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Especialistas criticam entrada do Brasil Opep+: uma contradição ambiental sem ganhos econômicos

19/02/2025 07h38

O Brasil se prepara para sediar a COP30 no final deste ano e vai integrar a Opep+, grupo aliado à Organização dos Países Exportadores de Petróleo. Analistas ouvidos pela RFI mostram que o efeito prático da adesão é pequeno, mas se alinha à crescente pressão pela extração de petróleo. A decisão é extremamente criticada pelos ambientalistas.

O Brasil se prepara para sediar a COP30 no final deste ano e vai integrar a Opep+, grupo aliado à Organização dos Países Exportadores de Petróleo. Analistas ouvidos pela RFI mostram que o efeito prático da adesão é pequeno, mas se alinha à crescente pressão pela extração de petróleo. A decisão é extremamente criticada pelos ambientalistas.

Raquel Miura, correspondente da RFI em Brasília

O Brasil fará parte da chamada Opep+, grupo de países, sem direito a voto, associados da Organização dos Países Exportadores de Petróleo. A adesão não significa ingresso como membro efetivo da entidade, mas como nação que pode atuar de forma conjunta com os demais integrantes em discussões ligadas ao comércio internacional do produto ou na solução de controvérsias na área.

"O Brasil já é o nono país produtor de petróleo no mundo e até 2030, a gente vai chegar a ser o quinto maior produtor mundial. O petróleo já é a principal pauta de exportação brasileira. A Petrobras está produzindo cada vez mais o pré-sal. E se vier a margem equatorial, como todo mundo espera e deve acontecer, a gente vai continuar tendo papel importante na cena do petróleo internacional", diz o especialista em petróleo Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE).

Segundo Pires, fora da Opep, países como a Guiana e o Brasil são hoje os principais protagonistas desse mercado. Mas, embora avalie que em termos de produção e relevância no comércio mundial o Brasil conta com requisitos necessários para integrar qualquer organização que reúna os principais produtores dessa commodity, o analista destaca que ingressar nesse braço ampliado a Opep não traz vantagens ao país.

"No Brasil hoje quem produz petróleo são empresas privadas e a Petrobras. A Petrobras não é uma estatal, mas uma empresa de capital misto. Então como é que o governo vai mandar a Petrobras reduzir ou aumentar a produção?", questiona.

Além disso, o especialista lembra que o Brasil é um regime democrático, diferentemente da maioria dos membros da Opep, nos quais a produção vem de empresas 100% estatais. "Não vejo nenhuma lógica do Brasil entrar na Opep+. E cartel não é uma coisa boa, mas ruim do ponto de vista da economia, do ponto de vista da concorrência, do ponto de vista do consumidor", ressalta o representante da CBIE.

Rumos da produção de petróleo

A confirmação de que o Brasil aceitou o convite feito pela Opep vem num momento de grande discussão interna sobre os rumos da produção de petróleo e mais, até que ponto defender o aumento dessa matriz energética é de fato jogar contra os desafios ambientais de tornar o planeta um local menos poluído. No atual governo, que tem como bandeira a defesa do meio ambiente, há expoentes de peso, entre eles, o presidente Lula, que defende estudos de viabilidade para exploração de petróleo na margem norte equatorial.

Para Gustavo Baptista, do Instituto de Geociências da Universidade de Brasília, tem-se um discurso verde em meio a velhas práticas de pensar o desenvolvimento do país. "Eu vejo que há sim uma contradição bastante evidente. Não faz sentido um país que tem uma matriz energética limpa, cujo grande desafio não é a transição energética, mas sim problemas de degradação florestal, desmatamento, garimpo, se aliar aos países da Opep com o discurso de que isso vai ajudar a convencê-los de uma transição energética para biocombustíveis."

O professor da UnB diz que esse jogo duplo do governo pode reduzir o papel do Brasil na questão ambiental. "Poderíamos ter um protagonismo ambiental por termos a maior biodiversidade do planeta, por termos uma matriz limpa, mas o que a gente vê é uma busca por algo tradicional, baseado em combustíveis fósseis e isso ainda num contexto de mudanças climáticas batendo à porta", aponta Baptista.

A situação é classificada pelo professor da UnB como "um tiro no pé". "Não há lógica nesse tipo de aproximação [com a Opep], não faz sentido um país que vai sediar a COP30, no momento em que a gente vai rever o Acordo de Paris depois de 10 anos, defender exploração de petróleo na foz do Rio Amazonas. É uma contradição muito grande", avalia o especialista em geociências.

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