França quer dificultar acesso à cidadania em arquipélago francês no oceano Índico
O ministro francês do Interior, Gérald Darmanin, disse que o governo do país pretende aplicar uma reforma para limitar a concessão da cidadania francesa para os moradores do território ultramarino de Mayotte, no oceano Índico. O arquipélago francês, perto do continente africano, enfrenta uma grave crise migratória e de criminalidade.
O território atualmente é o único a se beneficiar do acesso facilitado à nacionalidade pelo direito do solo, concedido àqueles que nasceram na região. No restante da França, prevalece o direito pelos laços de sangue, ou seja, pela família.
Mayotte é o 101º departamento francês e está paralisada desde 22 de janeiro por bloqueios de estradas promovidos por cidadãos que protestam contra a insegurança e o descontrole da imigração.
Este domingo (11), o ministro visita a região, acompanhado da ministra dos Assuntos Ultramarinos, Marie Guévenoux. "Vamos tomar uma decisão radical, que é a inclusão do fim da lei do solo em Mayotte em uma revisão constitucional que o presidente da República promoverá", declarou Darmanin, ao descer do avião. "Não será mais possível tornar-se francês se não formos filhos de pais franceses", acrescentou, garantindo que a medida "cortará literalmente a atratividade" do arquipélago a pessoas de países vizinhos, em especial Comores.
O ministro especificou que a abolição da regra, aliada ao endurecimento das normas para o reagrupamento familiar de imigrantes, previsto na nova lei da imigração aprovada em dezembro, vão "acabar com o visto por território". O sistema impedirá os titulares de uma autorização de residência em Mayotte de irem para a França continental, na Europa.
Essa é uma das principais reivindicações dos grupos de moradores revoltados, que paralisam a ilha desde o mês passado. Segundo Darmanin, a eliminação deste sistema estará incluída em um projeto de lei de Mayotte - anunciado há muito tempo e confirmado em 30 de janeiro pelo recém-empossado primeiro-ministro Gabriel Attal. O texto, garantiu o ministro, será apresentado na Assembleia Nacional "nas próximas semanas ".Mayotte é território mais pobre da França
Departamento francês mais pobre e mais jovem da França, Mayotte é povoado por 310 mil habitantes, segundo cálculos considerados subestimados do Instituto Nacional de Estatísticas e Estudos Econômicos (Insee). Desse total, 48% são imigrantes comorianos ou de outros países africanos. A maioria chega clandestinamente a bordo de barcos de pesca tradicionais, os "kwassa-kwassa", provenientes da ilha comoriana de Anjouan, a apenas 70 quilômetros de distância.
No âmbito da Operação Wuambushu lançada há menos de um ano, centenas de policiais foram deslocados para Mayotte para conter o fluxo de chegadas de migrantes das Comores e combater a criminalidade. Mas muitos residentes acharam os resultados decepcionantes. No final de 2023, confrontos violentos entre gangues de jovens de aldeias rivais deixaram três mortos.
O Ministério do Interior anunciou que prepara "uma nova grande operação contra a criminalidade e a imigração ilegal", a Operação Wuambushu 2. Gérald Darmanin e Marie Guévenoux devem visitar o estádio Cavani no domingo, no distrito de Mamoudzou, onde um assentamento de migrantes da África cristaliza as tensões desde o início do ano.
"Agora, estamos à espera de algo concreto. Não temos um calendário, só palavras", disse à AFP a sindicalista Zafira Ahmed, membro do coletivo que promove os protestos.
"Os anúncios são importantes, mas esperamos ações. Tudo isto levará tempo e, por enquanto, nada mudou na nossa vida cotidiana", afirmou um manifestante, Eirini Arvanitopoulou.
Pobreza e insegurança
Mayotte é o único território do arquipélago geográfico de Comores que, por meio de realização de referendos, sempre se pronunciou a favor da permanência na comunidade francesa. O arquipélago é composto por duas ilhas principais, Petite Terre e Grande Terre, e cerca de 30 ilhotas dispersas, localizadas na entrada do Canal de Moçambique e a 1,7 mil quilômetros da ilha da Reunião, também francesa.
Segundo o Insee, quase metade da população de Mayotte não tem nacionalidade francesa, mas um terço dos estrangeiros nasceram na ilha. Entre janeiro e dezembro de 2023, foram realizadas cerca de 22 mil deportações para a fronteira, segundo números ainda provisórios comunicados por Paris.
O arquipélago é também o departamento mais jovem da França: metade da população é menor de idade. Quando atingem a maioridade, metade dos estudantes do ensino secundário não tem perspectivas de estudo ou de emprego, devido à falta de documentos e de regularização.
Em 2022, apenas 30% das pessoas com entre 15 e 64 anos tinha emprego em Mayotte. Segundo dados oficiais, 42% da população vive com menos de € 160 por mês e 30% dos habitantes da ilha estão na informalidade, vivendo em favelas insalubres. Mesmo assim, é um território promissor em comparação com os seus vizinhos imediatos, Comores e Madagascar.
Com informações da AFP