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Por que uma nova guerra agora? O que querem Israel e Irã no conflito?

O primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, e o líder supremo do Irã, Ali Khamenei - Defesa dos EUA e governo do Irã/Divulgação
O primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, e o líder supremo do Irã, Ali Khamenei Imagem: Defesa dos EUA e governo do Irã/Divulgação
do UOL

Do UOL, em São Paulo

18/06/2025 05h30Atualizada em 18/06/2025 15h12

A origem do conflito entre Israel e Irã, que já matou centenas de pessoas em menos de uma semana, tem relação com o momento de fraqueza política — interna e externa — nos dois países, segundo especialistas em relações internacionais ouvidos pelo UOL.

O que aconteceu

'Timing' do conflito iniciado por Israel "não parece aleatório", avalia professor. Segundo Fernando Brancoli, pesquisador e docente de Segurança Internacional e Geopolítica da UFRJ, o governo israelense percebeu um "momento de fraqueza iraniana", com aliados regionais do Irã, como Hezbollah e Hamas, enfraquecidos por confrontos recentes e sanções econômicas. Além disso, ele lembra que Teerã estava em negociações nucleares com os Estados Unidos, o que, futuramente, poderia impedir Israel de "justificar militarmente" suas ações contra o Irã.

Mesmo sob intensa condenação internacional e pressão interna pelo fim da guerra em Gaza, o governo Netanyahu calculou que este era o momento oportuno para um ataque decisivo aos arsenais nucleares e à liderança militar iraniana. Foi uma manobra para preservar sua superioridade e garantir segurança percebida [subjetiva]. Fernando Brancoli

Avaliação é corroborada por outros analistas, que ressaltam que Israel também considerou ataques como "oportunidade" de melhorar a própria imagem e "tirar o foco de Gaza". É o que afirmam, em consenso, os internacionalistas Denilde Holzhacker e Roberto Uebel, professores de relações internacionais da ESPM, Kai Enno Lehmann, professor do IRI-USP (Instituto de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo), e Karina Stange Calandrin, pesquisadora e professora de RI do Ibmec.

Netanyahu estava numa posição interna de negociação, quase perdendo a maioria na coalizão interna que o sustenta [no Parlamento Israelense] e com uma pressão muito forte de grupos mais conservadores para que ele tivesse uma posição mais dura em relação ao Irã, que é a potência militar vista como a maior ameaça a Israel hoje. De outro lado, é também uma forma de tirar o foco de Gaza e das ações israelenses alvos de críticas internacionais. É o que Netanyahu costuma fazer, promover uma ação externa que sabe que vai ter um apoio maior internacional, para abafar outra. Denilde Holzhacker

Os ataques de Israel contra o Irã até aqui parecem ter também uma finalidade política interna para o governo Netanyahu, que é tirar o foco das questões que envolvem a faixa de Gaza, além de demonstrar força internacional e desestabilizar o regime iraniano. Roberto Uebel

O governo israelense estava em crise, com uma possibilidade real de cair. Ao mesmo tempo, havia pressão da extrema direita para o governo Netanyahu punir e bombardear o Irã. Então, em termos de segurar o governo no poder, iniciar esses ataques contra o regime iraniano, que hoje enfrenta muitas dificuldades internas e externas, ajudou. (...) Existia uma oportunidade do ponto de vista israelense e, se quisesse fazer algo contra o Irã, agora seria o momento ideal. Kai Enno Lehmann

Por que agora?! Visto que a discussão sobre o programa nuclear do Irã é antiga, o ataque ter ocorrido nesse momento tem muita relação com o que está acontecendo com a política interna de Israel. O governo israelense já está em guerra na Faixa de Gaza há quase dois anos e isso não tem sido popular internamente. A população de Israel tem se manifestado contra a guerra quase diariamente e o governo Netanyahu têm perdido muito apoio, inclusive de aliados políticos. Karina Stange Calandrin

Não é a primeira vez que Israel tenta alcançar popularidade por meio de ataques bélicos, acrescenta Calandrin. Ela lembra que outro ataque promovido pelo governo israelense para atrair apoio interno ocorreu no ano passado, com os bombardeios que visavam atingir alvos do Hezbollah no Líbano e mataram centenas de pessoas. "A popularidade dele subiu um pouco naquela época e ele está apostando que vai subir de novo agora, para distensionar com os partidos da coalizão e conseguir se manter no poder mais um tempo", diz a professora do Ibemec, que também é pesquisadora do Grupo de Estudos de Defesa e Segurança Internacional da Unesp.

E o que busca o Irã?

Irã também passa por momento de instabilidade política interna. Conforme explica Roberto Uebel, além de contar com poderosos adversários externos, como Israel, Arábia Saudita e Estados Unidos, o regime dos aiatolás passa por momento de disputa interna por poder e baixa popularidade. "A população do país hoje enfrenta desemprego elevado, cada vez mais censura, restrição às liberdades individuais, perseguições políticas (...). Enfim, não apoiam o regime, e isso é um elemento de desestabilização interna que pressiona o Irã a agir para se defender".

Enfraquecido, Irã precisa demonstrar que ainda consegue contra-atacar. Segundo Kai Enno Lehmann, o regime iraniano está "sob enorme pressão" de responder à altura aos ataques israelenses, principalmente "por razões domésticas". O professor do IRI, da USP, pondera que ainda não se sabe "até que ponto o Irã tem a capacidade de responder com a força necessária" para fazer Israel recuar. A análise é corroborada pelos demais especialistas ouvidos para a reportagem.

Não se pode subestimar a força militar do Irã, mas Israel tem vantagens, ressalta professor. Para Fernando Brancoli, da UFRJ, "no curto prazo, o Irã enfrenta fortes restrições tecnológicas e geográficas, além da capacidade de Israel e seus aliados, incluindo os EUA, de interromper ataques". Já no médio ou longo prazo, segue o pesquisador, "Teerã ainda possui arsenal de mísseis balísticos e capacidade de agir via proxies. Seu potencial de escalada existe, mas é improvável que consiga ameaçar seriamente a segurança interna de Israel por agora".