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Escola indígena é alvo de ataque e tem livros queimados no sertão de PE

Escola indígena é alvo de ataque e tem livros queimados em Águas Belas (PE) - Arquivo pessoal
Escola indígena é alvo de ataque e tem livros queimados em Águas Belas (PE) Imagem: Arquivo pessoal
do UOL

Carlos Madeiro

Colaboração para o UOL, em Maceió

11/08/2020 12h46

A escola estadual indígena Marechal Rondon, localizada na aldeia Fulni-Ô, em Águas Belas (PE) foi alvo de um ataque e teve sua parte administrativa destruída por um incêndio criminoso na madrugada da última quinta-feira (6). Diversos livros e materiais foram queimados, e o prédio teve a estrutura física comprometida. A Polícia Civil foi acionada e já investiga o caso. A Funai (Fundação Nacional do Índio) também foi informada.

Além de atearem fogo, os criminosos ainda deixaram mensagens na parede com ofensas. Em uma delas, a frase deixada pelos vândalos diz: "Vão tudo tomar no c*".

O prédio alvo do ataque é uma referência no ensino para o povo fulni-ô, fica no sertão do estado e tem em sua grade curricular a língua Yaathe, única língua indígena originária viva no Nordeste (no caso, a referência exclui o Maranhão, já que a Funai considerada o local Amazônia Legal).

Em março, o UOL visitou a escola e contou a dinâmica das aulas e como é o ensino da língua, que é um orgulho para o povo fulni-ô.

Segundo Maristela de Albuquerque Santos, coordenadora educacional da unidade, o incêndio atingiu e destruiu quatro compartimentos do bloco administrativo, entre elas a sala de leitura (onde fica a biblioteca).

Escola indígena é alvo de ataque e tem livros queimados em Águas Belas (PE) - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Biblioteca da escola foi um dos locais atingidos pelo incêndio criminoso
Imagem: Arquivo pessoal

"Foram momentos desesperadores, principalmente quando vi que em uma das salas estavam os arquivos com as pastas individuais dos estudantes. Ali estava parte da vida de cada cidadão que passou por nossa escola. Milagrosamente nenhum arquivo foi atingido, pois os meninos conseguiram tirar os arquivos com os documentos intactos", afirma.

Porém, outros setores não tiveram a mesma sorte. "Até o momento identificamos destruídos mobiliários como armários, estantes, projetores, cadeiras, bureaus e bebedouro. Além disso, livros didáticos e paradidáticos, livro de ponto, pastas de materiais de acompanhamentos e monitoramento e documentos de organização escolar foram destruídos", conta.

Ela explica que o fogo causou um grande estrago nos telhados e forros da parte administrativa. "Temos rachaduras nas paredes, comprometendo parte da estrutura do prédio", diz.

Maristela afirma que o processo de levantamento final do prejuízo ainda será finalizado. "Ainda sentiremos falta de muito mais, mas só poderemos fazer uma busca mais completa, após os trabalhos de perícias policiais", informa.

A polícia já abriu inquérito e deve realizar uma perícia no local até amanhã para saber como ocorreu o incêndio.

Racha interno

Os índios fulni-ô enfrentam um racha interno desde 2018, quando um grupo rebelou-se após o processo de escolha do cacique Cícero de Brito como sucessor de João dos Santos, morto em 18 de agosto daquele ano.

O grupo dissidente alega que a forma de escolha não foi correta, o que é questionado e tratado como uma espécie de insubordinação pelos tradicionais líderes da tribo. A escolha ocorre durante o Ouricuri, e por isso não tem detalhes revelados.

Por ora, o pajé Gildiere Pereira prefere não fazer acusações e levantar suspeitas sobre quem seria o responsável pelo atentado. "Não sei por qual motivo fizeram isso. No momento a gente não sabe quem foi, mas já foi encaminhado à Justiça", diz.

Ele afirma que o sentimento do povo é de tristeza e revolta. "Foi uma coisa muito ruim. A escola é um grande recurso para o povo fulni-ô. Quem fez isso poderia usar o seu sentimento em saber que a escola está preparando os nossos índios, nossos jovens. Por qual motivo fazer isso com a escola?", questiona.

Pereira diz ainda que espera que o caso ganhe repercussão nacional, e assim as autoridades se esforcem mais para achar os responsáveis e os punam exemplarmente. "As autoridades lá de fora devem ficar cientes, devem agir. Se esse crime ficar impune, corre risco de acontecer coisa pior aqui na aldeia", denuncia.

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