Veteranos no Congresso dizem que emendas pioraram relação com governo

Parlamentares que já foram líderes durante outros governos veem emendas como mudança de chave na relação entre Executivo e Legislativo.
O que aconteceu
Ex-líderes veem novo jogo de forças. O crescimento das emendas parlamentares, o aumento do poder das bancadas no Congresso e a polarização partidária mudaram a relação entre o Executivo e o Legislativo, avaliam parlamentares ouvidos pelo UOL.
"Piorou", diz Hauly. De acordo com o deputado Luiz Carlos Hauly (Pode-PR), 74, ex-líder durante o governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB, 1995-2001), a relação entre Executivo e Congresso "piorou muito".
Governistas apontam Congresso muito mais forte. Para aliados do governo Lula (PT), o problema é o excesso de força do Congresso, devido ao aumento exponencial do volume de emendas que o governo é obrigado a pagar, independentemente de qualquer negociação.
Opositores e independentes criticam cenário anterior. Planalto tentava obter o apoio do Legislativo com base na negociação sobre a liberação de emendas, o chamado "presidencialismo de coalizão".
Havia margem de negociação de apoio em troca da liberação de emendas. No final do governo FHC e no início do primeiro mandato de Lula (2003-2006), o valor das emendas girava em torno de R$ 2 milhões para cada congressista, e o pagamento não era obrigatório.
Hoje montante dificulta barganha. Cada parlamentar possui atualmente ao menos R$ 40 milhões em emendas, cujo pagamento pelo governo é obrigatório. Isso dificulta que o Executivo possa batalhar por apoio.
Parlamentares trataram de pressão de forma corriqueira no cafezinho. Um senador e um deputado, da base aliada vindos do Nordeste e do Centro-Oeste, conversavam no cafezinho do Senado no sábado (1º), depois do discurso em que o recém-eleito Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) exigia respeito às decisões do Congresso. Eles pediram salada de frutas e café ao garçom. Enquanto o pedido não chegava, articulavam os planos para as eleições de 2026. Mas, então, o deputado mudou de assunto. Ele pediu que o senador conversasse com Alcolumbre sobre as emendas deles. E continuou: "Nós não vamos votar nada se [o governo Lula] não pagar nossas emendas". O senador lembrou o discurso de Alcolumbre, que foi elogiado pelo deputado. O senador então destacou: "Ele disse: 'Ou libera as emendas ou o pau quebra'".
Amizade com ministros resolvia, diz ex-deputado. Enivaldo Ribeiro (PP-PB), 89, foi deputado entre 1995 e 2006 pelo PP. Ele conta que, nos anos 1990, o que contava para conseguir liberação de emendas era sua amizade com ministros. Ribeiro calcula que àquela época as emendas não chegavam a R$ 40 mil por ano por parlamentar.
Emenda era "prêmio". O senador Marcelo Castro (MDB-PI), 74, diz que, nos anos 1990, o governo liberava a maior parte das emendas apenas ao final do ano, mediante "bom comportamento" dos parlamentares. "Havia uma relação de submissão do Legislativo ao Executivo."
Bolsonaro turbinou "emendas de relator". Durante seu governo, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) aumentou as "emendas de relator", criando a primeira versão do orçamento secreto, que ampliou o poder do Congresso, pois cabia aos presidentes das Casas direcionar as emendas entre aliados. Para o senador Renan Calheiros (MDB-AL), líder do governo na era Fernando Collor (1990-1992), "isso mudou a relação entre os Poderes".
O problema continuou no terceiro governo Lula. Há menos poder e margem de manobra sobre as emendas — cuja execução está, grande parte das vezes, atrelada aos ministérios. Ou seja, o Executivo precisa negociar com mais gente antes de conseguir ver um projeto aprovado.
A maior dificuldade da governabilidade é a polarização, porque o eleitor está patrulhando o seu deputado ideologicamente. Não está olhando para o que é bom ou não é bom para o Brasil. Está olhando do lado 'esquerda e direita'.
Ricardo Barros, deputado federal (PP-PR), líder de governo nas gestões de FHC, Lula, Dilma, Michel Temer (MDB) e Bolsonaro