Cem escolas de São Paulo vão virar cívico-militares; o que isso significa?

O governo de Tarcísio de Freitas (Republicanos) definiu cem escolas no estado de São Paulo que adotarão o modelo cívico-militar já a partir do segundo semestre deste ano, e não em 2026, como havia sido anunciado anteriormente.
O que muda na prática?
Policiais militares aposentados serão contratados como professores. Assim como em outros estados, a ideia é que os agentes fiquem com a parte "disciplinar".
Eles trabalharão desarmados. A escolha dos PMs será de responsabilidade da Secretaria da Educação, conforme mostrou reportagem do UOL.
Secretaria da Educação ficará responsável pelo currículo, formação dos professores e adequação dos prédios. "Já a Secretaria da Segurança Pública vai indicar policiais militares da reserva que atuarão como monitores nas unidades de ensino, desenvolvimento de atividades extracurriculares na modalidade cívico-militar, organização e segurança escolar", diz o governo.
Disciplina extracurricular prevê o ensino sobre os três poderes constituintes do Brasil. Resolução publicada em junho pelo governo estadual diz que alunos terão aulas sobre a estrutura e funcionamento do Executivo, Legislativo e Judiciário. Segundo o texto, os policiais aposentados ensinarão conteúdos como "a diferença entre as funções de vereadores, deputados, senadores, prefeitos, governadores e presidentes".
Escolas oferecerão, dentro do seu "Projeto Valores" aulas de ética, cidadania e atividades cívicas conduzidas pelos militares. A resolução estadual cita princípios como dedicação, excelência, honestidade e respeito, além de conteúdos que envolvem os temas de direitos e deveres do cidadão e habilidades para o exercício consciente da cidadania. A carga horária semanal será de duas horas-aula por turma.
Alunos deverão utilizar uniformes militares. O modelo ainda não foi definido pela Secretaria de Educação, segundo o governo de São Paulo, que espera que o seu uso contribua "para a formação de uma identidade própria e para o senso de pertencimento dos alunos".
Militares da reserva irão colaborar também com monitores ou "Agentes de Organização Escolar". Segundo o programa, os militares serão capacitados pela Secretaria de Educação e realizar "apoio no acolhimento e preparo dos alunos na entrada dos turnos, no intervalo de aulas e nos períodos de encerramento dos turnos", além de projetos educativos extraclasses e busca ativa dos alunos.
A expectativa do governo é que os militares atuem "na redução da violência escolar". Eles também devem reduzir abandono e evasão escolar, auxiliar no cumprimento da rotina, no desenvolvimento de atividades extracurriculares cívico-militares e do "Projeto Valores".
Governo tinha interesse na mudança em escolas com nota baixa no Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) e que estão localizadas em regiões vulneráveis. O objetivo seria melhorar a "qualidade do ensino", além de "enfrentamento à violência e a promoção da cultura de paz".
Escolas que ofertam aulas noturnas (como as de EJA, a educação de jovens e adultos) não podem se tornar cívico-militares. O mesmo vale para unidades rurais, indígenas, quilombolas, conveniadas ou geridas em parceria por estado e município.
O modelo foi aprovado em 132 escolas pela comunidade escolar, ou seja, pais, professores e alunos. Elas fazem parte de uma lista de 302 unidades cujos diretores têm interesse em aderir. Como a meta do governo era transformar 100 escolas em cívico-militares em 2025, a Secretaria de Educação utilizou critérios de desempate como o índice de vulnerabilidade e o resultado Idesp (índice de Desenvolvimento da Educação do Estado de São Paulo) para enxugar a lista. Quatro escolas rejeitaram a mudança e 166 não atingiram o apoio mínimo nas consultas públicas.
As críticas ao projeto
Governo Lula havia acabado com programa nacional semelhante, sancionado por Bolsonaro, por "desviar finalidade das Forças Armadas", diz nota técnica do MEC. A pasta enviou um documento às secretarias de Educação em julho do ano passado informando o encerramento do Pecim.
Vulnerabilidade é tema de política social, não militar, segundo o MEC. Para o ministério, "causa espanto" a visão de que os problemas de regiões mais pobres seriam solucionados a partir de um modelo desenhado para colégios de natureza militar.
Escolas militares atendem a interesses, diz Rodrigo Ratier. Mas o colunista do UOL ponderou que estes interesses "não são nem os dos alunos, nem dos professores, nem das comunidades, nem da educação". Há ainda a preocupação de que PMs a frente de aulas se torne um projeto de doutrinação dos jovens, apontou Reinaldo Azevedo.
*Com informações de matérias publicadas em 19/02/2024, 07/03/2024, 24/06/2024 e 28/04/2025.