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COP28: Texto preliminar evidencia bloqueios sobre fósseis; Marina pede "responsabilidade" de países

08/12/2023 14h44

Uma terceira versão do acordo negociado na Conferência do Clima da ONU em Dubai evidencia o quanto os 195 países permanecem divididos, a quatro dias do fim do evento. O futuro dos combustíveis fósseis no planeta cristaliza as divergências, que opõem não apenas os países industrializados e os em desenvolvimento, mas também os dois blocos internamente. 

Lúcia Müzell, enviada especial da RFI a Dubai 

Na nova versão do documento divulgado nesta sexta-feira (8) pelo órgão da ONU sobre as mudanças do clima (UNFCCC), cinco alternativas são apresentadas: a saída dos fósseis e todos os subsídios para a cadeia, "em linha com o melhor da ciência disponível"; a segunda acrescenta ainda o objetivo de limitar o aumento da temperatura do planeta a 1,5°C; a terceira prioriza o fim das emissões dos gases de efeito estufa dos fósseis; a quarta visa a redução desses combustíveis na energia e a quinta é que o tema seja excluído do texto. Caberá aos diplomatas e ministros reunidos na conferência definir qual delas permanecerá na versão final do texto, esperada para terça-feira (12).

"Em relação ao Global Stoktake [o primeiro Balanço Global do andamento do Acordo de Paris sobre o clima], ainda está com muitas opções em aberto. Quase todos os itens têm até três opções", apontou Anna Maria Cárcamo, especialista em legislação e governança ambiental da organização Laclima, e que acompanha as negociações em Dubai. Este balanço é o resultado mais aguardado nesta conferência. "O tema dos fósseis acabou abafando as discussões sobre outros temas importantes", afirmou.

Uma alta fonte que segue os diálogos indicou que os impasses na plenária da COP28 pareciam insuperáveis e agora "as alternativas serão testadas nas cavernas das negociações" em que se transformaram as conversas bilaterais e entre grupos de países, com vistas a um acordo. A presidência da COP designou oito ministros de diferentes países para impulsionar os diálogos, apoiados por grupos de "facilitadores". 

Marina critica 'visão negacionista'

Apesar disso, o presidente da conferência, o emiradense Sultan Al Jaber, disse estar "profundamente otimista" sobre um acordo "ambicioso"e "transformador" nesta COP. Perguntada pela RFI se compartilha do entusiasmo, a ministra brasileira do Meio Ambiente, Marina Silva, demonstrou ceticismo. "Se sairmos daqui com essa clareza e o compromisso de fazer esse debate, com senso de responsabilidade tanto por parte de países produtores de petróleo quanto por países consumidores, aí a gente pode dizer que podemos ter esperança", disse.

"Nós não podemos continuar com uma visão negacionista de discutir uma série de outras questões sem focar no problema, para que possamos buscar, de forma responsável, colaborativa, a saída para o principal problema da mudança do clima, que é a emissão de CO? em função do uso de combustível fóssil", acrescentou. 

O Brasil tem dito que não se opõe à ideia do fim dos fósseis, à condição que o calendário para o abandono dessas fontes seja cumprido primeiro pelos países ricos, maiores responsáveis históricos pelo problema do aquecimento do global. Cerca de 80 países, entre eles a maioria dos europeus, defendem menção à saída dos fósseis - uma adesão inédita em três décadas de Conferências do Clima.

Oposição da Arábia Saudita

Entre as nações em desenvolvimento, a Arábia Saudita - uma das maiores produtoras mundiais de petróleo - lidera a oposição a qualquer menção ao fim ou redução do carvão, petróleo e gás. O país estaria, inclusive, bloqueando outros temas das negociações, como o de adaptação às mudanças climáticas, como forma de garantir uma moeda de troca sobre a questão dos fósseis. 

A China, atual maior emissor de CO?, rejeita um impulso na diminuição do carvão, do qual ainda é muito dependente, e Estados Unidos, maiores produtores mundiais de gás natural liquefeito, rejeitam restrições a esse setor. Outra fonte próxima das negociações avaliou que, para acomodar os interesses de cada um, é provável que o documento final aborde o tema, mas de maneira genérica e sem especificar nenhum entre eles (carvão, petróleo ou gás). 

Esta fonte acrescentou que há um grupo de países em desenvolvimento que não vai hesitar em "bloquear tudo" para evitar qualquer avanço nesse assunto.

Missão 1.5

"A COP28 precisa trazer soluções sobre como vamos sair dessa confusão climática", exaltou o secretário-executivo da UNFCCC, Simon Steil, horas antes da divulgação do rascunho do acordo. "A COP28 precisa entregar uma grande mudança. Tecnologia e ferramentas existem: nós precisamos decidir colocá-las para funcionar", ressaltou.

A pauta prioritária do Brasil no evento é o cumprimento da meta mais ambiciosa do Acordo de Paris: que a alta das temperaturas do planeta não ultrapasse 1,5°C até o fim deste século, tendo como base a era pré-industrial. Na trajetória atual de concentração de gases de efeito estufa, a Terra se encaminha para aquecer até quase o dobro deste limite (2,9°C).

Nesse sentido, a diplomacia propôs a criação, pelos cientistas do IPCC (Painel Intergovernamental de Ciências Climáticas), de um mecanismo para aferir o quanto cada país contribuiu para o aumento da temperatura global desde 1850. O objetivo é que esses dados impulsionem metas mais ambiciosas na nova rodada de compromissos que os países deverão assumir em 2025, na COP30, em Belém. 

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