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Aborto legal no Brasil: como fica após decisões de Alexandre de Moraes?

 Bruno Santos - 28.set.2023/Folhapress
Imagem: Bruno Santos - 28.set.2023/Folhapress
do UOL

De Universa, em São Paulo

28/05/2024 09h16

O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes determinou, na sexta-feira (24), a suspensão de todos os processos judiciais e procedimentos administrativos e disciplinares motivados pela resolução do CFM (Conselho Federal de Medicina) que restringia o aborto legal acima de 22 semanas.

Na prática, essa medida paralisa ações contra médicos que realizaram aborto legal com o procedimento de assistolia e também proíbe a instauração de novos procedimento contra os profissionais de saúde.

Antes, no dia 17 de maio, Moraes já havia suspendido os efeitos da norma até que uma ADPF (Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental) sobre o tema seja apreciada pelo plenário do STF.

Em maio deste ano, o CFM editou a Resolução nº 2.378/2024, uma norma que proibia a realização do procedimento de assistolia em casos de violência sexual. O procedimento é necessário para a realização do aborto legal em gestações com mais de 20 semanas.

A advogada Letícia Ueda Vella, do Coletivo Feminista Sexualidade e Saúde, explica que a norma do CFM não teve poder de lei, mas, na prática, dificultou o acesso ao aborto a mulheres com mais de 20 semanas de gestação e que estavam nos casos previstos em lei (quando não há outro meio de salvar a vida da gestante; em casos de fetos anencéfalos; e em casos de gravidez resultante de estupro).

Agora, com as duas decisões de Moraes, que está com a relatoria da ADPF na corte, o acesso ao aborto legal é normalizado no país.

"Na decisão, ele entendeu que o CFM violava direitos constitucionais ao proibir a realização do procedimento de assessoria, tanto de mulheres que tinham direito a acessar o aborto legal com mais de 20 semanas de gestação, em casos de violência sexual, como também dos próprios médicos, que tem o seu exercício da medicina limitado ou o seu exercício profissional limitado ao serem proibidos de realizar um determinado procedimento", diz a advogada.

Não cabe ao CFM, como órgão administrativo, estabelecer limite por exercício de um direito que está previsto na lei. A legislação penal garante, desde 1940, o acesso ao aborto legal em casos de violência sexual sem nenhuma exigência. Letícia Ueda Vella, advogada

Agora, a resolução não tem validade até o final do julgamento da ADPF, que avalia a constitucionalidade desta resolução. Ainda não há data para o julgamento no plenário do STF.

Para a defensora pública Fernanda Costa Hueso, coordenadora auxiliar do Núcleo de Promoção e Defesa dos Direitos das Mulheres de São Paulo, a suspensão da norma do CFM reafirma os direitos sexuais e reprodutivos de mulheres e meninas em situação de vulnerabilidade social e a autonomia médica na tomada de decisões clínicas.

"A decisão do ministro garante a proteção de mulheres e meninas vítimas de violência sexual a exercerem o direito ao aborto legal, estabelecido legalmente desde 1940. Ao limitar a realização de procedimento médico reconhecido e recomendado pela Organização Mundial de Saúde, inclusive para interrupções de gestações avançadas, o CFM extrapolou seu poder regulamentar e criou uma barreira de acesso ilegal aos direitos sexuais de reprodutivos", diz.

Médicos perseguidos

Hueso afirma que o posicionamento do Judiciário é importante para evitar que os médicos sejam indevidamente perseguidos ou punidos, já que a resolução criava um ambiente de insegurança jurídica e de temor de represálias legais.

No final de abril, duas médicas foram punidas com suspensão de seus registros médicos por realizaram o procedimento no Hospital e Maternidade Vila Nova Cachoeirinha, em São Paulo.

O episódio gerou manifestações populares em frente à sede do Conselho Regional de Medicina de São Paulo (Cremesp) e foi citado por Moraes em sua decisão. A punição das médicas foi revertida na Justiça.

"A suspensão da normativa impede mudanças abruptas nos protocolos médicos utilizados para a assistência médica em casos de gravidez avançada e continuidade dos serviços de referência já existentes", diz a defensora.

Ao garantir que as mulheres tenham a opção de interromper a gestação em casos de violência sexual, a decisão ajuda a proteger a saúde mental das gestantes, evitando o prolongamento de uma gestação inviável que poderia causar sofrimento psicológico significativo. Fernanda Costa Hueso, defensora pública

Hueso explica que a decisão de Moraes não altera a legislação anteriormente prevista e que mulheres que necessitam de um aborto e que estejam enquadradas nos casos previstos em lei podem procurar o serviço de saúde normalmente para a interrupção da gestação.

Como nem todos hospitais possuem equipe técnica capacitada para realização da interrupção de gestação avançada, os serviços de saúde devem realizar os encaminhamentos adequados para garantia do tratamento de saúde às mulheres vítimas de violência sexual.

"Caso um profissional da saúde se sinta pressionado ou coagido deve denunciar a situação, fazer uso dos canais de ouvidorias, buscar apoio do sindicato e tutela do Poder Judiciário", finaliza a defensora pública.

O CFM publicou uma nota informando que vai encaminhar ao STF argumentos em defesa da resolução nº 2.378/2024 sobre assistolia fetal e diz estar amparado Lei nº 10.406/2002, que põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro; pela Declaração Universal dos Direitos Humanos, que estabelece que ninguém deve ser tratado ou punido de forma desumana ou degradante; e pela Convenção Americana de Direitos Humanos, a qual descreve que toda pessoa tem direito de que se respeite sua vida desde o momento da concepção, não podendo ser privada da vida arbitrariamente.

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