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Aos 73, ela corre 5 km todos os dias: 'Se chove, corro no quintal'

Arquivo pessoal
Imagem: Arquivo pessoal
do UOL

Claudia Rato

Colaboração para VivaBem

20/05/2024 04h05

Cleusa Uenaka, 73, encontrou na corrida uma verdadeira transformação em sua vida. Tudo começou três anos atrás, de forma inusitada, após assistir a uma live em uma rede social que propunha um desafio aos participantes. A proposta era correr um quilômetro todos os dias consecutivos por um mês, o que era uma novidade para ela por não ser adepta a nenhuma prática esportiva.

O que a atraiu foi justamente se sentir desafiada a fazer algo diferente. E não deu outra, assim que a transmissão terminou, sem hesitar, calçou seu par de tênis e partiu para a ação. "Nunca tinha corrido na minha vida, mas senti que era a hora de começar, fui e nunca mais parei."

Primeiro obstáculo

Sua determinação foi testada nos primeiros minutos, isso porque logo de início tropeçou na calçada, caiu e esfolou as mãos e os joelhos.

Ainda assim, decidiu continuar com o compromisso assumido e prosseguiu, mesmo com o corpo dolorido. "Saí tão entusiasmada de casa que nem preparei meu corpo. Hoje sei que é preciso aquecer antes para evitar esse tipo de problema, mas o bom é que essa queda foi apenas um obstáculo superado. Não podia parar, era o meu primeiro dia", relembra.

A partir de então, essa tarefa passou a fazer parte obrigatória de sua rotina e assim foi Cleusa, seguindo sua jornada, que já contabiliza mais de 1.100 corridas sem parar um dia sequer.

Logo no início dessa atividade, ganhou um estímulo a mais e que passou a ser sua maior motivação para correr.

Minha netinha, hoje com seis anos e, na época com três, me perguntou: 'Vó quando meus pais ficarem velhinhos você cuida de mim'? Essa foi a prova de que precisava estar forte e com saúde para ficar sempre perto dela, ao menos até o momento em que ela passar a entender o curso natural da vida, e isso só me fortaleceu. Cleusa Uenaka

Desafio aumentado

O hábito da corrida se tornou uma verdadeira missão de vida para Cleusa. Isso porque quando atingiu os 30 dias seguidos, que era o desafio proposto, achou que poderia mais.

"A partir do 31º dia, dobrei o percurso até completar 720 dias de corrida. Depois, vi que dava para melhorar e comecei a correr quatro quilômetros diários até chegar a mil dias nesse desafio. Desde então, passei para cinco quilômetros diários consecutivos."

Questionada se pretende aumentar novamente a meta, ela diz que só o tempo dirá. "Uma coisa tenho certeza, não importa quanto, não vou parar nunca mais."

Faça chuva ou sol

Mesmo diante de adversidades, como dias chuvosos, Cleusa encontrou maneiras de não parar nenhum dia de correr.

Não tem Natal, Ano-Novo ou qualquer outro feriado que me impeça. Acordo por volta das 5 horas da manhã, me arrumo, leio um versículo da Bíblia, levo minha neta para a escola e de lá já parto para a minha atividade em um parque perto de casa. Como uma maçã antes de começar e carrego sempre uma garrafa de água para beber durante o percurso. Quando não dá para correr de manhã, corro à tarde, mas não pulo um dia. Se chove, uso o quintal de casa, que é coberto, até contabilizar a minha meta dos cinco quilômetros. Esse é o meu desafio, e eu não posso parar. Cleusa Uenaka

Para manter o equilíbrio entre corpo e mente, Cleusa conta que faz um check-up anual e não tem nenhum problema de saúde que a impeça de se exercitar.

Momento mais difícil

Cleusa Uenaka 2 - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Imagem: Arquivo pessoal

Casada, mãe de três filhos e cinco netos, era a única da família a praticar essa atividade física, mas hoje já inspira alguns familiares, entre eles um dos filhos e a nora, que iniciaram recentemente. "Estou atrasado mais de 1.110 dias em relação à minha mãe, mas vamos lá", brinca o rapaz.

"Eles me incentivam e meu objetivo agora é mostrar que se eu, com 70 anos e nunca tinha corrido, comecei, todos podem", complementa Cleusa.

Uma das apoiadoras era a sua irmã. "Quando ela vinha me visitar, sabia que em algum momento tinha que sair para correr, então sempre me dizia, pode ir que te espero."

A irmã morreu, e Cleusa, ainda que muito abalada, decidiu que não deixaria de correr mesmo nesse momento tão triste de sua vida.

"Passei o dia no hospital até a liberação de todos os papéis, fui pra casa e dormi muito mal à noite. Na manhã seguinte, logo cedo fomos ao velório. Isso tudo mexeu muito comigo. Nós éramos muito apegadas. Se perguntassem para mim se queria correr, diria que não. Meus parentes me aconselharam a não, até porque fazer um esforço físico seria realmente bem difícil e desafiador, mas ao mesmo tempo pensava que não podia falhar, porque se falhasse teria que recomeçar do zero. Imaginei o que minha irmã, que tanto me apoiava, diria para mim. Certamente falaria para eu ir seguir. Então, encarei aquilo como se eu tivesse cumprido a minha parte e corri, lá mesmo, no cemitério meus cinco quilômetros diários."

