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Lula reduz presença feminina nas cortes superiores e decepciona magistradas

Os ministros do STF e o procurador-geral da República, Paulo Gonet, no canto superior direito. Desde 2023, Cármen Lúcia é a única mulher na mais alta instância do Judiciário - Fellipe Sampaio - 22.fev.2024-SCO/STF
Os ministros do STF e o procurador-geral da República, Paulo Gonet, no canto superior direito. Desde 2023, Cármen Lúcia é a única mulher na mais alta instância do Judiciário Imagem: Fellipe Sampaio - 22.fev.2024-SCO/STF
do UOL

Do UOL, em São Paulo

18/01/2025 05h30

Eleito com a promessa de combater a desigualdade de gênero, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem sido criticado por manter e até aprofundar a disparidade entre homens e mulheres nas cortes superiores brasileiras.

O que aconteceu

Única ministra do STM (Superior Tribunal Militar) diz que indicações são decepcionantes. "É extremamente frustrante, triste e decepcionante, porque o presidente Lula não tem entregado a nós, mulheres, aquilo que ele prometeu", afirmou Maria Elizabeth Rocha em entrevista ao jornal O Globo nesta semana. "Isso está sendo fruto de muita decepção entre a magistratura feminina."

Mulheres ocupam apenas 17% das 93 cadeiras das cortes superiores brasileiras. Desde a posse de Lula, em janeiro de 2023, o número de mulheres nos postos mais altos do Judiciário diminuiu: eram 18 e, agora, são 16.

Desde o fim de 2023, Lula só indicou uma mulher para cargo efetivo nesses tribunais: Daniela Teixeira, ministra do STJ (Superior Tribunal de Justiça). Ele também nomeou as duas primeiras mulheres negras do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), Edilene Lôbo e Vera Lúcia, mas elas ocupam o posto de ministras substitutas.

As ministras Edilene Lôbo e Vera Lúcia participaram conjuntamente da sessão plenária do TSE pela primeira vez em maio de 2024 - Alejandro Zambrana/TSE - Alejandro Zambrana/TSE
As ministras Edilene Lôbo e Vera Lúcia participaram conjuntamente da sessão plenária do TSE pela primeira vez em maio de 2024
Imagem: Alejandro Zambrana/TSE

Redução é resultado direto das indicações ao STF e STJ. Em novembro de 2023, Lula indicou Flávio Dino para substituir Rosa Weber no Supremo Tribunal Federal, o que tornou a ministra Cármen Lúcia a única mulher na Corte.

No STJ, duas ministras se aposentaram, mas cadeiras seguem vazias. Laurita Vaz deixou o cargo em outubro de 2023 e Assusete Magalhães, em janeiro de 2024. Lula recebeu as listas com os candidatos aos cargos em outubro do ano passado, mas ainda não há decisão. Um dos mais cotados para assumir uma das vagas é homem: o desembargador Carlos Brandão, do TRF-1 (Tribunal Regional Federal da 1ª Região).

Sub-representação é prejudicial ao Brasil, dizem especialistas. Segundo eles, a presença de ministras em instâncias superiores permite que as mulheres contribuam com decisões sobre os assuntos mais importantes da sociedade. A professora Sheila Neder Cerezetti, coordenadora do grupo de estudos de inclusão da Faculdade de Direito da USP, explica que a Justiça pode se beneficiar de visões diversas para formar os entendimentos. Além disso, as decisões das cortes superiores também são frequentemente usadas para embasar as de instâncias inferiores. Logo, o juízo dos ministros repercute em todo o país.

Desigualdade de gênero nas cortes superiores brasileiras - Arte/UOL - Arte/UOL
Imagem: Arte/UOL

Indicações de Lula são políticas, mas há mulheres capacitadas. "Ele não nomeia só ao seu bel-prazer; tem uma série de conjunturas, acordos políticos, a questão da confiança. Mas o fato é que ele, invariavelmente, vem nomeando muito mais homens do que mulheres, sendo que temos mulheres tão capacitadas ou até mais capacitadas que os indicados", disse Maíra Recchia, presidente da Comissão Mulheres Advogadas da OAB-SP (Ordem dos Advogados do Brasil de São Paulo)

Mulheres são maioria na advocacia, mas não são promovidas a postos mais altos. No primeiro estudo demográfico da advocacia brasileira, a OAB mostrou que a profissão é exercida 50% por mulheres, 49% de homens e 1% por pessoas com outras identidades de gênero. "A gente tem um número expressivo de mulheres que entram na magistratura, mas não ascendem para os tribunais, não viram sócias majoritárias nos maiores escritórios", citou Recchia.

As mulheres não conseguem fazer parte dos clubinhos, das rodinhas. A gente não é nem chamada. Os homens convidam homens e indicam homens também.
Maíra Recchia, presidente da Comissão Mulheres Advogadas da OAB-SP

Para especialistas, solução para desigualdade passa por ações afirmativas. Nina Ranieri, professora da Faculdade de Direito da USP, cita a resolução do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), que entrou em vigor em 2023, criando uma política de paridade de gênero em cargos estratégicos de tribunais. "Inicialmente, a criação dessa norma criou polêmica. Mas é uma das formas de diminuir a disparidade. Isso e, sem dúvida, a pressão popular", afirmou.

O UOL entrou em contato com a secretaria de comunicação da Presidência da República questionando a disparidade na composição das cortes superiores. Caso haja resposta, este texto será atualizado.

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