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Estrutura descentralizada, conhecimento do terreno: os fatores do ressurgimento do Hamas no norte de Gaza

21/05/2024 08h58

A guerra de Israel contra o Hamas voltou ao norte da Faixa de Gaza, onde o Exército de Israel anunciou há alguns meses a derrota do movimento islamista. 

Os combatentes palestinos se reagruparam desde que Israel anunciou em janeiro que havia "completado o desmantelamento da estrutura militar do Hamas no norte da Faixa de Gaza" e que centrava seus esforços bélicos no centro e no sul do território. 

Na sexta-feira, um porta-voz militar disse à AFP que os novos combates na cidade de Jabaliya, no norte, eram "talvez os mais violentos" em mais de sete meses de guerra desencadeada pelo ataque do Hamas contra o sul de Israel em outubro. 

No sábado, o Exército emitiu novas ordens de evacuação para moradores perto da Cidade de Gaza, ao sul de Jabaliya, indício de que está operando novamente na região. 

- Onde se localizam os combates? -

Depois de semanas de combates de intensidade relativamente baixa, durante negociações indiretas para uma trégua que não foi alcançada, as tropas israelenses entraram em 7 de maio na cidade de Rafah, no extremo sul de Gaza, que o Exército apresenta como o último reduto do Hamas. 

Desde o início dessas operações em Rafah, que segundo a ONU obrigaram 800.000 civis a se deslocar, os combates também foram retomados no norte e no centro do território. 

Desde então houve bombardeios israelenses e combates de rua no campo de refugiados de Nuseirat, no centro de Gaza, onde um ataque matou 31 pessoas no domingo, segundo a agência de Defesa Civil palestina. 

As tropas israelenses também enfrentaram milicianos palestinos no campo de refugiados de Jabaliya, no bairro de Zeitun na Cidade de Gaza e em outras partes do norte da Faixa. 

- Como o Hamas está suportando? - 

Israel prometeu "aniquilar" o Hamas após o ataque de 7 de outubro em seu território, que resultou na morte de mais de 1.170 pessoas, a maioria civis, segundo uma contagem da AFP baseada em fontes israelenses. 

Os analistas dizem à AFP que a enorme destruição de Gaza por causa dos bombardeios israelenses - que causaram mais de 35.000 mortos, segundo as autoridades do movimento islamista -, unido à falta de alternativa política crível, facilitaram o recrutamento por parte do Hamas nos mais de sete meses de conflito. 

"Com a devastação causada entre os civis palestinos, é bastante fácil recrutar essas pessoas para que se unam à resistência armada", disse Andreas Krieg, professor do King's College de Londres. 

Segundo os analistas, a rede de túneis do Hamas em Gaza, calculada em mais de 500 km, não foi consideravelmente destruída, e o grupo ainda dispõe de mísseis antitanques "Yasin 105" de fabricação caseira, para atacar regularmente as tropas israelenses. 

Os milicianos do Hamas também possuem a vantagem de conhecer muito bem o terreno, aponta Michael Wahid Hanna, analista do International Crisis Group. Combatem "em seu território, e isso gera uma verdadeira resiliência", disse à AFP. 

- Por que Israel tem dificuldades de cumprir seus objetivos? -

Israel atacou comandantes do Hamas, mas os especialistas afirmam que a estrutura descentralizada da organização islamista a torna menos vulnerável aos vácuos de poder. 

"Esse é o problema com a abordagem israelense, sempre buscam os líderes. Mas na realidade (o Hamas) é uma rede, e as redes não são derrubadas", diz Andreas Krieg. 

Outra desvantagem para Israel foram as divergências políticas no gabinete de guerra, algo que diminuiu a coesão da estratégia militar. 

"Não é possível cumprir objetivos militares a longo prazo se não há uma estratégia política para o dia seguinte da guerra", afirma Bilal Y. Saab, do centro de pesquisa britânico Chatam House. 

- Quais danos o Hamas sofreu? -

O grupo islamista, no poder na Faixa de Gaza desde 2007, tinha quase 30.000 combatentes antes de 7 de outubro. 

Não se sabe ao certo o número de milicianos do Hamas mortos nessa guerra. 

O Ministério da Saúde de Gaza não especifica quantos combatentes estão incluídos no número total de mortes no território. O primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, disse este mês que 14.000 combatentes islamistas foram mortos. 

Os especialistas acreditam que a organização conseguiu repor rapidamente seus soldados. 

"Para cada membro do Hamas que eles matam, os israelenses criam um potencial de recrutamento de mais quatro, devido à raiva gerada pelas mortes de muitos outros civis nas mãos do Exército israelense", disse H.A. Hellyer, analista do Royal United Services Institute, em Londres. 

Por todos esses motivos, os especialistas acreditam que será muito difícil "erradicar" o Hamas. 

"É difícil e pouco realista imaginar que Israel possa (...) derrotar completamente o Hamas e erradicá-lo", diz Hanna, do International Crisis Group. 

Saab, da Chatham House, acrescenta que "enquanto existirem os túneis, os combatentes e o tráfico" de armas e materiais, o Hamas terá "alguma capacidade de fazer guerra". "A questão é: com qual capacidade Israel está disposto a conviver?".

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© Agence France-Presse

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