Após ação da PM, governo Lula barra cessão de área da favela do Moinho a SP

O governo federal disse hoje que vai paralisar a cessão da área da favela do Moinho para o governo estadual de São Paulo. Em nota pública, o governo diz que emitirá uma notificação extrajudicial para paralisar o processo. O anúncio acontece após ações policiais e protesto de moradores na região.
O que aconteceu
Ações da Polícia Militar deixaram moradores feridos. Uma criança está entre as vítimas. Os confrontos entre a PM e a comunidade do Moinho, a última favela remanescente na região central de São Paulo, acontecem desde ontem.
Governo federal diz que "não compactua com qualquer uso de força policial contra a população". A União diz que havia autorizado uma descaracterização, e não demolição das moradias das famílias que voluntariamente deixaram a região, e que a ação estava condicionada a uma ação "cuidadosa, para evitar o impacto na estrutura das casas vizinhas e minimizar a interferência nas atividades cotidianas da comunidade".
Desde o início das negociações com o governo de São Paulo, em 2024, a SPU deixou explícito que a cessão da área estava vinculada à condução de um processo de desocupação negociado com a comunidade e transparente.
Governo federal, em nota pública
Sob protestos, a CDHU (Companhia de Desenvolvimento Habitacional de Urbano do Estado de São Paulo) começou a realizar demolições no local nesta semana. O órgão estadual passou a derrubar as casas já desocupadas ontem, como parte do projeto de remoção de todos os moradores do Moinho para a construção de um parque e uma estação ferroviária. No terreno vivem cerca de mil famílias.
Moradores relatam que um vizinho foi atingido por disparo de bala de borracha e crianças inalaram gás de pimenta. "Um morador levou um tiro, o bombeiro está entrando para prestar socorro para outro. As crianças chegaram da escola e foram recebidas com gás das bombas e de pimenta", disse ao UOL uma moradora que preferiu não se identificar.
Vídeo mostra bebê desmaiado após inalar gás. Na gravação, a criança aparece sendo levada às pressas pela mãe até um carro do Corpo de Bombeiros, na entrada da comunidade. As duas são acompanhadas aos gritos por outros moradores que pedem socorro aos agentes.
Moradores e fotógrafo apanharam durante a ação de hoje. Imagens veiculadas pela Record TV mostram o momento em que uma mulher que se aproxima de um homem detido e leva golpes de cassetete de um policial. Outro homem, já imobilizado no chão, levou chutes de um PM. Um fotógrafo que registrava a cena também foi golpeado.
Ao menos uma pessoa detida, segundo apurou o UOL. A reportagem ainda tenta confirmar quantas pessoas foram feridas e presas desde ontem.
SSP (Secretaria da Segurança Pública) diz que PM atua para "dar apoio" a funcionários da CDHU que estão na comunidade. A pasta não respondeu o que teria justificado o uso de força não letal contra moradores. Em nota, disse apenas que "a ocorrência está em andamento" e a presença policial na região "tem como objetivo garantir a segurança dos profissionais da CDHU, dos moradores e de todas as pessoas presentes no local".
Primeiro dia de protestos
Ontem, fora do cordão de isolamento formado pela PM, moradores protestavam e exigiam os documentos de autorização das demolições, que não foram apresentados. Segundo apuração da Folha de S.Paulo, mudanças de moradores continuaram sendo feitas, sendo três delas na manhã desta terça.
As pessoas querem sair daqui com dignidade. A minha parede é grudada com a da minha filha. Se demolirem a minha, vai derrubar a dela também. Se precisamos sair, que seja com o mínimo de dignidade, não do jeito que estão fazendo
Moradora que já assinou acordo com a CDHU
Ainda ontem, a PM e a GCM (Guarda Civil Metropolitana) tentaram escoltar um trator para dentro da favela. Foi a ação que deu início aos protestos de moradores. O equipamento acabou ficando fora da comunidade e o trabalho se restringiu à demolição manual, com martelos, pés de cabra e uma marreta, além do uso de madeiras das próprias construções.
No primeiro dia de protestos, manifestantes colocaram fogo nos trilhos de trens da CPTM, mas situação foi normalizada horas depois. O Corpo de Bombeiros foi acionado para combater as chamas e a tropa de choque da Polícia Militar permaneceu na comunidade até à noite, quando ainda não havia registros de presos e feridos.