Pacote fiscal muda clima político, e isenção às igrejas fica para 2025
A bancada evangélica avalia que o projeto de ampliação da isenção de impostos às igrejas não será votado neste ano. O entendimento é que seria inoportuno defender pagar menos tributos num momento em que o governo propõe corte até no salário mínimo para reduzir suas despesas em R$ 70 bilhões.
O que aconteceu
Insistir na proposta poderia prejudicar a imagem da bancada evangélica. A avaliação é de um deputado que ressalta a intenção do Ministério da Fazenda em mudar o indexador do salário mínimo e alterar as regras do BPC (Benefício de Prestação Continuada) —as duas medidas atingem a população mais carente.
O medo dos evangélicos é uma associação a militares e juízes, categorias acusadas de serem privilegiadas. Setores da sociedade reclamam que os trabalhadores bancam aposentadorias precoces e supersalários nas carreiras das Forças Armadas e do Judiciário.
Os parlamentares ressaltam que até o PT se comprometeu a votar a favor da ampliação da isenção às igrejas. O apoio ocorre depois de reunião com Lula e alteração na proposta, que antes incluía benefícios tributários para partidos políticos.
Confiança na aprovação
Os deputados da bancada evangélica falam em adiamento, mas descartam a derrota. Eles esperam a votação no ano que vem e apontam a corrida presidencial de 2026 como mais um fator para aprovação.
O raciocínio é que a proximidade das eleições muda as prioridades. Se agora é momento de cortar despesas, o ano anterior à campanha "amolece corações", porque políticos buscam argumentos para pedir o voto do eleitor religioso.
A lógica se aplica a deputados do governo e da oposição. O único partido que não se comprometeu a aprovar a ampliação da isenção de impostos para as igrejas é o PSOL.
Autor do projeto quer votar neste ano
O deputado Marcelo Crivella (Republicanos-RJ), autor da proposta, defende a votação neste ano. Bispo licenciado da Igreja Universal do Reino de Deus, ele tem uma leitura diferente daquela feita pelos colegas de bancada evangélica.
O parlamentar entende que a isenção das igrejas é um contraponto a cortes que atingem pessoas carentes. Os evangélicos sustentam que instituições religiosas fazem trabalho social, recuperam usuários de drogas e impedem que jovens entrem para o crime.
Crivella ressaltou que os incentivos fiscais às igrejas estão na lei. A Constituição de 1946 determinava isenção integral. Houve uma mudança na Constituição de 1988 e ficou estipulado benefício somente para atividades-fins:
Aonde o Estado não chega ou não tem recursos para chegar, ali está a igreja.
Marcelo Crivella, autor do projeto de isenção maior a igrejas
Nova lei
A ampliação da isenção livraria de impostos organizações de assistência e trabalhos beneficentes. A medida inclui creches, asilos, orfanatos, comunidades terapêuticas, monastérios, seminários e conventos.
Por se tratar de uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição), é necessário voto favorável em dois turnos. Partidos políticos, sindicatos e instituições de educação e assistência social sem fins lucrativos tentaram pegar carona na proposta e não tiveram sucesso.
A votação da proposta esteve muito perto de ocorrer. Ela estava na pauta de 13 de novembro e havia maioria para sua aprovação. A sessão era presidida pelo deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), um dos mais destacados integrantes da bancada evangélica.
Mas naquela noite um homem tirou a própria vida explodindo uma bomba na frente do STF. Francisco Wanderley Luiz morreu na hora. Bolsonarista, ele queria matar o ministro Alexandre de Moraes.
O deputado Sóstenes Cavalcante segurou a sessão por 35 minutos. Ele queria votar a proposta naquela noite, mas carros de polícia cercavam a praça dos Três Poderes, varreduras eram feitas na Câmara e a situação ficou insustentável. Os trabalhos foram interrompidos. O clima foi perdido.