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Trilha onde Juliana morreu tem 'guias despreparados', diz brasileira

do UOL

Tiago Minervino

Colaboração para o UOL, em São Paulo

25/06/2025 05h30

Os guias que trabalham no Parque Nacional do Monte Rinjani, onde Juliana Marins morreu, "não estão preparados" para lidar com situações emergenciais e operam mais como ajudantes para levar barraca e alimentação, segundo relatou ao UOL a brasileira Lívia Ceroni, que já realizou o mesmo trajeto.

O que aconteceu

Maioria dos guias do parque "não tem preparo para lidar com emergências ou dar suporte real", diz Lívia, que também fez a expedição até o cume do vulcão Rinjani. Os guias "estão lá mais para carregar barraca, comida e água", diz a brasileira.

Lívia classificou o trabalho braçal feito pelos guias como desumano. "É muito puxado. Eles sobem com muita coisa nas costas, fazem um esforço que chega a ser desumano às vezes."

A brasileira conta que a trilha onde morreu Juliana é um "lugar super-remoto, sem estrutura nenhuma". "Não é um caminho fácil. Em vários trechos a subida é bem íngreme, escorregadia, e você precisa estar o tempo todo muito atento. Mesmo com cuidado, é fácil de escorregar ou cair. O local é lindo, mas exige bastante cuidado."

Lívia afirmou que a maioria das pessoas, inclusive ela, "não tem ideia da dificuldade" que é realizar essa trilha. "O trajeto em si é muito desafiador: em vários pontos é estreito, perto de barrancos, e o solo é feito de pedra vulcânica, terra solta, o que faz escorregar com facilidade. Em muitos trechos não tem onde se segurar, então é comum perder o equilíbrio".

Eu escorreguei e caí algumas vezes, voltei toda roxa, mas nada grave. É algo normal durante o caminho por causa da geografia do lugar, da altitude e da instabilidade do terreno. Então, sem dúvida, o mais difícil pra mim foi a falta de preparo físico e o trajeto em si.
Lívia Ceroni

Trilha que leva ao Monte Rinjani pode ser feita entre dois ou três dias. O local, na ilha de Lombok, tem uma altura de 3.726 metros e fica a 1.200 km de Jacarta, a capital da Indonésia.

Para fazer o trajeto é necessário "muito esforço, preparo e técnica", segundo a triatleta e maratonista Isabel Leoni. Ela também já realizou o percurso e disse que o público costuma "subestimar muito a montanha".

Isabel afirma que os guias do parque não orientam corretamente os turistas e fornecem pouca água e comida aos visitantes. "Eu era inexperiente [quando fiz a subida]. Se hoje eu fosse para lá, levaria uma garrafa de água, comida, isotônicos e remédio", afirmou, em entrevista à Agência Brasil.

A triatleta pontua que, além do trajeto perigoso, o frio rigoroso é mais um dificultador para completar a subida. "Os guias não avisam direito sobre o que vamos enfrentar. Eles vivem em situações muito precárias de trabalho. Faziam a trilha de chinelo. Não há protocolos informando quais são os equipamentos obrigatórios, como casacos e sacos de dormir [...] Eu estava com poucos casacos. Meus dedos dos pés congelavam. Eu não conseguia andar de tanto frio".

O pacote para realizar a escalada até o cume do vulcão Rinjani sai por pelo menos 2 milhões de rupias indonésias (R$ 667 na atual cotação). Juliana comprou o pacote de três dias por ser mais lento. No valor, estão incluídas alimentação e bebida.

O UOL entrou em contato com o Parque Nacional do Monte Rinjani para pedir posicionamento, mas não obteve retorno. Se a resposta for enviada, esta matéria será atualizada.

Brasileira foi achada morta após quatro dias

Informação sobre morte veio após o quarto dia de tentativa de resgate da brasileira. "Com imensa tristeza, informamos que ela não resistiu", afirmou a família. Poucas horas antes, o Ministério do Turismo daquele país afirmou que ela estava em "estado terminal", segundo avaliação das equipes de busca.

Governo brasileiro lamentou a morte e informou que corpo de Juliana foi encontrado pelas equipes de resgate. Segundo o órgão, as buscas foram dificultadas pelas "condições meteorológicas de solo e de visibilidade adversas".

Pai de Juliana estava a caminho de Bali quando corpo foi encontrado. Manoel Marins disse nas redes sociais que estava partindo de Lisboa para o país asiático por volta das 8h (horário de Brasília). Ele chegou ao aeroporto português anteontem, mas não conseguiu voar porque a bombardeios da guerra entre Israel e Irã provocaram o fechamento de aeroportos no Oriente Médio.

Parentes agradeceram pelo apoio recebido nas redes sociais. O perfil criado para compartilhar informações sobre o resgate da brasileira ganhou 1,5 milhão de seguidores em quatro dias.

Entenda o caso

Juliana Marins caiu em trilha do vulcão Rinjani, na Indonésia - Reprodução/Redes Sociais - Reprodução/Redes Sociais
Juliana Marins caiu em trilha do vulcão Rinjani, na Indonésia
Imagem: Reprodução/Redes Sociais

A publicitária Juliana Marins, de 26 anos, tropeçou e escorregou durante a trilha na noite de sexta-feira (20). Ela rolou da montanha e foi parar cerca de 300 metros abaixo do caminho da trilha, no vulcão Rinjani, na ilha de Lombok. Com isso, ficou debilitada e não conseguia se movimentar.

Três horas depois do acidente, um grupo de espanhóis encontrou a brasileira. A irmã dela, Mariana, que vive em Niterói (RJ), disse ao UOL que as pessoas que passaram pelo local perguntaram o nome de Juliana e tentaram achar familiares e amigos dela pelas redes sociais.

Família acompanhou situação por fotos e vídeos enviados pelos espanhóis, na espera pelo resgate. Mariana diz que tudo se agravou com o aparecimento de uma neblina e umidade muito forte, que fez com que Juliana escorregasse ainda mais da pedra. A irmã chegou a dizer que seria um ''absurdo se ela morresse por falta de socorro''.

Demora no resgate ocorreu por dificuldades na trilha, diz governo local. A Barsanas (Agência Nacional de Resgate da Indonésia) afirmou que a dificuldade de acesso à trilha fez com que as pessoas que viram que Juliana tinha caído levassem oito horas até conseguir avisar as autoridades sobre o acidente. Segundo eles, desde o primeiro dia tentativas de resgate com cordas e macas foram feitas, sem sucesso.

Drone térmico localizou paradeiro da brasileira anteontem, perto de um desfiladeiro. A agência de resgate afirmou que Juliana foi vista imóvel, centenas de metros abaixo do ponto da queda original dela e à beira de um desfiladeiro de "altíssima dificuldade de acesso".