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Pragmática primeira-ministra italiana lidera extrema-direita na UE

06/05/2024 06h20

Com seu atlanticismo e suas relações pragmáticas com Bruxelas, a italiana Giorgia Meloni, que está em plena campanha para as eleições europeias em junho, é para muitos a face "moderada" da direita radical da Europa.

A ascensão ao poder do grupo pós-fascista Irmãos da Itália, em 2022, enviou alertas para a União Europeia e despertou temores de uma guinada para a direita de Roma, membro fundador do bloco europeu e da OTAN.

Mas o forte apoio à Ucrânia fez com que Meloni conquistasse amigos em Washington e Bruxelas, especialmente depois de ter ajudado a persuadir o húngaro Viktor Orban - um aliado de longa data e simpatizante de Moscou - a abandonar o veto à ajuda da UE a Kiev.

Meloni também trabalhou em estreita colaboração com a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, especialmente no assunto migração, uma prioridade para a primeira-ministra de extrema direita.

"A nível europeu, ela tenta se apresentar como uma espécie de conservadora moderada e mediadora" com o resto da direita radical, observou Lorenzo Castellani, analista político da Universidade Luiss, em Roma.

A nível interno, Meloni tem seguido uma agenda nacionalista e populista centrada nos valores familiares tradicionais, na lei e na ordem e contra a migração, incluindo a repressão aos navios de salvamento que operam no Mediterrâneo Central.

Suas medidas causaram arrepios na esquerda italiana - particularmente os movimentos para exercer influência sobre a emissora pública estatal RAI - mas nada ainda que desperte alarme em Bruxelas, como aconteceu com as reformas judiciais na Hungria e na Polônia.

A política fiscal italiana tem sido relativamente prudente, refletindo as limitações por fazer parte da moeda única da UE.

"Ela quer ser, em muitos aspectos, o extremo aceitável para o resto do establishment político europeu", disse Castellani à AFP.

"Ela é como a última ilha antes da fronteira."

- Abraçando Meloni -

Meloni lidera o grupo Conservadores e Reformistas Europeus (ECR) no Parlamento Europeu, que inclui o Vox da Espanha, o populista Lei e Justiça (PiS), da Polônia e o Reconquete!, da França.

Marcada por uma postura pró-Ucrânia e pró-OTAN, a premiê italiana é vista como mais confiável pelo establishment de Bruxelas do que o outro grupo de extrema direita, o Identidade e Democracia (ID).

O ID inclui o Reagrupamento Nacional (RN) de Marine Le Pen, na França, o AfD anti-imigrante da Alemanha e o próprio aliado da coligação de Meloni, a Liga de extrema direita de Matteo Salvini.

Rosa Balfour, diretora do think tank Carnegie Europe, diz que tanto Roma como Bruxelas se beneficiaram de uma relação de trabalho pragmática.

"O que a Comissão tem feito é abraçar Meloni e isolar Orbán", que não faz parte de nenhum dos grupos, disse à AFP.

"E isso funcionou muito bem para a Itália porque Meloni conseguiu extrair concessões."

A boa relação resultou principalmente no apoio da UE aos esforços de Meloni para deter as dezenas de milhares de migrantes que desembarcam nas costas de Itália todos os anos em barcos provenientes do Norte da África.

Von der Leyen e Meloni visitaram a ilha de Lampedusa no ano passado, após um aumento nas chegadas de migrantes, e ambas se juntaram às delegações da UE no Egito e na Tunísia nos últimos meses para negociar novos acordos sobre energia e migração.

- Jogo de alianças -

Analistas dizem que a mudança para uma abordagem mais dura da UE em matéria de migração já estava bem encaminhada antes da chegada de Meloni - mas isso não a impediu de reivindicar os méritos.

"Queremos que a Itália seja fundamental para mudar o que não funciona na Europa", disse a premiê, durante o lançamento da sua campanha eleitoral no mês passado.

"Queremos fazer na Europa exatamente o que fizemos na Itália em 25 de setembro de 2022", acrescentou.

Mas Castellani chama isso de "blefe".

"O verdadeiro jogo que ela está jogando é tentar entrar no jogo europeu de alianças", disse ele, principalmente construindo pontes entre o ECR e o conservador Partido Popular Europeu (PPE) de von der Leyen.

As divisões na direita europeia reverberam dentro da coligação de Meloni, principalmente entre ela e Salvini, que compartilham prioridades internas semelhantes, mas divergem em assuntos externos.

Com um histórico de boas relações com Moscou, o partido Liga, de Salvini, sofreu uma queda de popularidade nos últimos anos.

A Liga ficou em primeiro lugar nas eleições europeias de 2019 na Itália, com 34%, mas agora está perto dos 8%, em comparação com mais de 27% dos Irmãos de Itália de Meloni.

- Mudança de cenário -

As pesquisas mostram que os eleitores apoiam mais a política externa de Meloni - e menos suas medidas contra migração - mas Lorenzo Pregliasco, fundador da empresa de pesquisas YouTrend, diz que a personalidade da premiê tem um papel importante.

Meloni também é vista como "mais confiável", uma comunicadora habilidosa e uma "figura genuína, alguém que diz o que pensa", disse à AFP.

Pregliasco observa que a vitória da primeira-ministra em 2022 foi impulsionada pela imagem de 'cara nova', sendo a única líder de partido que não se juntou ao governo tecnocrático de Mario Draghi.

Com a oposição ainda dividida, como estava naquele momento, ele prevê que Meloni poderá permanecer no poder durante todo o mandato de cinco anos.

Mas alerta que o cenário político pode ser muito diferente, sobretudo se Donald Trump vencer as eleições presidenciais de novembro nos EUA.

ar/ide/jb/dd 

© Agence France-Presse

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