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'Sofrer um aborto me fez entender que coisas não acontecem só com a gente'

Ana Luiza Paganini com o marido Anderson e os filhos Adriano e Daniela - Acervo pessoal
Ana Luiza Paganini com o marido Anderson e os filhos Adriano e Daniela Imagem: Acervo pessoal
do UOL

Luciana Bugni

Colaboração para Universa

23/04/2024 14h35

"Engravidei primeira vez em 2010, após seis anos de casamento. Foi uma gravidez desejada, calculada, maravilhosa. Depois de dois meses e meio, fui ao banheiro e percebi que havia sangue na minha urina. Aí foi aquela correria: fui ao hospital, fiz ultrassom e me disseram que não tinha um coração batendo. Avisaram que a gestação não vingaria e eu precisaria esperar uma semana em casa, após tomar remédio, e que muitas mulheres expelem o feto naturalmente.

Uma semana depois, nada havia acontecido e tive de voltar ao hospital para fazer, na maternidade, uma curetagem. O fato de o procedimento ser feito no mesmo lugar onde as mães ganham seus bebês e saem carregando eles no colo foi horrível.

Nesse processo após o aborto, descobri que muitas pessoas passam por isso, mas ninguém fala sobre o assunto. Então, comecei a falar cada vez mais sobre isso. A gente não pode achar que as coisas acontecem só com a gente e comentar o assunto pode melhorar a vida de outras pessoas.

Em 2011, engravidei outra vez: Adriano foi planejado e querido, mas eu não curtia. Achava que ia sair sangue toda vez em que ia ao banheiro. Comecei a comprar coisas para o bebê só com seis meses de gestação. E passei a curtir a barriga com sete meses. Estava tudo bem com ele o tempo todo e todos me diziam que era bobagem eu me sentir daquela maneira, já que era normal perder. A sensação de colocar o feto, seu projeto de vida, em risco, era terrível. Mas nunca me culpei por ter perdido o primeiro. Acho que as coisas acontecem porque têm de acontecer. É meio 'gratiluz' dizer isso, mas toda situação complicada é de fato uma oportunidade de aprendizado.

A gestação correu muito bem até a 38ª semana, quando descobri, em um ultrassom, que havia pouco líquido amniótico. Foi um susto, porque a médica decidiu fazer parto naquele dia. Voltei ao trabalho, organizei as coisas no escritório e voltei ao hospital para tentar induzir o parto normal. Foram 14 horas tentando, mas o coração de Adriano estava um pouco lento e decidimos ir para a cesárea. Foi uma sensação de derrota, mas também um sentimento de que deveria ter feito a cesárea antes, pois não faria sentido fazê-lo sofrer só para ter parto natural.

Adriano nasceu e deu tudo certo. A gente não teve nenhum problema de saúde.

Nunca fui deixada de escanteio por estar grávida e, mesmo no trabalho, onde atuo como advogada, sempre fui tratada com muito afeto. Quando engravidei pela terceira vez, fui contar para o chefe com medo, mas ele logo me disse que era uma notícia boa. Hoje, Daniela tem 8 anos. As pessoas dizem que vai dar tudo certo porque realmente querem acreditar que vai dar certo. E eu nunca me coloquei em uma posição de responsável pelo que aconteceu na primeira gestação ou por ter tido pouco líquido na gravidez do Adriano.

Tombos podem ser muito bons. Tive esse aborto, depois tive câncer. Sem os tombos a gente não conseguiria aprumar a vida.

Meu marido é um grande otimista e achava que as coisas iam dar certo no final. Viver com alguém assim melhora a vida. Conversar, buscar apoio, deixar o homem participar, trazendo para perto é importante para se manter em pé. A dor quando perdemos o bebê foi minha e do pai da criança. No puerpério a dor de amamentar era minha, mas ele estava ali do lado.

Todo mundo tem problema na gravidez e vontade de fugir daquilo que está enfrentando. Só eu perdi um filho? Não, as coisas acontecem com todo mundo. Quando nos damos conta de que tudo pode acontecer com todo mundo, vivemos um processo de menos culpabilização. Meu conselho é pensar que as coisas acontecem e tentar buscar o melhor, ver um lado positivo na tragédia. Sempre temos uma nova chance; as coisas se organizam. Meu conselho para quem está grávida é: converse com outras mulheres, você não está passando por isso sozinha."

Ana Luiza Paganini, 41 anos, advogada, mãe de Adriano, 12 e Daniela, 8

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