 mil registros para a amostra, sendo que houve mais de 700 mil óbitos no período analisado, observa o MS. "O trabalho não faz um detalhamento sobre a caracterização da amostra e não apresenta justificativas claras para as exclusões realizadas, o que compromete a transparência e a interpretação dos resultados", complementa o Ministério da Saúde.

Fiocruz e UFRJ reafirmam segurança das vacinas. As duas instituições publicaram notas reforçando a segurança e efetividade dos imunizantes contra covid-19 (aqui e aqui).

O UOL Confere procurou as pesquisadoras responsáveis pelo estudo por e-mail, mas não obteve resposta até a publicação desta matéria. Para o Estadão Verifica (aqui), as autoras do estudo, Nádia Cristina Pinheiro Rodrigues e Mônica Kramer de Noronha Andrade, afirmam que o artigo não é contrário à vacinação contra a covid-19. Elas afirmam que destacaram o efeito protetor da vacinação a médio prazo, porém, a longo prazo, encontraram resultados que divergiam. "Mas, ao invés de concluir precipitadamente sobre as causas dessas discrepâncias, apresentamos uma longa discussão sobre as possíveis explicações, sem nunca afirmar que a vacina foi a causa do aumento da mortalidade", dizem as autoras.

Pesquisadoras dizem ainda que conclusão delas é "clara". Ainda para o Estadão Verifica, Nádia Cristina Pinheiro Rodrigues e Mônica Kramer de Noronha Andrade dizem que "não há evidência para estabelecer uma relação causal entre vacinação e aumento da mortalidade, e essa questão precisa ser melhor investigada". Sobre os erros metodológicos apontados, elas afirmam que muitas das contribuições foram consideradas e que solicitaram à revista uma atualização do artigo para contemplar algumas dessas questões.

Viralização. Uma postagem acumulava nesta quarta-feira (22) mais de 680 mil visualizações, 50,9 mil compartilhamentos, 32 mil curtidas e 2.450 comentários.

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