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Guerra no Oriente Médio ameaça inflação e balança comercial

Dado Ruvic/Illustration/Reuters
Imagem: Dado Ruvic/Illustration/Reuters
do UOL

Alexandre Novais Garcia

Do UOL, em São Paulo (SP)

24/06/2025 05h30

A escalada dos conflitos no Irã atrai as atenções do mundo, com potencial para atingir diversos setores econômicos mesmo sem o fechamento do Estreito de Ormuz.

O que aconteceu

Entrada dos Estados Unidos na ofensiva amplia temores. Os ataques às usinas nucleares iranianas confirmaram o ingresso da maior força militar do mundo no conflito no Oriente Médio. Como retaliação, o Irã alvejou bases militares dos Estados Unidos no Iraque e no Qatar.

Mesmo depois que o presidente dos EUA, Donald Trump, anunciou um cessar-fogo ontem à noite, o conflito continuou. Israel acusou o Irã de violar o pacto e, na manhã desta terça-feira, ordenou um "resposta firme" aos mísseis supostamente lançados por Teerã, que nega o ataque.

Bloqueio do Estreito de Ormuz seria o primeiro entrave. O parlamento iraniano aprovou o bloqueio da rota responsável pelo escoamento de mais de 20% do petróleo mundial. A decisão afetaria negativamente a cadeia mundial de energia, mas ainda depende da aprovação do Conselho Supremo de Segurança Nacional do Irã e do líder supremo, aiatolá Ali Khamenei.

Encarecimento dos combustíveis seria imediato. A possibilidade de menor distribuição de petróleo no Golfo Pérsico fez o preço do barril de petróleo disparar mais de 20% e encostar nos US$ 80. As estimativas apontam que o bloqueio da rota pode colocar o valor do Brent, referência internacional para o combustível, acima de US$ 100 pela primeira vez desde 2022.

Há análises estimando um barril a US$ 120 caso haja interrupção desse fluxo por um período prolongado.
Paula Zogbi, estrategista-chefe da Nomad

Alianças entre o Irã e a China podem inibir o fechamento. "Acreditamos que a chance desse evento ocorrer é baixa, dada a elevada dependência da economia do Irã das exportações de óleo", diz Omar Mitre, head de multimercados do ASA. Ele ressalta que Pequim compra 90% do petróleo exportado pelo Irã.

Efeito inflacionário

Guerra atinge a economia mesmo com o Estreito aberto. O conflito no Oriente Médio tem o potencial de prejudicar outros setores econômicos, ainda que o fluxo pela rota com 33 km de largura permaneça inalterado. "O Golfo Pérsico e o Mar Vermelho comprometem a rota logística de uma série de companhias de navegação. Qualquer aumento nos prazos ou nos custos de transporte de cargas entre Ásia e Europa e Ásia e América, afeta o mundo inteiro", diz Nyegray.

A geopolítica determina o preço de ativos globais, como o petróleo, o dólar e as commodities agrícolas, o que tem impacto sobre a inflação, a balança comercial e o fluxo cambial no Brasil.
Sidney Lima , analista da Ouro Preto investimentos

Valorização do petróleo chegará ao bolso dos motoristas. Mesmo com o fim da política de paridade, que acompanhava a variação dos preços do petróleo para definir o valor dos combustíveis, a Petrobras deverá repassar o custo mais elevado do petróleo às distribuidoras. "Vai chegar um momento em que a Petrobras não vai conseguir segurar o prejuízo com o petróleo mais caro lá fora e um preço pré-tensões geopolíticas", avalia João Alfredo Nyegray, professor de Negócios Internacionais da PUC-PR.

Fretes também serão atingidos e resultarão em inflação. Como consequência do aumento dos combustíveis, o transporte das mercadorias tende a subir e elevar os preços dos produtos nas gôndolas. Nyegray explica que o cenário reflete o uso de caminhão para transportar 90% dos bens produzidos no Brasil. "Qualquer oscilação dos valores do petróleo ou diesel vai acabar gerando um efeito em cadeia", afirma ele.

Exportações e importações brasileiras serão prejudicadas. A maior dificuldade no trânsito global de mercadorias abre caminho para novos entraves aos produtores. Nyegray ressalta que o norte da África e o Oriente Médio são consumidores do frango brasileiro fabricado nos padrões da religião muçulmana. "Qualquer interrupção nos fluxos logísticos para lá, vai afetar a nossa exportação."

Consequência sobre os fertilizantes afeta o agronegócio. O Irã é o terceiro maior exportador de fertilizantes à base de ureia no mundo e direciona parte da sua produção para as fazendas brasileiras. "A gente compra muitos fertilizantes do Irã e vende muito milho e muito frango. Haverá uma dificuldade para enviar e retirar produtos de lá", afirma Nyegray. Ele estima que o deslocamento entre o Brasil e o Golfo leva entre 21 e 30 dias e tende a prejudicar as negociações futuras.

Fuga de investimentos no Brasil também não é descartada. Diante do cenário de elevada incerteza, os investidores tendem a procurar por países mais sólidos. "Em condições como essa, o capital tende a buscar ambientes de países já desenvolvidos por uma aversão ao risco", reforça Nyegray.

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