A política econômica amalucada e errática do presidente americano Donald Trump tem conseguido acumular façanhas negativas em profusão. A última é ter contribuído para perda final do grau máximo de investimento para a dívida soberana dos Estados Unidos.
É um tipo de fim do mundo que existam dúvidas sobre a capacidade do país que emite a moeda reserva global de honrar suas dívidas. Mas é isso que a perda do último "AAA" dos títulos do Tesouro americano está informando. A tendência, a partir da próxima semana, é de fortes desvalorizações do dólar ante outras moedas.
Política fiscal frouxa
Nesta sexta-feira (16), a agência de classificação de riscos Moody's, uma das três irmãs globais do setor de avaliação de riscos de crédito de países e empresas, ao lado da Standard & Poor's e da Fitch, retirou a classificou "AAA" dos papéis do Tesouro americano. Esses papéis caíram para o segundo mais alto nível de investimento — Aa1, na classificação da agência.
A dívida americana já é não grau máximo de investimento para a S&P desde agosto de 2011. A Fitch rebaixou a nota de crédito dos EUA também em agosto, em 2023. A situação, portanto, não é nova, mas agora ganhou a dramaticidade da queda do último bastião que a sustentava.
Não é de hoje que a política fiscal americana vem sendo conduzida de forma muito frouxa. A inundação de recursos públicos despejados no mercado para enfrentar o grande crash de 2008, deflagrado com a quebra do banco Lehman Brothers, nunca foi saneada. Com a pandemia, a escalada da dívida pública, reflexo dessa política fiscal, foi potencializada.
Descontrole orçamentário
Com Trump e suas promessas de isentar de tributos estratos do alto da pirâmide de renda, compensadas com incertas elevações de tarifas, explodiram as expectativas de descontrole orçamentário.
Estimativas de órgãos de acompanhamento orçamentário são de que a dívida pública americana crescerá em torno de US$ 5,5 trilhões em dez anos. Isso representa um acréscimo de perto de 20% no estoque atual da dívida pública dos Estados Unidos. A perspectiva é de que a dívida pública americana avance para 135% do PIB até 2035.
Venda de títulos do Tesouro
A dívida pública americana alcançou 100% de PIB (Produto Interno Bruto), ou seja, está nas alturas de US$ 30 trilhões. Diante da perspectiva de um período de baixo crescimento, em que a arrecadação tende também a se contrair, os sinais amarelos em relação à capacidade de honrar seus compromissos, sem comprometer a gestão da economia, passaram a vermelhos.
Estresses com a abertura dos déficits fiscais e a aceleração da trajetória ascendente da dívida pública estão por trás das recentes onda de venda de títulos do Tesouro americano — antes considerados os papéis mais seguros do mundo —, com a consequente elevação de seus rendimentos.
Essas recentes corridas para se desfazer de títulos do Tesouro americano indicavam graves preocupações com a política fiscal de Trump. Os títulos do Tesouro estão sendo negociados a taxas inéditas de rendimento de 5% ao ano.
Déficit em alta
O déficit público americano chegou a 6,4% do PIB em 2024, aumento de 8%, na comparação com o ano anterior. No exercício fiscal encerrado em fins de setembro do ano passado, o déficit atingiu US$ 1,8 trilhão.
Apenas como dado de comparação, a dívida pública bruta brasileira encerrou 2024 com o equivalente a pouco menos de 80% do PIB e o déficit público primário fechou em 0,4% do PIB, nas contas dos especialistas do setor privado. O déficit nominal, que inclui os juros das dívida pública, e é o comparável com o americano, está em R$ 950 bilhões (US$ 166 bilhões no câmbio atual), quase 8% do PIB.