Governo brasileiro acompanha com preocupação tensão entre Venezuela e Guiana
Por Lisandra Paraguassu
BRASÍLIA (Reuters) - O governo brasileiro acompanha com preocupação a situação entre Guiana e Venezuela, em meio ao aumento da tensão entre os dois países por causa de um referendo venezuelano marcado para domingo sobre uma possível anexação da província de Essequibo, área que representa dois terços do território da Guiana, mas cuja posse a Venezuela questiona desde o século 19.
"Vemos com preocupação esse ambiente tensionado entre dois países vizinhos e amigos, temos acompanhado com atenção e conversado com altíssimo nível -- vocês se recordam que o embaixador Celso Amorim foi a Caracas se reunir com o governo -- e nós também estamos tendo conversas com a Guiana", disse nesta quinta-feira a secretária de América Latina e Caribe do Itamaraty, embaixadora Gisela Padovan.
Amorim foi a Caracas há uma semana, a pedido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, depois de uma avaliação brasileira de que a campanha venezuelana sobre a anexação do Essequibo teria subido demais o tom, contou a Reuters uma fonte que acompanha as conversas.
O governo brasileiro não pediu que o referendo venezuelano fosse cancelado, mas solicitou ao presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, que diminuísse o tom da campanha e buscasse uma solução pacífica. Lula também recebeu um telefone do presidente da Guiana, Irfaan Ali, com quem também terá uma reunião bilateral na-feira sexta, às margens da COP28, em Dubai.
Há uma visão no governo brasileiro de que a Venezuela não chegará "às vias de fato", apesar de mais de uma vez Maduro já ter ameaçado invadir o território da Guiana.
Na semana passada, durante reunião da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA), em Brasília, os representantes dos dois países trocaram provocações e foi preciso a interferência de outros países para impedir uma escalada na discussão.
"Semana passada os dois países sentaram... e devo dizer ali teve uma energia, uma linguagem um pouco mais elevada por parte da Venezuela, mas eles têm sentado sem qualquer problema na OTCA cooperando na questão da Amazônia sem qualquer problema", disse a embaixadora.
A expectativa do governo brasileiro é que o "sim", pela anexação, vença o referendo, já que esse é um dos poucos assuntos que une governo e oposição na Venezuela, mas não se sabe o que Maduro pretende fazer com esse resultado. Eleições gerais estão marcadas para acontecer em 2024 na Venezuela, e uma ação em relação a Guiana pode virar arma eleitoral, avaliou uma fonte.
A Guiana pediu uma liminar à Corte Internacional de Justiça para impedir a Venezuela de fazer o referendo. Segundo Padovan, espera-se uma resposta até sexta-feira.
Uma área rica em riquezas mineirais, Essequibo representa 159 mil dos 215 mil quilômetros quadrados da Guiana. O território está em disputa desde o século 19, quando os britânicos, então colonizadores da Guiana, ocuparam uma área para além do rio Essequibo, onde havia sido descoberto ouro.
Uma primeira arbitragem, em que os Estados Unidos teriam apoiado o pleito da Venezuela, foi feita em 1897, em Paris, e um acordo dos norte-americanos com os britânicos deu o território a Guiana. Em 1962, ainda insatisfeita com o resultado, a Venezuela denunciou o caso na Organização das Nações Unidas (ONU). Em 1966, um tratado assinado em Genebra reconheceu a reivindicação da Venezuela.
Ao longo dos últimos 57 anos várias mediações foram tentadas, sem sucesso, até que a ONU definiu a Corte Internacional de Justiça como foro para solução, o que a Venezuela discorda. A Corte também ainda não se pronunciou sobre a situação.
Na quarta-feira, o Ministério da Defesa brasileiro informou que intensificou ações de defesa ao longo da fronteira norte do Brasil enquanto o país monitora uma disputa territorial entre seus vizinhos.