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OPINIÃO

Lula 3 volta às origens e vai ao ataque na defesa do seu mandato

Lula segura cartaz pedindo "taxação dos super-ricos", em agenda na Bahia - Ricardo Stuckert / PR
Lula segura cartaz pedindo 'taxação dos super-ricos', em agenda na Bahia Imagem: Ricardo Stuckert / PR
do UOL

Ricardo Kotscho

Colunista do UOL

06/07/2025 05h30

O vento virou novamente. Encurralado por um Congresso reacionário e fisiológico dominado pelo centrão bolsonarista, em que tem minoria absoluta (menos de cem deputados no colegiado de 513), esta semana Lula saiu das cordas para voltar às origens do PT, na luta por justiça social e na defesa do que resta do seu mandato em busca da reeleição.

Após a acachapante derrota na votação que derrubou a mudança no IOF (Imposto sobre Operações Financeiras), na semana anterior, Lula despertou para a realidade: sem poder contar com a frágil base aliada e despencando nas pesquisas, se ficasse parado, não teria mais como governar. Foi ao ataque e recorreu ao STF contra a decisão do Congresso, uma iniciativa de alto risco.

O governo Lula acabou, já proclamavam os líderes da oposição e amplos setores da mídia e do mercado. Vivia-se no Palácio do Planalto o mesmo clima pesado de 2005, quando estourou o escândalo do mensalão e foi anunciada a primeira morte política do metalúrgico que virou presidente da República prometendo acabar com a fome.

Lula acabou reeleito por ampla margem de votos, como sabemos, fez a sua sucessora e, ao concluir o segundo mandato, saiu do Planalto com mais de 80% de aprovação popular.

A convite dele, passei a última semana de governo do segundo mandato no Alvorada para fazer uma reportagem de balanço desses oito anos para a revista Brasileiros. Na despedida, perguntei a ele sobre seus planos e se pensava em concorrer novamente à Presidência no futuro. Lula descartou de pronto essa possibilidade.

"Quem me garante, primeiro, ganhar nova eleição? Depois, fazer um novo governo com esta mesma aprovação popular?"

Doze anos depois, em 2022, sem nenhuma garantia, mudou de ideia. Era novamente candidato, por ser o único capaz de impedir a reeleição de Jair Bolsonaro (PL). Eleito sob a bandeira da defesa da democracia ameaçada por um bando de golpistas, encontrou um Congresso extremamente hostil e uma oposição feroz que só queria impedir o governo de governar.

Do nada, de onde menos se esperava, das redes sociais, veio agora a reação que deu sobrevida a Lula, com a ajuda da inteligência artificial: a campanha "Taxação BBB - Bilionários, Bancos e Bets - por mais justiça social e menos desigualdades", que logo alcançou 10 milhões de visualizações, algo inédito na esquerda.

Taxar os 140 mil super-ricos e as apostas online era o mote da campanha para isentar 25 milhões de brasileiros do Imposto de Renda, o principal projeto do governo. Foi a maneira de mostrar de que lado estava o Congresso e de que lado estava o governo, ou seja, o velho embate de pobres contra ricos, o andar de baixo contra o andar de cima, nós contra eles, que levou o PT a cinco vitórias presidenciais nas últimas duas décadas.

Quem primeiro notou a mudança dos ventos foi a repórter Letícia Casado, colega do UOL, que publicou esta semana a coluna "Lula 3 abraça lema da justiça social e faz ofensiva para proteger legado".

Era a bandeira que faltava para o governo na campanha pela reeleição e lhe caiu no colo, já que não há nome na esquerda competitivo para suceder Lula na urna, mesmo que ele não queira concorrer, o que não é o caso. Só a defesa da democracia já não basta mais: era preciso dar aos eleitores uma nova esperança de vida melhor, um horizonte de futuro.

De quebra, essa mudança de discurso serviu para unir o governo em torno da política econômica de Fernando Haddad, que se tornou o principal porta-voz do governo. A oposição sentiu o baque e ressuscitou o projeto da anistia, o único que tem para oferecer ao país. A bola agora está com o ministro Alexandre de Moraes, que na sexta-feira (4) convocou os dois lados para uma reunião de conciliação.

O cenário de confronto aberto entre os dois Poderes chegou ao final da semana sem sinais de cessar-fogo. Lula já tinha dado um alerta de que estava decidido a não apanhar calado na entrevista ao podcsat de Mano Brown quando disse que "o Congresso já foi longe demais, é importante estabelecer um limite".

Para não virar uma rainha Elizabeth, com cada vez menos poderes sobre o Orçamento, o presidente deixou de lado a figura do "Lulinha paz e amor" para assumir novamente o bravo João Ferrador ("Hoje eu não tô bom"), personagem da luta sindical no ABC que projetou Lula na política nacional e deu origem ao PT há quase meio século.

Lula já ressuscitou politicamente várias vezes, desde que ficou em quarto lugar na sua primeira eleição para governador de São Paulo, em 1982, e depois perdeu três disputas presidenciais seguidas antes de chegar ao poder em 2002.

Se essa guinada de 2025 vai dar certo ou não, com o governo partindo para o tudo ou nada, em vez de esperar a morte chegar, só as próximas semanas dirão.

Das redes sociais, a campanha por justiça social e distribuição de renda já pulou para as ruas na quinta-feira, com a ocupação da sede do banco Itaú na Faria Lima, um protesto pacífico do movimento Povo sem Medo, que mobilizou a militância adormecida.

Novo protesto já foi marcado para o próximo dia 10, na avenida Paulista, às 18 horas, lance de alto risco em dia de semana, pois serão inevitáveis as comparações de público com os atos de Bolsonaro no mesmo local, que vinham minguando.

Ficou claro para o governo que a defesa da democracia era só o primeiro passo, fundamental para dar o seguinte, que é atacar a enorme desigualdade social do país, desafio que está na própria fundação do PT no século passado.

O governo Lula 3 ainda não acabou, mas o Lula 4 é incerto. Vai depender de como as próximas pesquisas avaliarão a guerra aberta entre o governo e o Congresso, que está só começando. Por enquanto, está dando empate.

Vida que segue.