Por unanimidade, STF derruba manobra que suspende ação contra Ramagem
A Primeira Turma do STF (Supremo Tribunal Federal) formou unanimidade hoje para derrubar a decisão da Câmara dos Deputados que suspende a ação penal contra o deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ) por tentativa de golpe de Estado.
O que aconteceu
A ministra Cármen Lúcia votou na manhã de hoje. Ela se junta aos ministros Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin, Flávio Dino e Luiz Fux, que já haviam votado favoráveis à derrubada da manobra ontem. Eles vão no sentido contrário ao entendimento dos deputados, que aprovaram nesta semana resolução que beneficia Ramagem.
Em seu voto, a ministra diz que a interpretação da Câmara "esvaziaria uma das funções básicas do Estado de Direito". "[A ação] privilegiaria a pessoa [Ramagem] sem resguardo da integridade do cargo público e a honorabilidade republicana da instituição por ele integrada", escreveu Cármen, em voto online.
Zanin concordou com Moraes, relator do caso. Os ministros do STF votaram para prosseguir a ação penal contra o deputado federal e suspender andamento do caso relativo a apenas dois crimes: dano qualificado e deterioração contra o patrimônio da União.
Flávio Dino acompanhou o relator com ressalvas. Para ele, o uso do artigo da Constituição é ainda mais restrito. "O artigo 53, parágrafo 3º, da Constituição Federal, não atribui às Casas Legislativas a competência para decidir, em caráter terminativo, pela sustação da ação penal. Isso porque está em causa processo judicial, sendo certo que, nessa conjuntura, a decisão final constitui ato típico e exclusivo do órgão competente do Poder Judiciário. A deliberação do Poder Legislativo não é imune ao controle jurisdicional", escreveu.
Voto de Fux entrou e saiu do sistema. Durante a tarde, o plenário virtual contabilizou o ministro como acompanhante do relator, mas depois ele saiu da lista. Agora, o voto dele foi oficializado no site.
Na Câmara, o tema foi aprovado com folga: 315 votos favoráveis a suspensão e 143 contrários. O pedido foi apresentado pelo PL, partido de Jair Bolsonaro, com o argumento de que a lei proíbe investigações contra parlamentares após a diplomação. No entendimento da sigla, Ramagem não poderia estar no inquérito que apura as invasões do 8 de Janeiro —a manobra pode beneficiar o ex-presidente. Os deputados argumentam que a Constituição permite o Congresso Nacional interromper inquérito contra um de seus integrantes.
Em seu voto, Moraes destacou que a resolução da Câmara é "inaplicável" a Bolsonaro e outros réus. Além do ex-presidente, o relator da ação penal citou o ex-comandante da Marinha Almir Garnier Santos, o ex-ministro Anderson Torres, o general Augusto Heleno, ex-ajudante de ordens Mauro Cid, o ex-ministro Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira e o general Walter Braga Netto.
Antes do julgamento, Supremo já havia expressado o mesmo entendimento de Moraes. O ministro Cristiano Zanin, presidente da Primeira Turma, avisou à Câmara em abril que a Justiça interpreta de maneira diferente e que somente dois crimes atribuídos a Ramagem deixariam de ser julgados: dano qualificado e deterioração do patrimônio tombado.
Ramagem é réu no Supremo na mesma ação em que Jair Bolsonaro se tornou réu por tentativa de golpe de Estado. Após o resultado na Câmara, o presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos), comunicou o STF sobre a votação. A Corte decide agora se vai suspender ou não a ação contra o deputado.
Ex-diretor da Abin, Ramagem é acusado de fazer parte do "núcleo crucial" da tentativa de golpe. O deputado dirigiu a Agência Brasileira de Inteligência no governo Bolsonaro e teria usado a estrutura da instituição para desacreditar o sistema eleitoral, segundo a denúncia da Procuradoria-Geral da República.
O texto constitucional aprovado pelo Congresso Nacional somente admite a possibilidade de suspensão de ação penal contra parlamentar, quando o Supremo Tribunal Federal receber denúncia por crime que o próprio Tribunal reconhecer como praticado após a diplomação, que, na presente hipótese, são os crimes de dano qualificado pela violência e grave ameaça contra o patrimônio da União, e com considerável prejuízo para a vítima, e deterioração de patrimônio tombado.
Alexandre de Moraes em seu voto
Somente em tiranias um ramo estatal pode concentrar em suas mãos o poder de aprovar leis, elaborar o orçamento e executá-lo diretamente, efetuar julgamentos de índole criminal ou paralisa-los arbitrariamente - tudo isso supostamente sem nenhum tipo de controle jurídico. Maiorias ocasionais podem muito em um sistema democrático, mas certamente não podem dilacerar o coração do regime constitucional.
Flávio Dino em seu voto
Feitos esses esclarecimentos, entendo que a Resolução no. 18/2025, da Câmara dos Deputados, deve ater-se às exigências do texto constitucional, de forma que sua aplicação deve produzir efeitos no que se refere às infrações penais praticadas por parlamentar após sua diplomação.
Cristiano Zanin em seu voto