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OPINIÃO

Ata do Copom descreve quadro que sinaliza altas nos juros além de março

do UOL

Colunista do UOL

04/02/2025 16h32

A ata da reunião de janeiro do Copom (Comitê de Política Monetária), publicada nesta terça-feira (4) mostra que o colegiado acertou ao prever um quadro de incertezas e dificuldades adicionais para a contenção da inflação, com a implementação da política econômica do novo presidente americano, Donald Trump.

Essa perspectiva mais pessimista — e até aqui mais realista — se soma ao cuidado e às ressalvas com que a ata cerca a hipótese de que a desaceleração da economia, a partir do meio do ano, seja mais forte do que o esperado.

A combinação dessas duas mensagens contidas na ata dá margem à interpretação de que as taxas básicas de juros (taxa Selic) não vão parar de subir tão cedo.

Essa é uma boa razão, além das reviravoltas de Trump com parceiros comerciais americanos, para mais uma queda firme na cotação do dólar, na sessão desta terça-feira.

O fator Trump

Com relação aos impactos provavelmente negativos da política econômica de Trump, o parágrafo 13 da ata é bastante claro:

"(...) há dúvidas sobre a condução da política econômica em diversas dimensões, tais como possíveis estímulos fiscais, restrições na oferta de trabalho, introdução de tarifas à importação e alterações importantes em preços relativos decorrentes de reorientações da matriz energética, o que pode impactar negativamente as condições financeiras e os fluxos de capital para economias emergentes." Parágrafo 13 da ata do Copom de janeiro

A alta da taxa básica de juros em um ponto percentual, juntamente com a avaliação de que pelo menos mais uma alta da mesma magnitude seria necessária, foi definida na quarta-feira (29), antes de Trump dar início ao vaivém de decisões que estão caracterizando o início de seu novo governo.

Como já é possível constatar agora, os diretores do Banco Central fizeram a leitura correta dos impactos iniciais do modo como Trump está conduzindo o início de seu segundo mandato presidencial.

Dúvidas sobre a desaceleração

Também a aposta de que o ritmo de altas da taxa básica de juros (taxa Selic) possa ser reduzido depois do Copom de março, quando os juros devem avançar para 14,25% nominais ao ano, que havia ficado de certo modo subentendido no comunicado divulgado no encerramento do Copom de janeiro, perdeu força na ata.

"Os dados mais recentes oferecem sinais incipientes de que alguma moderação do crescimento, em linha com o cenário-base, possa estar se iniciando, em particular no setor de bens e em setores mais sensíveis a crédito. No entanto, alguns elementos atenuadores sugerem parcimônia nas conclusões. Os dados ainda são de alta frequência, e as dificuldades com sazonalidade e revisões frequentes em tais séries demandam maior cautela na análise." Parágrafo 7 da ata do Copom de janeiro

Outro ponto que chama a atenção na ata do Copom de janeiro é a ênfase à necessidade de sintonia entre as políticas monetária e fiscal. Nunca foram tão explícitas e detalhadas as dificuldades encontradas pelo Copom para a contenção da inflação diante da combinação de uma política de juros restritiva com uma política fiscal expansionista, esta em conjunto com estímulos de crédito.

"O Comitê reforçou a visão de que o esmorecimento no esforço de reformas estruturais e disciplina fiscal, o aumento de crédito direcionado e as incertezas sobre a estabilização da dívida pública têm o potencial de elevar a taxa de juros neutra da economia, com impactos deletérios sobre a potência da política monetária e, consequentemente, sobre o custo de desinflação em termos de atividade." Parágrafo 9 da ata do Copom de janeiro

É evidente o aumento da ineficiência, tanto da política monetária quanto da política fiscal, se cada uma puxa para um lado contrário ao que a outra persegue. Cabos de guerra entre política de juros e déficits públicos torna, de um lado, o controle da inflação mais difícil e custoso, e reduz os efeitos positivos dos programas impulsionados por gastos do governo, principalmente na área social.

Pressão inflacionária

A ata também descreve uma inapelável sequência de resultados efetivos e de projeções levando a acreditar que as expectativas em relação à inflação se elevaram de forma "relevante".

"Mecanismos inerciais", mencionados no parágrafo 11, levam o Copom a acreditar que a pressão dos preços dos alimentos tende a se propagar no médio prazo. Além disso, as perspectivas de uma cotação mais alta do dólar sustentam expectativas de altas em preços de bens, ao mesmo tempo em que os preços no setor de serviço são impulsionados pela demanda aquecida.

"A inflação de serviços, que tem maior inércia, segue acima do nível compatível com o cumprimento da meta em contexto de atividade dinâmica e acelerou nas observações mais recentes." Parágrafo 11 da ata do Copom de janeiro

Estouro da meta no meio do ano

A expectativa do Copom, bem destacada na ata, é de que o teto do intervalo de tolerância do sistema de metas seja superado em meados do ano, quando seriam acumulados seis meses consecutivos de inflação acima do teto de 4,5%.

Assim, pela nova sistemática da meta contínua, adotada pelo CMN (Conselho Monetário Nacional) em meados de 2024, estaria configurado o descumprimento da meta, o que exigirá a publicação de mais uma carta aberta do presidente do BC ao ministro da Fazenda, explicando as razões do estouro e descrevendo as medidas para evitá-lo no futuro.

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