Por que Kirchner, condenada por corrupção, poderá cumprir pena em casa?

Condenada por corrupção, a ex-presidente argentina Cristina Kirchner, 72, deve cumprir em casa a pena de seis anos de prisão confirmada ontem pela Suprema Corte.
Por que ela tem direito à prisão domiciliar
A legislação argentina autoriza prisão domiciliar a condenados com mais de 70 anos. Segundo o artigo 32 da Lei 24.660, o juiz de execução pode determinar o cumprimento da pena em casa com base na idade, sem necessidade de enfermidade ou fragilidade física. O jornal Clarín destaca que esse critério é aplicado de forma recorrente e consolidado na jurisprudência.
O juiz Jorge Gorini avaliará o pedido que já foi protocolado. A defesa argumenta que Cristina detém "segredos de Estado", além de ter "sofrido uma tentativa de homicídio" em setembro de 2022.
A Suprema Corte da Argentina confirmou a condenação dela por administração fraudulenta em contratos de obras públicas. A pena de seis anos de prisão, somada à inabilitação perpétua para cargos públicos, não implica detenção em penitenciária.
A jurisprudência da Câmara Federal de Cassação Penal reforça que a idade por si só é suficiente para concessão do benefício. Não há exigência de laudo médico — embora o juiz possa requisitá-lo por cautela. A residência indicada pela defesa fica no bairro Constitución, em Buenos Aires, conforme informou o LMNeuquén.
No Brasil o direito à prisão domiciliar depende da fase processual. Conforme o artigo 318 do Código de Processo Penal, o réu pode ser beneficiado se tiver mais de 80 anos, estiver gravemente doente ou apresentar outras situações excepcionais —mas somente durante a fase de prisão preventiva. Já o artigo 117 da Lei de Execução Penal permite prisão domiciliar a condenados maiores de 70 anos que já estejam em cumprimento de pena.
Cristina não é a primeira autoridade argentina a cumprir pena domiciliar por idade. O ex-presidente Carlos Menem, em 2001, foi preso preventivamente aos 70 anos e passou 167 dias em prisão domiciliar. Já o ex-vice-presidente Amado Boudou teve a prisão substituída por detenção em casa em 2020, ainda que por outros fundamentos.
A Justiça deu cinco dias úteis para que os nove condenados se apresentem voluntariamente. O prazo foi informado em decisão judicial obtida pela colunista do UOL Amanda Cotrim. O objetivo é permitir a formalização das prisões num "prazo razoável", considerando que alguns réus residem fora da capital. Em tese, Cristina deverá se apresentar nesse intervalo para dar início ao cumprimento da pena em casa.
A condenação de Cristina tem efeitos jurídicos e eleitorais. A ex-presidente havia confirmado, dias antes da decisão, que disputaria uma vaga como deputada pela província de Buenos Aires. Com a confirmação da sentença pela Suprema Corte, a candidatura se tornou inviável, já que ela também está inabilitada para cargos públicos definitivamente.
Ex-presidente chamou condenação de "perseguição política e jurídica". Ela discursou a apoiadores que se mobilizaram diante a sede do Partido Justicialista. "Essa condenação tem um cronograma eleitoral", disse.
Cristina também ironizou a medida. "Acham que vão resolver isso me prendendo? Vão aumentar os salários dos argentinos? Vão pagar a dívida com o FMI?". A CGT (Central Geral do Trabalho), principal entidade sindical do país, declarou apoio incondicional à política.
Ela afirmou que ser presa por causas políticas é motivo de honra. "Enquanto alguns seguem livres por renegociar dívidas que afundaram o país, estar presa é um certificado de dignidade", declarou. A ex-presidente também mencionou a tentativa de assassinato sofrida em 2022, em frente à sua casa em Recoleta. "Sou uma fuzilada política que está viva. E agradeço por isso todos os dias".