Reconhecimento nas redes sociais

A determinação de Cleusa não passou despercebida, e seu exemplo atraiu uma legião de seguidores, chegando a 260 mil pessoas que a seguem no Instagram. "São vidas que passaram a me seguir principalmente porque percebo que querem receber mensagens positivas."

A razão desse feito veio justamente quando Cleusa passou a gravar vídeos ao final de cada corrida seguida de frases motivacionais. "Notei que as pessoas sentiam uma necessidade de ouvir essas palavras e se viam desafiadas também. Entendi que esse era o meu maior propósito", conta.

O desafio ganhou força e hoje pessoas de várias partes do país, até mesmo de fora, iniciaram a prática da corrida, inspiradas nela. "Elas correm, gravam e marcam minha conta do Instagram dizendo há quantos dias estão correndo e qual a quilometragem. Isso é muito gratificante", diz.

Sua perseverança incentivou as pessoas a não apenas praticar a corrida, mas também a buscar um estilo de vida mais saudável e equilibrado, e agora sua rotina literalmente passou a ser uma correria. Isso porque, além da dedicação do esforço físico diário, começou a fazer lives constantes com pessoas de vários lugares, entre elas profissionais de saúde e bem-estar.

Nessas transmissões, ela enfatiza a importância de colocar a saúde em primeiro lugar e não adiar um sonho ou objetivo. "Não importa a faixa etária, quanto antes a pessoa começar, melhor pra ela. A idade não é um obstáculo, com determinação e comprometimento somos capazes de alcançar grandes feitos, o importante é começar e não parar."

Hoje eu percebi que não sou mais eu que inspiro as pessoas e sim elas que me incentivam a seguir com o meu propósito, que vai muito além de correr cinco quilômetros diários. Cleusa Uenaka

Dica para começar? Cleusa tem na ponta língua

Comece a caminhar um quilômetro e a correr um quilômetro, depois caminhe um e corra dois, até subir gradativamente. A pessoa não precisa se sacrificar, senão ela desiste.

E não encontre obstáculos onde não existem, vá com a roupa que tem, com o tênis que você tem e não se preocupe com o que as pessoas vão dizer.

E quando alcançar a sua meta, permita-se uma recompensa, porque nosso cérebro exige isso de nós e te incentiva a passar para a etapa seguinte.

Com isso a pessoa ganha mais ânimo e já começa a reprogramar sua próxima recompensa. Trabalhe a sua mente a seu favor.

É idoso e quer correr? Anote as orientações

Cleusa Uenaka 3 - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Imagem: Arquivo pessoal

A prática da corrida na terceira idade traz uma série de benefícios físicos e emocionais, segundo especialistas.

Rosa Chubaci, professora doutora do bacharelado e pós-graduação em gerontologia da USP, destaca que além de aumentar a resistência física, a atividade equilibra hormônios como a serotonina e endorfina, promovendo bem-estar. Ela também ressalta a importância do convívio interpessoal, que desempenha um papel fundamental na saúde geral.

O educador físico Marcelo Leão, especialista em movimento, pondera a necessidade de trabalhar a individualidade do idoso como fator fundamental para uma corrida segura, já que para se adaptar devidamente, tudo depende do nível de condicionamento da pessoa, a considerar três aspectos principais: o condicionamento aeróbico, orgânico e a capacidade de absorver impacto para a prática da corrida.

E nesse caso, sua principal orientação é procurar profissionais da área médica e do esporte antes de colocar essa atividade em ação. "É essencial que um médico avalie a aptidão física da pessoa e um professor de educação física forneça orientações específicas para o corredor. Essa abordagem personalizada não só promove a segurança durante a corrida, mas também potencializa os benefícios para a saúde dessa pessoa", afirma Leão.

Sérgio Rocha Piedade, médico especialista em medicina do exercício e do esporte, ressalta que a prática da corrida por pessoas idosas estimula os ossos e músculos a trabalhar, melhora funções cardiovasculares, respiratórias e imunológicas, além de fortalecer a autoestima.

Ele também destaca que queixas musculares e desconfortos articulares são comuns, principalmente nos períodos iniciais de aumento da intensidade ou frequência no treino. É importante considerar a possibilidade de osteoartrite ou desgaste articular, que pode exigir uma avaliação especializada e eventual ajuste na estratégia de treinamento. Em tais casos, reforça a necessidade de procurar um médico do esporte e/ou ortopedista.

Além do acompanhamento médico, Rosa Chubaci complementa que é essencial adotar cuidados como a escolha de vestimenta, calçados, horários e locais adequados e sem obstáculos, alimentação leve e saudável, hidratação, levar sempre identificação com nome, endereço e telefone e deixar pessoas próximas cientes dessa rotina.

Aquecimento antes da corrida e alongamento após, especialmente nas áreas de maior tensão muscular, também são recomendados para evitar lesões. A prática regular e consistente, aliada às orientações profissionais, pode proporcionar uma corrida segura e benéfica para os idosos.

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