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'Sei que estou na lista de alvos', diz assentado do MST da região do ataque

do UOL

Do UOL, em São Paulo

12/01/2025 13h05Atualizada em 12/01/2025 13h05

Morador de um dos seis assentamentos do Vale do Paraíba, interior de São Paulo, região do atentado contra o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) na sexta-feira (10), afirma que famílias falam sobre a possibilidade de deixar o local caso não haja uma investigação adequada.

O que aconteceu

Assentado há dez anos em terra do MST em São José dos Campos diz que já sofreu diversas ameaças. "Só não saí da minha casa porque tomo cuidado, nunca ando sozinho. Mas sei que estou na lista de alvos", diz ele, que prefere não ser identificado.

A região do interior de SP tem sido visada pelo crime organizado há alguns anos. Assentamentos, terras indígenas e quilombolas são os alvos principais. "É mais fácil de invadir porque é uma população vulnerável e não chama tanta atenção", afirma o militante à reportagem. O ataque na sexta foi na cidade de Tremembé e resultou em dois assentados mortos, além de seis feridos.

"No meu assentamento, um lote foi transformado ilegalmente em condomínio", diz. "Denunciei, e o responsável pelo lugar disse para 'não mexer com os inquilinos' dele."

Invasão de grupos criminosos acontecem com frequência nas seis áreas do MST na região. As terras do movimento são de propriedade do governo, e os moradores ganham concessão para ocupá-la. "Invadir ilegalmente é o mesmo que construir uma casa em uma praça pública", explica o assentado.

As intimidações vindas das milícias já deixavam as famílias inseguras antes do ataque. Agora o clima é de medo e apreensão. "Se não houver interferência por parte da Polícia Federal, vamos ter famílias saindo, principalmente aquelas que mais trabalham."

O crime

Cerca de dez homens apareceram no assentamento Olga Benário em cinco carros e atiraram. Referência do movimento, Valdir do Nascimento, o Valdirzão, 52, foi morto com vários tiros na cabeça. "O que prova que esse grupo foi lá para aniquilá-lo", diz Gilmar Mauro, coordenador nacional do MST.

Também morreu no local Gleison Barbosa de Carvalho, 28. Irmão de Gleison, Denis Carvalho, 29, está internado em coma induzido. A assessoria do MST noticiou a morte de Denis durante a tarde, mas no período da noite informou que o homem segue hospitalizado.

As pessoas feridas têm entre 18 e 49 anos. Elas foram levadas ao Hospital Regional do Vale do Paraíba - Sociedade Beneficente São Camilo, de Taubaté, e ao pronto-socorro.

Boletim de ocorrência cita disputa por terras. Gilmar Mauro, membro da coordenação nacional do MST, afirma que havia cerca de 20 pessoas no local para garantir que a área não fosse invadida ilegalmente durante o processo de regularização de um lote que seria ocupado por uma família. No grupo, estavam crianças e idosos. Muitos deles dormiam quando o ataque ocorreu, por volta das 23h.

É uma região onde há uma pressão da especulação imobiliária muito intensa, articulada com políticos locais e milícias, para tomar alguns lotes. Há uma luta de resistência de bastante tempo.
Gilmar Mauro, membro da coordenação nacional do MST

Cerca de 45 famílias vivem na área. O assentamento é regularizado para o MST pelo Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) há 20 anos.

Fonte do MST ouvida pela reportagem afirma que o conflito envolve crime organizado. Os assentados, que têm autorização legal para ocuparem a área, temiam que milicianos tomassem o local.

O caso foi registrado como homicídio, tentativa de homicídio e porte ilegal de arma de fogo de uso permitido no plantão da Delegacia Seccional de Taubaté. Um homem foi abordado no local do atentado e autuado em flagrante por porte ilegal da arma.

Um homem foi identificado por testemunhas como um dos responsáveis e preso no sábado. De acordo com o delegado Marcos Ricardo Parra, que investiga o ataque, o suspeito, de 41 anos, confessou participação no crime, mas negou que tenha participado das mortes.

A Polícia Civil informou, ainda, que outro suspeito de envolvimento no ataque foi identificado, mas está foragido. O homem preso no sábado indicou que deve entregar mais comparsas, segundo Parra. Ainda não se sabe quantas pessoas estão envolvidas no crime.

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