Uma a cada 5 francesas não se considera heterossexual, aponta estudo
A heterossexualidade é cada vez mais questionada entre as francesas, principalmente as mais jovens, que estão reivindicando outras identidades sexuais. Essa é uma das várias mudanças apontadas por uma pesquisa publicada na terça-feira (29) pelo Instituto Nacional de Estudo Demográficos da França (Ined).
O balanço, intitulado de "Homo, bi e não-binários: quando jovens questionam a heterossexualidade", foi realizado em 2023 com 10 mil pessoas na França com idades entre 18 e 29 anos. O trabalho mostrou que 19% das cidadãs da França rejeita a heteronormatividade: 10% são bissexuais, 5% se considera panssexual e 2% são lésbicas. O restante diz não saber como definir sua preferência sexual.
A atração por pessoas do mesmo sexo é maior entre as francesas mais jovens e mais especificamente dos 18 anos aos 21 anos, em que 22% reivindicam outras identidades sexuais além da heteronormativa. O número deu um salto desde a realização do último estudo do Ined sobre a questão, em 2015, quando apenas 3% das mulheres não se considerava heterossexual na França.
Entre os homens franceses, 4% se consideram bissexuais, 3% homossexuais e 1% não se define. No total, 8% dos cidadãos da França rejeitam a heteronormatividade. Em 2015, eles eram apenas 2%.
O estudo também mostra que em 2023, 37% das mulheres de 20 a 29 anos dizia já ter sentido atração sexual pelos dois sexos ao longo da vida, contra 7% em 2015. Entre os homens, 18% afirmam ter percebido o mesmo sentimento durante a sondagem mais recente do Ined, contra 2% em 2015.
Homossexualidade e Me Too
Entre os fatores que explicam a mudança das identidades sexuais na França está a "banalização da homossexualidade" e o movimento Me Too, que tornaram a heterossexualidade "menos atraente" para uma parte dos jovens da França, explicou o diretor de pesquisa do Ined, Wilfried Rault. Segundo ele, outras mudanças na sociedade, como o debate sobre a desigualdade de gêneros nas tarefas domésticas também contribuiu para essa mudança.
Além disso, a "visibilidade crescente" das minorias sexuais na França, principalmente a partir da legalização do casamento entre pessoas do mesmo sexo, em 2013, "tornou mais viáveis essas formas de sexualidade", afirma Rault.
A estudante parisiense Shana confirma a análise do especialista. Ela conta à emissora Franceinfo que entre seus amigos, a heterossexualidade não é mais a norma. Para ela, não há dúvidas de que a liberação da palavra explica a grande quantidade de jovens mulheres que reivindicam outras identidades sexuais.
"Antes não tínhamos voz, não tínhamos direito de falar, nem mesmo de pensar", avalia. Segundo Shana, as paradas de orgulho LGBTQIA+ e as redes sociais contribuíram para que os jovens se abrissem a outras formas de sexualidade. "No meu caso, pouco importa o sexo. Sendo amor, para mim, não muda nada", ressalta.
Assunto ainda é tabu
Por outro lado, a rejeição da heteronormatividade ainda é tabu, principalmente entre os mais velhos. Shana anunciou sua bissexualidade à família durante um dos lockdowns da Covid-19 na França. "Não foi bem visto pela minha mãe, brigamos muito, teve muito choro", relembra.
Para Pauline, de 24 anos, ainda que outras formas de sexualidade sejam aceitas atualmente, ainda é comum ouvir observações preconceituosas. "Já me disseram que eu sou louca porque sou bissexual. E que por causa da minha atração por homens e mulheres, o amor que eu sinto é pela metade, dividido entre um sexo e outro", conta.
Entre 2016 e 2023, os boletins de ocorrência por ataques anti-LGBTQIA+ mais do que triplicaram na França.