Por virada, Boulos recicla ações de Lula e adota estratégias de Marçal
Para tentar uma virada no segundo turno, o candidato à Prefeitura de São Paulo Guilherme Boulos (PSOL) tem reciclado ações feitas por Lula (PT) em eleições passadas e adotado estratégias de Pablo Marçal (PRTB), derrotado no primeiro turno.
O que aconteceu
O psolista tentou reeditar a carta feita por Lula em 2002, que funcionou como um aceno ao mercado na época. Depois da "Carta ao Povo Brasileiro", Lula foi eleito para seu primeiro mandato presidencial, após concorrer e perder três vezes. Na manhã desta segunda-feira (21), Boulos leu um documento intitulado "Ao Povo de São Paulo", que faz acenos aos moradores da periferia e empreendedores.
Boulos também anunciou caravanas por São Paulo na última semana de campanha. Atos semelhantes foram feitos por Lula a partir de 1993. O então pré-candidato percorreu os estados brasileiros, mas acabou derrotado por Fernando Henrique Cardoso (PSDB) nas eleições de 1994.
O candidato também anunciou que vai dormir na casa de eleitores durante a semana. A ação começou na noite desta segunda, na residência da professora Maria Roseli, que mora na Brasilândia, zona norte da cidade. A chegada de Boulos foi transmitida em live nas redes dele. O psolista apareceu com uma caixa de pizza e ressaltou a expectativa de uma virada contra Nunes na reta final.
As ações de Boulos visam diminuir rejeição e captar os eleitores que estão indecisos ou não votaram em ninguém no primeiro turno. As estratégias recicladas, porém, são vistas por especialistas como fora do "timing". Aliados de Boulos discordam e apostam que boa parte dos eleitores decide seu voto na reta final —segundo o Datafolha, 86% já se dizem convictos da escolha.
Ideia é criar "ondas pró-Boulos" nos últimos dias da disputa. Interlocutores do psolista avaliam que a campanha esteve "fria" nas duas primeiras semanas, principalmente devido ao apagão que atingiu a cidade. A equipe acredita que as ações podem dar um impulso ao candidato na reta final, servindo tanto para engajar eleitores mais desconectados com a campanha como para levar a militância às ruas na busca de uma virada contra Nunes.
Para conseguir furar a bolha, o candidato do PSOL também tem adotado estratégias que lembram as práticas de Marçal. Ele rejeita a comparação. "Não é uma emulação, não. A gente precisa dialogar com a sociedade. Às vezes, se normaliza tanto um absurdo que, se você não chamar a atenção para ele, [fica esquecido]", disse Boulos durante sabatina do UOL com a Folha.
Após o primeiro turno, Boulos subiu o tom nas críticas contra o adversário Ricardo Nunes (MDB). Boulos tem relembrado a acusação de violência doméstica feita pela esposa do prefeito, Regina Carnovale Nunes, em 2011, além de questionar repetidamente o emedebista sobre o assunto. É a mesma estratégia usada por Marçal, que em debate perguntou mais de dez vezes a Nunes sobre o BO — o prefeito alega ter havido desentendimento por telefone, e não agressão física.
Outra questão repetida por Boulos é se Nunes abrirá seu sigilo bancário, em razão de investigações da máfia das creches. O desafio ao prefeito foi feito durante o debate da Band, no qual Nunes afirmou que Boulos "não sabe o que é trabalhar". O candidato rebateu citando sua carreira de professor e convocou o prefeito a abrir o sigilo bancário para mostrar a origem dos seus ganhos.
Depois desse episódio no debate, Boulos mostrou sua carteira de trabalho na propaganda eleitoral na TV. Em peça veiculada no último dia 15, ele exibiu seus holerites e visitou a primeira escola onde trabalhou. Marçal foi quem primeiro usou a carteira de trabalho para acusar Boulos de nunca ter trabalhado, tática depois repetida por Nunes.
O discurso mais inflamado do psolista visa também atrair o eleitor de Marçal. A campanha de Boulos acredita que parte dos votos recebidos pelo coach não é necessariamente ideológica, mas de pessoas que desejam mudança na gestão da cidade.
É esse também o discurso que o candidato tem reforçado em sabatinas, caminhadas e nas redes sociais. Em agenda nas ruas nesta segunda-feira, por exemplo, Boulos foi interpelado por um eleitor de Marçal enquanto fazia uma live ao sair de uma padaria. "Aqui é Bolsonaro, votei no Marçal, tudo o que é a favor do empresário. Você deveria ser a favor disso, investir nos pequenos empresários", provocou o eleitor.
O candidato do PSOL respondeu citando uma proposta do seu plano de governo de oferecer crédito para pequenos e médios empresários. "Eu entendo sua revolta, estou te falando que eu entendo. Se você pesquisar minha trajetória, não é conversa em tempo de eleição. Se você deixar como está, com quem está, é aí que não vai mudar tudo", disse Boulos. Além da postura mais enérgica e do discurso antissistema, que lembra o do influenciador, Boulos tenta atrair esse eleitor com propostas para empreendedores.
Interlocutores do candidato afirmam que o foco nos próximos dias é reforçar a possibilidade de virada. O UOL apurou que os trackings, pesquisas internas feitas pela campanha, mostram uma diminuição na diferença entre Boulos e Nunes, que, no entanto, ainda aparece na liderança. O psolista está atrás em todas as pesquisas de intenção de voto — no Datafolha, por exemplo, tem 33% contra 51% de Nunes.
Caravana tem pergunta contra Marta
Em debate aberto na Vila Nova Cachoeirinha nesta segunda, ele foi questionado sobre o episódio em que Marta Suplicy (PT), então ministra do Turismo, respondeu "relaxa e goza" ao falar sobre a crise no setor aéreo em 2007. "Imagina ter um problema de saúde, cobrar o Boulos, ele falar assim: 'Relaxa e goza, pessoal'", criticou um eleitor. A petista hoje é candidata a vice do psolista.
O candidato reconheceu que a fala de Marta foi "infeliz", mas saiu em defesa da vice. "Eu acho que a Marta se caracteriza mais pelos acertos dela do que pelos erros. Fez muita coisa e muito legado na cidade. Pode ter certeza que esse tipo de erro nós não vamos cometer", respondeu.
Boulos ainda se comprometeu a renunciar ao mandato caso não cumpra 70% das promessas. O compromisso foi feito após provocação de um eleitor, que se queixou de que os prefeitos, segundo ele, não executam as medidas que anunciam nas campanhas. "Quando eu me dispus a fazer esse debate na praça, é pra ouvir gente que concorda comigo e gente que discorda de mim. Democracia é isso", disse Boulos.