De olho na 'reforma da burocracia' dos EUA através da IA, ambições de Elon Musk vão muito além de Marte
O retorno sobre o investimento para o bilionário Elon Musk foi espetacular. Ao doar € 111 milhões (cerca de R$ 686 milhões) para a campanha de Donald Trump, Musk já aumentou sua fortuna pessoal - somente em ações da Tesla - em mais de € 11 bilhões (cerca de R$ 68 bilhões), um retorno de mais de 10.000%. Antes mesmo de "colonizar Marte" com a SpaceX, o sul-africano de 53 anos poderia, junto com o próximo chefe da Casa Branca, "revolucionar a burocracia" com recursos da Inteligência Artificial (IA).
As ações do grupo Tesla, especializado em carros elétricos, dispararam nas negociações pré-mercado em Wall Street. Esse poderia ser o primeiro sinal de uma aposta vencedora para o bilionário Elon Musk, que também deve liderar uma auditoria completa da administração dos EUA para eliminar o que ele e o presidente eleito Donald Trump chamam de "desperdício".
Mas e quanto às políticas futuras e seu impacto em seu império de negócios? No que diz respeito à SpaceX, há poucas mudanças de rumo à vista, já que o governo federal dos Estados Unidos, independentemente do lado em que esteja, continua comprometido com a preservação da liderança norte-americana no espaço. Com Trump no comando, o sonho da Space X de enviar pessoas a Marte poderá ser realizado.
Para o presidente eleito dos EUA, Musk é um aliado preferencial, de acordo com Antoine Andreani, analista de mercados financeiros da XTB trading. "Donald Trump apreciou muito o que Elon Musk fez com o Twitter. Ele reduziu a equipe em três quartos; o peso do Estado é muito forte nos Estados Unidos, mas ele vai tentar reduzi-lo", disse, em entrevista à RFI. "Acho que ele vai usar o Twitter para fazer isso. Acho que Trump vai usar Elon Musk dessa forma. Depois disso, ele também poderia usar seus recursos na criptosfera. Musk tem uma posição forte em criptomoedas. Também nesse caso, acho que o bilionário poderia ter um papel importante", analisa.
"Propostas loucas e insanas"
Donald Trump prometeu nomear Elon Musk para chefiar uma comissão encarregada de realizar uma auditoria financeira do governo dos EUA durante sua campanha, com um objetivo: reduzir os gastos públicos. Com sua chegada à Casa Branca, Musk poderia chefiar uma "comissão governamental encarregada de realizar uma fiscalização financeira e de desempenho abrangente de todo o governo federal, com o objetivo de propor recomendações para reformas draconianas", como explicou recentemente a um clube de economistas em Nova York o magnata prestes a se tornar o 47º presidente norte-americano.
Quando Howard Lutnick, CEO do banco de investimentos americano Cantor Fitzgerald, perguntou a Musk no Madison Square Garden, em Nova York, no dia 27 de outubro, quanto ele poderia cortar desse "orçamento desperdiçado de US$ 6.500 bilhões", o multi-empresário respondeu: "Acho que podemos chegar a pelo menos US$ 2.000 bilhões".
Uma declaração que, como ressalta a revista francesa Le Point, deixou muitos economistas céticos, como Paul Mortimer-Lee, pesquisador do National Institute of Economic and Social Research (NIESR), que disse ao jornal britânico Telegraph que o plano de Elon Musk de cortar drasticamente os gastos públicos continha "propostas loucas e insanas".
Se aplicadas, as medidas de Musk poderiam acabar com o equivalente aos orçamentos de transporte, educação, ciência, meio ambiente, saúde e serviços sociais dos EUA. Por outro lado, Musk recentemente explicou que seu serviço de inteligência artificial Grok poderia ajudar profissionais da saúde a analisar imagens médicas, incluindo raios X, exames e ressonâncias magnéticas.
Influência decisiva na guerra da Ucrânia
À primeira vista, Elon Musk não ocupará um cargo ministerial na nova administração Trump. Mas seu papel como conselheiro do presidente aumentará seu poder, uma vez que sua constelação de satélites Starlink já lhe dá o direito de se conectar e desconectar em uma grande parte da Ucrânia devastada pela guerra. Um poder imenso, porque "com essa rede, os drones transmitem as coordenadas precisas dos tanques para a artilharia", observa David Hambling, autor de Swarm Troopers, à revista Le Point.
Com essa vitória, a colaboração de Musk com o governo dos EUA deve se intensificar, com mais pedidos da NASA e do Pentágono para seus lançadores de foguetes da SpaceX. Mas, acima de tudo, trata-se de um estilo sem precedentes que poderia influenciar o aparato estatal da maior potência do mundo.
"Não haverá mais empregos para ninguém"
O homem que gostaria de equipar suas fábricas de veículos com robôs humanoides Optimus é a favor da criação de uma renda universal, que poderia compensar a eliminação prevista de milhões de empregos pela inteligência artificial. "É provável que ninguém mais tenha um emprego", chegou a explicar Elon Musk há seis meses, quando entrevistado pelo ex-chefe da agência de comunicação Publicis, Maurice Lévy, durante a feira Vivatech.
A necessidade de compensar financeiramente o terremoto que se aproxima é um dos últimos pontos de concordância com Sam Altman, que foi seu sócio na criação da OpenAI, empresa controladora da ChatGPT, em 2015, e cuja porta ele bateu violentamente dois anos depois.
Marte, refúgio depois do caos?
A conquista do espaço é a resposta a outra das preocupações de Elon Musk: a perspectiva de uma "catástrofe iminente". O bilionário sul-africano, que deseja enviar uma colônia de seres humanos para Marte antes de 2030, afirma sentir que a conquista de outros planetas é uma questão de "urgência". "A civilização só sobreviverá se se multiplicar em vários espaços habitáveis", afirma.
"Um asteroide ou um grande vulcão poderia nos destruir. Estamos enfrentando riscos que nem mesmo os dinossauros tiveram que enfrentar. Um vírus, por exemplo, ou um efeito colateral do aquecimento global, pode ser catastrófico", explicou Musk durante uma palestra dada na universidade Sorbonne, em Paris, em 2015. "Mais ou menos rapidamente, precisamos ir além da Terra. Caso contrário, nossa civilização se extinguirá", sublinhou.
"Acho que a vitória de Donald Trump fará uma grande diferença para que a humanidade chegue a Marte e torne a vida multiplanetária", tuitou Musk em 30 de outubro.
Mas resta uma questão de peso: até onde irá a aliança entre o homem mais rico do mundo e o homem mais poderoso do mundo? É verdade que Elon Musk conseguiu mudar a opinião de Donald Trump, especialmente sobre a questão dos veículos elétricos. E no dia de sua eleição, o valor das ações da Tesla subiu 15%. Mas e se o presidente, em nome da realpolitik, impedir a ambição de Elon Musk? Resposta nos próximos capítulos do "mundo real", ironiza a revista francesa Le Point.