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Um dia após ser condenado, bolsonarista vai para prisão domiciliar no PR

O guarda municipal Marcelo Arruda (esq) foi morto a tiros pelo policial penal Jorge Guaranho (dir), que invadiu a festa temática do PT onde a vítima fazia a festa de 50 anos em Foz do Iguaçu (PR) - Arte/UOL
O guarda municipal Marcelo Arruda (esq) foi morto a tiros pelo policial penal Jorge Guaranho (dir), que invadiu a festa temática do PT onde a vítima fazia a festa de 50 anos em Foz do Iguaçu (PR) Imagem: Arte/UOL
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Do UOL, em São Paulo

14/02/2025 17h53Atualizada em 14/02/2025 18h20

Um dia após ser condenado a 20 anos de prisão em regime fechado pela morte do tesoureiro do PT Marcelo Arruda, o ex-policial penal Jorge Guaranho recebeu autorização judicial para cumprir a pena em prisão domiciliar. A decisão em caráter liminar foi publicada nesta sexta-feira (14) pelo Tribunal de Justiça do Paraná.

O que aconteceu

Decisão diz que Guaranho continua debilitado e com dificuldade de locomoção. O desembargador Gamaliel Seme Scaff escreveu que, "em razão da enfermidade e das lesões", a prisão domiciliar do ex-policial penal não colocará em risco a sociedade ou o cumprimento da lei penal.

Advogados do bolsonarista defendem que ele precisa de tratamento médico. No pedido à Justiça, os defensores detalharam que Guaranho levou nove tiros no dia da morte de Marcelo e foi espancado por cinco minutos, o que resultou em fratura completa da mandíbula, perda de dentes e massa óssea. "Cabe destacar que os diversos projéteis estão alojados no corpo do paciente, inclusive na caixa craniana e na porção esquerda da massa encefálica", segundo pedido protocolado no TJPR.

Guaranho já cumpria pena em prisão domiciliar desde setembro de 2024. Mas, na quinta-feira (13), após a condenação, a juíza Mychelle Pacheco Cintra Stadler determinou que o réu deveria voltar para a cadeia. Desde ontem, Guaranho estava preso no Complexo Médico Penal, em Piraquara (PR).

Com a decisão liminar, ele deve ser solto ainda nesta sexta. A Justiça do Paraná determinou que Guaranho seja monitorado por tornozeleira eletrônica e que se desloque apenas para tratamento médico, devendo informar ao juízo. Ele fica proibido de sair do seu domicílio em Curitiba para outro fim e não pode manter contato com qualquer pessoa ou testemunha relacionada com a ação penal.

Decisão liminar é válida até o julgamento do mérito da ação. De acordo com o advogado Rogério Oscar Botelho, que representa a família de Marcelo Arruda, o julgamento do mérito deve ser realizado em até 30 dias.

Júri acabou nesta quinta-feira

A juíza Mychelle Pacheco Cintra Stadler aplicou a pena de 20 anos de prisão, no total, para o réu. Guaranho saiu preso do tribunal, mas poderá recorrer da sentença. O julgamento ocorreu na Vara Privativa do Tribunal do Júri do Foro Central de Curitiba dois anos e meio após a morte de Arruda.

Na decisão, a juíza citou que Guaranho utilizou uma arma da União para cometer crime. Ela ressaltou a intolerância política que o ex-policial penal demonstrou com as ações.

A magistrada leu a sentença na tarde desta quinta-feira (13). A maioria dos sete jurados considerou que o ex-policial penal é culpado pela morte de Marcelo. Foram escolhidos, por sorteio eletrônico, sete jurados, sendo quatro mulheres e três homens. As decisões em um júri popular são tomadas por maioria de votos, ou seja, não é necessária a formação de unanimidade.

O UOL procurou a defesa de Jorge Guaranho para esclarecer se os advogados irão recorrer da sentença. O espaço segue aberto para manifestação.

Júri teve depoimentos do réu, peritos e nove testemunhas

Julgamento durou três dias. Nos dois primeiros dias foram ouvidas nove testemunhas, o réu e peritos. Hoje, a defesa e a acusação realizaram os debates, última fase do júri. Após o encerramento, os jurados foram para a sala secreta, onde cada um votou, de forma anônima e individual.

O ex-policial penal Jorge Guaranho chegou hoje ao tribunal de muletas. Ele conversou rapidamente com jornalistas e voltou a citar que a morte de Arruda foi uma "fatalidade".

"Que os jurados tenham entendido que não cheguei atirando como foi dito por aí, isso ficou muito claro ali, que ele apontou a arma para mim antes, andou para cima de mim, tacou pedra em mim e no meu filho. Então era eu ou ele ali naquele momento. Eu jamais atirei no Marcelo por causa de política, foi uma fatalidade", afirmou.

Ontem, o réu foi ouvido no júri e respondeu somente perguntas de seus advogados. Ele falou por cerca de duas horas, disse que se arrependeu de cometer o crime e pediu perdão. O ex-policial penal relatou que foi até o local da festa para brigar com a vítima, mesmo sem saber quem era, e tirar satisfação porque, na primeira ida ao local, Marcelo tinha acertado o olho do filho dele após jogar terra no veículo do acusado. O homem ainda reforçou não se lembrar de detalhes da própria ação.

