Chefe do Acnur critica mundo 'cego' por busca de domínio militar
O Alto Comissariado da ONU para os Refugiados (Acnur) denunciou, nesta segunda-feira (28), as guerras que assolam o mundo, "cego" pela busca do domínio militar, e lamentou os cortes de ajuda humanitária que podem levar a uma redução de suas atividades em um terço.
Em um discurso no Conselho de Segurança da ONU, o chefe da Acnur, Filippo Grandi, lamentou o fracasso "crônico" na manutenção da paz mundial.
"Do Sudão à Ucrânia, do Sahel a Mianmar, da República Democrática do Congo ao Haiti, a violência tornou-se a marca distintiva do nosso tempo", declarou Grandi.
Cada um dos 120 conflitos enumerados no mundo pelo Comitê Internacional da Cruz Vermelha está "alimentado pela mesma perversa, mas poderosa fantasia: que a paz é para os fracos, que a única maneira de pôr fim à guerra não é através da negociação, mas ferindo tanto ao inimigo que só restam duas opções: render-se ou ser pulverizado".
Neste mundo "cego pela ideia de que só vale a vitória militar total, não deve surpreender que as normas do direito internacional humanitário, outrora respeitadas ou pelo menos proclamadas", sejam "descartadas, desprezadas com a mesma facilidade que as milhares de vidas destruídas na busca da dominação", acrescentou, citando como exemplos o Sudão e a Ucrânia.
Ao mesmo tempo, os fundos para a ajuda humanitária são cortados, alertou o alto comissário.
"Fala-se em dar prioridade aos interesses nacionais, aos gastos militares, questões com certeza legítimas (...) mas que não são incompatíveis com a ajuda, pelo contrário", declarou, sem mencionar os Estados Unidos, que reduziram drasticamente sua ajuda externa.
"A ajuda torna possível a estabilidade. Congelar ou cortar os orçamentos de ajuda já está tendo consequências mortais para milhões de pessoas", advertiu.
O chefe da Acnur afirmou que esta agência da ONU pode ter que reduzir suas atividades em um terço.
"Se essa tendência continuar, não poderemos fazer mais com menos", disse. "Haverá menos escritórios, menos programas, menos operações."
"Percebo que não estou ensinando nada a vocês, membros do Conselho - o que em si mesmo é uma acusação -, mas, infelizmente, esta é a realidade do nosso mundo", criticou.
Manter a paz "é sua responsabilidade principal, uma responsabilidade que, perdoem-me por repetir, este órgão tem falhado de forma crônica", insistiu Grandi.
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