Avignon: maior festival cênico do mundo abre suas portas com homenagem ao Brasil em mostra paralela
O Festival de Avignon inicia sua 79ª edição neste sábado (5), com uma programação que destaca criações de dança contemporânea ao lado do teatro, e celebra, em 2025, a língua árabe. Sob a direção de Tiago Rodrigues, o evento festeja ainda este ano o Brasil como país convidado de honra no OFF, a mostra palela, reafirmando seu compromisso com o diálogo intercultural e a inovação artística.
A escolha do Brasil como país "convidado de honra" do Festival Off de Avignon em 2025 marca, segundo Harold David, copresidente da associação que promove a mostra paralela, "o início de uma colaboração de longo prazo entre a França e o Brasil". Em entrevista à RFI, David destacou que essa escolha é mais do que simbólica: segundo ele, trata-se de um "ponto de partida estratégico" que ele espera "perdurar no futuro".
Onze companhias brasileiras farão parte da mostra paralela que em 2025 completa 59 anos, neste que é o maior evento de artes cênicas do mundo. Alguns nomes e peças dessa programação brasileira foram anunciados em evento na embaixada brasileira de Paris, como História do Olho, de Janaina Leite e o coletivo Núcleo do Olho, além de Azira'I, de Zahy Tentehar.
Elas se incluem numa extensa programação de 1.724 peças na oferta teatral de 2025, com a presença de 1347 companhias de teatro, francesas e estrangeiras. A expectativa, segundo a previsão da organização, é de vender mais de 6 milhões de ingressos apenas na mostra paralela, o OFF.
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Entre os destaques, o Village du Off contará com estandes organizados pela associação La Terreirada, Fundação Nacional de Artes (Funarte) e França América Latina. Esses espaços proporcionarão encontros, oficinas de práticas artísticas e projeções, estimulando o intercâmbio entre artistas e espectadores.
Para Tiago Rodrigues, diretor do Festival de Avignon desde 2023, esta edição reforça a internacionalização e a valorização das mulheres no festival. Segundo declarou à revista Télérama, "O objetivo é mostrar uma cultura viva, oferecer uma plataforma para vozes do mundo inteiro e promover o encontro entre artistas e públicos." Nesta edição, a língua árabe também recebe destaque, com 30% dos espetáculos vindos do mundo árabe. Rodrigues explica: "O árabe é uma língua de diálogo, luz e transmissão, falada em países onde as artes ao vivo têm uma riqueza imensa."
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Apesar do destaque ao Brasil, o OFF também abrirá espaço para outras culturas menos representadas na cena francesa. "Vamos apresentar artistas do Cazaquistão, do Uzbequistão... regiões que são ainda mais abstratas para o público francês do que o Brasil", aponta o copresidente da associação que promove a mostra paralela. A circulação das obras, segundo Harold David, "permite a circulação de ideias" e contribui, inclusive, para a defesa da democracia: "É conhecendo outras realidades que conseguimos imaginar futuros diferentes para o nosso próprio país".
Mostra oficial (IN) traz criações e performances participativas
No IN, a abertura oficial acontece neste sábado com uma programação ousada. Marlene Monteiro Freitas, coreógrafa cabo-verdiana de renome, apresenta sua nova criação NÔT no Palácio dos Papas, às 22h (hora local). Seu trabalho, que mistura dança e teatro, simboliza o espírito desta edição, onde criação e engajamento artístico se entrelaçam.
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Artista fora do comum, com um universo multifacetado e colorido, a cabo-verdiana é a convidada de honra ("parceira") deste importante encontro internacional de teatro e dança no sul da França. Sua criação, NÔT, para oito performers e músicos, será apresentada até 11 de julho.
No clássico da literatura árabe, Sherazade se oferece para contar uma história todas as noites ao sultão, interrompendo-a pela manhã para evitar ser executada. "Quis me apoiar na ideia de suspensão, retomada e interrupção que ocorre a cada amanhecer", assim como na noção de "encaixe" de pequenas histórias dentro de uma narrativa maior, contou Freitas.
NÔT (que significa "noite" no crioulo cabo-verdiano) também brinca com a confusão de referências e variações de escala: "Coisas, durante a noite, parecem muito grandes, monstruosas, ou ao contrário, muito pequenas, insignificantes. É também durante a noite que planos e sonhos parecem realizáveis", acrescentou a encenadora.
Outro destaque, além das novas criações de diretores festejados na cena mundial, como o suíço Milo Rau e o alemão Thomas Ostermeier, é a performance participativa They Always Come Back, de Bouchra Ouizguen, que convida o público a uma experiência coletiva e livre, na Praça do Palácio dos Papas, a partir das 19h (14h de Brasília) no dia da abertura.
O IN também homenageia figuras importantes da língua árabe, como o poeta Mahmoud Darwich e a cantora Oum Kalthoum, em parceria com o Instituto do Mundo Árabe de Paris.
História de encontros e criações
O Festival de Avignon, fundado em 1947 por Jean Vilar, tornou-se ao longo das décadas um espaço emblemático para o teatro e as artes cênicas. Desde sua primeira edição, ele é um ponto de encontro artístico que recebe artistas do mundo inteiro e apresenta uma programação ousada e inovadora.
Sob a direção de Tiago Rodrigues, o festival reforçou sua abertura internacional, valorizando artistas de diversas culturas e estimulando o intercâmbio cultural. Essa orientação se materializa na valorização de línguas convidadas, como o inglês em 2023 e o espanhol em 2024, além do Brasil como país convidado de honra em 2025.