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Novo Código pode criar herança de bens digitais: de senhas a milhas aéreas

do UOL

Do UOL, em São Paulo

19/05/2025 05h30Atualizada em 19/05/2025 22h16

O Código Civil pode ganhar regras sobre herança digital, especialmente de senhas bancárias de quem falece, caso uma proposta em discussão no Congresso for adiante nos próximos meses.

O que aconteceu

Reforma propõe que bens digitais passem a fazer parte de patrimônio a ser dividido após a morte. A chamada herança digital abrange todos os bens digitais de uma pessoa falecida. Senhas de banco, de perfis em redes sociais e de programas de milhas de companhias aéreas são alguns exemplos de itens que integram esse tipo de patrimônio, assim como moedas eletrônicas, fotos e publicações feitas na internet.

Para advogados, regras sobre herança digital são avanço positivo. Especialistas como Mirella Andreola, sócia do Machado Associados, lembram que Facebook e outros serviços já permitem que contas sejam acessadas por parentes após morte do usuário. "Mas a existência de uma norma no Código Civil cria um padrão a ser seguido por todos", diz ela.

Por outro lado, redação da proposta deixa pontos em aberto. O texto não esclarece se haverá ou não incidência de imposto sobre a transmissão da herança digital, como acontece com outros tipos de patrimônio. Além disso, a forma pela qual se dará a divisão desse tipo de bem entre os herdeiros também não fica clara.

Hoje, não há legislação sobre o tema. Diante da situação, os tribunais decidem o que fazer caso a caso, com entendimentos que variam de acordo com a situação. Entre os advogados, há um debate sobre como viabilizar o acesso à herança digital sem que o direito à privacidade após a morte seja violado.

A privacidade de uma mensagem não está relacionada apenas com quem a envia, mas também com quem a recebe
Rochelle Ricci, advogada e sócia do Machado Associados

Dinâmica das redes sociais complexifica o tema. Estudiosos lembram episódios como as mortes do cantor Gabriel Diniz, do apresentador Gugu Liberato e do jogador de basquete Kobe Bryant, que ganharam novos seguidores em seus perfis após falecerem. Situações como essa impactariam a divisão de uma eventual herança digital, já que o patrimônio (no caso, o perfil na rede social) se tornou mais valioso (por conta do aumento no número de seguidores) após a morte do antigo dono.

Mensagens não integram a herança digital, a priori, segundo o artigo 1791 do texto. As mensagens só serão acessadas se o herdeiro "demonstrar que, por seu conteúdo, tem interesse próprio, pessoal ou econômico de conhecê-las".

Código atual vale desde 2002

Lei contém regras sobre casamento, herança, entre outros. Enquanto a Constituição reúne as normas que regem o funcionamento do país, o Código Civil foca em direitos e deveres do cidadão. Ele é organizado em 5 partes: diretrizes gerais, obrigações, direito de família, direito das coisas e direito das sucessões.

Proposta de reforma do Código Civil foi elaborada por comissão de 38 juristas. O colegiado contou com a participação dos ministros do STJ (Superior Tribunal de Justiça) João Otávio de Noronha, Isabel Gallotti, Marco Buzzi e Marco Aurélio Bellizze, além do ministro aposentado Cesar Asfor Rocha.

Comissão para analisar o texto foi criada por Rodrigo Pacheco (PSD-MG) quando ainda era presidente do Senado. A presidência da comissão ficou a cargo do ministro Luís Felipe Salomão, vice-presidente do STJ, e o próprio Pacheco protocolou a proposta no Senado. Procurado, ele não retornou os contatos da reportagem.

Juristas propuseram a alteração de 1.122 dos 2.046 artigos da lei. "Uma mudança que afeta mais da metade dos artigos e todos os capítulos do código é uma reforma e não uma atualização", afirma Caio Fink, sócio do Machado Associados. Para ele, o texto é vago em relação a pontos que exigiam maior precisão e cria novidades de difícil aplicação.

"Guarda compartilhada" de animais de estimação em caso de separação é uma das inovações propostas. O projeto prevê que ex-cônjuges têm "direito de compartilhar" companhia e custos ligados a pets. O texto incorpora um entendimento já aceito pelo Tribunal de Justiça de São Paulo e outras instâncias.

Protocolada em janeiro, proposta deve tramitar em comissão especial. Contudo, o UOL apurou que não há prazo para o colegiado ser criado e instalado. O projeto deve passar por audiências públicas e comissões antes de ir à votação no plenário.

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