Executiva cria bolsas emergenciais em meio à pandemia
"A princípio eu iria trabalhar sem receber nada por isso", conta ele. Nascido em Duque de Caxias, Neris tinha auxílio da Capes para fazer a pesquisa durante o doutorado na UFRJ, mas perdeu o direito à bolsa ao viajar para os EUA para o período de "doutorado sanduíche". A pesquisa na Califórnia foi custeada também por uma bolsa de estudos, desta vez da Fulbright, financiada pelo governo americano. "Eu tinha aceitado que não teria bolsa no Brasil até a defesa da minha tese de doutorado, mas muitos dos prazos foram estendidos por causa da pandemia e senti necessidade de trabalhar com coronavírus."
Ao saber de histórias como a dele, uma brasileira, executiva na área de microbiologia, achou que precisava agir. E rápido. Márcia Fournier, que vive em Washington, já havia criado a Dimensions Sciences, uma ONG com intuito de fomentar a pesquisa científica e oferecer bolsas de estudos. A proposta inicial era trazer estudantes brasileiros para tempo de pesquisa nos EUA. O coronavírus mudou as coisas. "Decidimos que não poderíamos demorar seis meses ou um ano para fazer processos de seleção. As pessoas estão sem salário hoje, agora. É uma bolsa emergencial."
Com um comitê científico montado às pressas e 30 voluntários, especialistas de diversas áreas, eles fizeram o programa de bolsas e uma seleção em um mês para escolher sete pesquisadores brasileiros que receberam R$ 6.500 por três meses. O dinheiro saiu de doações de empresas e indivíduos. "Sabemos que estamos tocando só a ponta do iceberg, precisamos de mais doadores", afirma Márcia.
A organização foi criada com a missão de incluir minorias na ciência e oferecer não só auxílio financeiro, mas mentorias e coaching, para ajudar no desenvolvimento profissional dos pesquisadores. No caso das bolsas para covid-19 no Brasil, a ideia era focar em quem estava trabalhando com ciência sem compensação financeira. "Custeia o combustível que uso para ir ao laboratório, a comida e até minhas despesas pessoais", conta Rômulo Neris, que trabalha estudando 'como é a resposta inflamatória do corpo à infecção por coronavírus'. "Os próximos passos são incertos. Quero permanecer na academia, quero ser pesquisador ou professor, mas a oferta de vagas para ciência no Brasil tem diminuído."
Glaucia Caruso, de 26 anos, é mestre em Biociências e Biotecnologia pela USP e também faz parte da chamada força-tarefa para covid-19 do Dimensions Sciences. Em Ribeirão Preto, ela se ofereceu para o projeto Supera Ação, com as empresas incubadas no parque tecnológico da USP na cidade. Lá, ela ajuda a fazer diagnóstico de covid-19 de amostras colhidas em hospitais e postos do Sistema Único de Saúde (SUS) da região.
Por dia, o grupo faz cerca de 240 diagnósticos. "Ribeirão Preto é uma das cidades mais afetadas do interior do Estado e existia uma fila enorme de espera de amostras que precisavam de diagnóstico", afirma Glaucia. "As coisas mudaram para mim. Não só porque me ofereceram o auxílio financeiro para fazer o trabalho que estava fazendo sem renda, mas porque me colocaram em contato com diversos profissionais da área científica e me ofereceram mentoria. Isso vai redirecionar minha carreira", afirma.
A meta da ONG é conseguir fundos para apoiar 50 bolsistas no Brasil e ampliar o programa com bolsas nos EUA e Canadá. A fundadora do projeto estudou nos EUA em 1997, com uma bolsa da Capes, e lamenta a diminuição do incentivo à ciência no Brasil. Na próxima leva, ela diz que quer alcançar bolsistas fora dos Estados contemplados na primeira etapa, que foram São Paulo, Rio, Minas e Rio Grande do Sul. O programa começou em maio. A partir de agosto, o vínculo dos jovens pesquisadores com a ONG acaba - e o apoio financeiro também. Mas o compromisso com a ciência, afirma Rômulo, não termina. "Sinto o dever e a necessidade de contribuir neste período para o meu País e o mundo." As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Beatriz Bulla, correspondente
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