Histórico de STF e PGR reduz impacto de decisão do TCU sobre joias
A decisão do TCU (Tribunal de Contas da União) que liberou Lula e ex-presidentes de devolverem ao acervo público presentes recebidos durante o mandato pode ser inócua para a avaliação do STF (Supremo Tribunal Federal) e da PGR (Procuradoria-Geral da República) sobre eventuais crimes cometidos por Jair Bolsonaro no inquérito das joias.
O que aconteceu
TCU entendeu que não há lei específica para definir como presidentes devem lidar com presentes. Por maioria, o TCU determinou nesta quarta (7) que não caberia ao tribunal editar uma norma sobre isso, recuando sobre a posição anterior de 2016, que havia estabelecido parâmetros para considerar quais itens os presidentes poderiam ficar e quais teriam que ser enviados ao acervo público. A decisão foi tomada em processo que analisava relógio de luxo recebido por Lula em seu primeiro mandato, em 2005.
No ano passado, o TCU mandou Bolsonaro devolver joias e outros presentes. Decisão foi tomada em outro processo, que discute especificamente os presentes recebidos pelo ex-presidente e está sob relatoria do ministro Augusto Nardes. Agora cabe a ele pautar o processo no plenário do TCU para que o tribunal decida se vai aplicar o novo entendimento neste caso.
Resolução de 2016 embasou investigações sobre desvios de joias recebidas por Bolsonaro quando era presidente. Para alguns especialistas, essa mudança de hoje do TCU pode ser benéfica para o ex-presidente, levando a um entendimento de que não haveria conduta ilegal de Bolsonaro em vender os itens. O professor de direito da FGV Direito Rio Álvaro Jorge é um dos que vão nessa direção.
Integrantes do TCU reconhecem sob anonimato que a avaliação do STF no caso das joias é diferente. Enquanto o Tribunal de Contas analisou normas para a conduta dos presidentes, Supremo e PGR vão decidir sobre condutas que podem ser consideradas crimes no momento em que foram praticadas. Na época das vendas das joias, a decisão de 2016 do TCU era a única orientação existente sobre o tema.
Entendimento do TCU não necessariamente será seguido pelo Supremo. Como última instância do Poder Judiciário, o STF dá a palavra final sobre a interpretação da Constituição e das leis, enquanto o TCU é um órgão auxiliar de fiscalização do Poder Legislativo, cujas interpretações e decisões já foram derrubadas pelo Supremo em diferentes ocasiões.
Para o MPF (Ministério Público Federal), a análise do que é considerado crime também independe do TCU. Ouvidos sob anonimato, membros do órgão avaliam que o procurador-geral da República, Paulo Gonet, vai analisar o caso com base em seu entendimento do que pode ou não ser enquadrado como crime no inquérito das joias. Essa avaliação na área criminal não tem relação com a interpretação do TCU.
Especialista lembra que investigação vai além do recebimento dos presentes. Para o doutor em direito penal e professor da Escola Paulista de Direito Rodrigo Pardal, o inquérito das joias envolve outros episódios além do peculato (desvio de recurso público) e que podem levar a acusações contra Bolsonaro independentemente se os presentes forem considerados como bens públicos ou particulares.
Tal decisão do TCU não impede a persecução por corrupção passiva caso se entenda que existe ligação entre o bem recebido por Bolsonaro e a refinaria Landulpho Alves, na Bahia, que foi vendida por preço abaixo do mercado para uma empresa pertencente à família real dos Emirados Árabes Unidos, conforme já observado pela Controladoria-Geral da União (CGU).
Rodrigo Pardal, professor da Escola Paulista de Direito
A decisão é relevante na medida em que a investigação que vinha sendo feita em relação ao ex-presidente Jair Bolsonaro era baseada, justamente, em uma decisão do TCU de 2016. O fato de o TCU hoje se encaminhar para uma maioria para dizer que não existe lei tratando especificamente do tema parece indicar que, na visão do TCU, não foi problema o presidente Lula receber o relógio por falta de lei e também não deve ser considerado um problema o ex-presidente Bolsonaro ter recebido também os presentes por falta de lei.
Álvaro Jorge, professor da FGV Direito Rio
Decisões derrubadas
STF já derrubou decisões e entendimentos do TCU antes. Importante para fiscalização e para dar mais transparência às políticas públicas do governo federal, o TCU nem sempre tem seus entendimentos seguidos pelo Supremo.
Ministro do Supremo entendeu que não cabia ao TCU fiscalizar o Judiciário. Em julho deste ano, por exemplo, o presidente do STF, ministro Luis Roberto Barroso, derrubou uma decisão do TCU que havia determinado a realização de uma auditoria sobre o destino das multas aplicadas pela Justiça Federal.
Na Lava Jato, STF também derrubou várias decisões. Ao longo da operação, TCU chegou a bloquear R$ 2,1 bilhões da OAS e da Odebrecht e a declarar inidôneas as empreiteiras Andrade Gutierrez, Artec, UTC Engenharia e Queiroz Galvão, que haviam fechado acordo de leniência com o MPF. Decisões foram anuladas pelo STF.
Punição suspensa. O tribunal chegou a punir o ex-presidente da Petrobras José Sérgio Gabrielli pela compra da refinaria de Pasadena, nos EUA. Foi condenado a pagamento de multa de R$ 10 milhões e indenização de US$ 79,9 milhões, a ser paga em conjunto com o ex-diretor da estatal Nestor Cerveró, após constatar superfaturamento na aquisição da polêmica refinaria. O ministro Kassio Nunes Marques, do STF, suspendeu a decisão em junho do ano passado. Na ocasião, ministro do STF entendeu que a condenação havia ocorrido com base somente na delação premiada de Cerveró.
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.