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Crianças na Era do Gelo já usavam 'piercing' na bochecha, revela estudo

Desgaste no esmalte do dente sugere o uso de adornos  - John C Willman/Universidade de Coimbra
Desgaste no esmalte do dente sugere o uso de adornos Imagem: John C Willman/Universidade de Coimbra
do UOL

Giovanna Arruda

Colaboração para o UOL

05/02/2025 05h30

Uma nova pesquisa sugere que pessoas, incluindo crianças, usavam uma espécie de "piercing" nas bochechas com a função de adereço na Era do Gelo, entre 25 mil e 29 mil anos atrás.

Os adornos eram colocados em diferentes pontos ao redor da boca e faziam parte um ritual de pertencimento dos povos da época. Os objetos, no entanto, provocavam desgaste nos dentes e mudanças nas estruturas dentárias.

O que a pesquisa revela

Um pesquisador analisou dados de dezenas de esqueletos da Europa Central para elaborar o estudo. John Charles Willman, do Centro de Investigação em Antropologia e Saúde da Universidade de Coimbra, em Portugal, publicou o resultado na revista Journal of Paleolithic Archaeology no último dia 23.

A pesquisa sugere que os dentes estavam desgastados, manchados e amontoados devido aos "piercings" inseridos nas bochechas. O especialista focou sua análise no desgaste verificado nos molares, pré-molares e caninos dos esqueletos. Devido a movimentos repetitivos, como mastigar e ranger os dentes, é comum que o esmalte dental apresente desgaste ao longo do tempo. Nestes casos, o esmalte fica mais plano, podendo apresentar uma ligeira inclinação na superfície de mastigação dos dentes, segundo o especialista.

Desgaste no esmalte dos dentes sugere uso de 'piercings' - Journal of Paleolithic Archaeology - Journal of Paleolithic Archaeology
Desgaste no esmalte dos dentes sugere uso de 'piercings'
Imagem: Journal of Paleolithic Archaeology

Nas mandíbulas analisadas por Willman, porém, este desgaste estava na lateral dos dentes, ou seja, na superfície que fica em contato com as bochechas. "Os resultados mostram que os dentes superiores são afetados com mais frequência do que os dentes inferiores", diz o estudo. "Os dentes mais visivelmente modificados pelo desgaste bucal são os primeiros molares superiores."

Segundo o pesquisador, crianças também recebiam o "piercing", que podia aumentar de tamanho ao longo da vida. Em entrevista ao portal Live Science, Willman explicou que os esqueletos adultos apresentavam um maior grau de desgaste do esmalte na região das bochechas em relação às crianças, o que pode estar relacionado à inserção de "piercings" progressivamente maiores.

A obtenção do primeiro labret [tipo de piercing] parece ter ocorrido na infância, já que o desgaste está documentado em alguns dentes de leite.
John Charles Willman, ao portal Live Science

A provável função dos adereços é motivo de pesquisa de especialistas há décadas. Para Willman, os "piercings" provavelmente sinalizavam a participação daquele indivíduo em um determinado grupo. Segundo o pesquisador, a variação no desgaste dentário identificada em seu estudo pode estar relacionada com o estilo de vida da pessoa e até mesmo com suas escolhas individuais —diferentes eventos as "premiariam" com novos "piercings" durante a vida, como a fase da puberdade ou um casamento.

Os adereços podiam ser colocados abaixo do lábio inferior ou em diferentes pontos da bochecha. Segundo o Live Science, até o momento não foram encontrados objetos identificados como piercings em sepulturas da Era do Gelo, "possivelmente porque eram feitos de materiais perecíveis, como madeira ou couro, que não sobreviveram".

Ilustrações indicam possíveis pontos nos quais os piercings eram inseridos nos indivíduos analisados no estudo - Divulgação/Journal of Paleolithic Archaeology - Divulgação/Journal of Paleolithic Archaeology
Ilustrações indicam possíveis pontos nos quais os piercings eram inseridos nos indivíduos analisados no estudo
Imagem: Divulgação/Journal of Paleolithic Archaeology

O desgaste dental visto por Willman é tido pelo especialista como um padrão da época. As alterações dentárias provocadas pelos "piercings" foram identificadas "em todos os adultos, na maioria dos adolescentes e em algumas crianças em todos os locais estudados", explicou à Live Science. "A uniformidade nestes padrões de desgaste sugere comportamento(s) partilhado(s) e incorporado(s) entre os povos [analisados no estudo] ao longo da sua vida."

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