Guaranho negou que tenha cometido um crime político. Ele disse que o partido não importaria se Marcelo não tivesse partido para cima dele com a arma de fogo em punho, fazendo com que ele precisasse atirar. "Eu mesmo namorei uma menina que era do Partido dos Trabalhadores", acrescentou, reforçando que o crime foi uma fatalidade e não houve motivação política.

Acusado falou que pensa o tempo todo que os filhos de Marcelo não têm mais pai, mas também declarou que a família dele sofreu com a situação. "Arrependimento vai ser para sempre. Marcelo morreu, eu quase morri".

Júri começou na terça-feira com depoimento de viúva

 Pamela Silva, viúva de Marcelo Arruda, assassinado em sua festa de aniversáriono dia 9 de julho de 2022  - CHRISTIAN RIZZI/UOL - CHRISTIAN RIZZI/UOL
Pamela Silva, viúva de Marcelo Arruda, assassinado em sua festa de aniversáriono dia 9 de julho de 2022
Imagem: CHRISTIAN RIZZI/UOL

Júri popular teve início por volta das 11h da terça-feira (11). A primeira testemunha ouvida foi Pamela Silva, viúva do tesoureiro do PT Marcelo Arruda. O júri é realizado na Vara Privativa do Tribunal do Júri do Foro Central de Curitiba.

Pamela Silva declarou que ela e o marido não conheciam Guaranho. Segundo a mulher, assim que o ex-policial penal chegou ao local da festa, ela achou que fosse algum convidado. "Quando eu vi a arma eu imediatamente me aproximei, pensei 'meu Deus, o que tá acontecendo aqui?'", afirmou durante o julgamento.

A viúva também detalhou que Marcelo tinha boa relação com pessoas que não gostavam do PT. "Ele tinha 28 anos como guarda municipal e, dentro da corporação, era minoria. As pessoas até se referiam a ele como o PT, o petista, de brincadeira", disse em respostas à promotora de Justiça Ticiane Louise Santana Pereira.

O julgamento teve início após três adiamentos. Inicialmente, o júri havia sido designado para 7 de dezembro de 2023. Após pedidos da defesa, no entanto, foi adiado para o dia 4 de abril de 2024. Na ocasião, a bancada da defesa abandonou o plenário, impossibilitando a realização do julgamento. Foi designada uma nova data para o júri, agendada para maio de 2024. Mas a defesa ingressou com um pedido de desaforamento em 7 de abril e pediu a mudança de onde seria realizado o julgamento.

Justiça aceitou mudança de endereço do júri. A Justiça do Paraná atendeu ao pedido da defesa do Guaranho para realizar o júri em Curitiba, já que, segundo os advogados, caso fosse sediado em Foz do Iguaçu, onde ocorreu o crime, possibilitaria o risco de parcialidade dos jurados. A juíza que preside o júri popular de Jorge Guaranho é Mychelle Pacheco Cintra Stadler.

Ministério Público do Paraná pediu condenação por homicídio duplamente qualificado por motivo fútil e perigo comum. Ao denunciar o ex-policial penal Jorge Guaranho, a Promotoria viu como motivação fútil a "preferência político-partidárias antagônicas dos envolvidos" e disse que o réu colocou a vida de outras pessoas em risco ao atirar.

Relembre o caso

Vítima foi morta quando comemorava 50 anos. No dia 9 de julho de 2022, Arruda celebrava o aniversário com amigos em Foz do Iguaçu em uma festa temática do PT —o guarda municipal era eleitor de Lula.

Guaranho invadiu a festa aos gritos de "Bolsonaro" e "mito", segundo relataram testemunhas. O homem ameaçou os presentes e saiu. Depois, ao reencontrar Arruda, atirou no aniversariante, que também estava armado e revidou — mas não sobreviveu.

Arruda era casado e tinha quatro filhos. Ele era diretor do Sindicato dos Servidores Municipais de Foz, tesoureiro do PT municipal e havia sido candidato a vice-prefeito. Era casado e tinha quatro filhos —entre eles uma menina de seis anos e um bebê de apenas um mês.

Defesa descarta motivação política e vai pedir absolvição. Os representantes legais de Guaranho alegam que o policial penal agiu em legítima defesa, já que Arruda estava com a arma em punho quando o atirador invadiu a festa onde ocorreu o crime.

O ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, demitiu o policial penal. Guaranho foi exonerado por três infrações disciplinares. Em nota, o Ministério da Justiça e Segurança Pública esclareceu que demissão se deu pelo uso de recurso material da repartição em atividade particular, pela prática de ato de improbidade administrativa e pela e incontinência pública. Guaranho usou sua arma profissional para cometer o crime.

Um acordo garantiu o pagamento de indenização à família de Marcelo. Em fevereiro deste ano, a AGU (Advocacia-Geral da União) informou que vai garantir o pagamento de indenização no valor de R$ 1,7 milhão à companheira e aos quatro filhos de Marcelo Arruda.

A indenização será paga pela União. O acordo considerou que, entre outros fatores, o autor do crime se valeu da condição de agente público para acessar o local da festa e efetuar o disparo utilizando uma arma de propriedade da União.

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