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Da infância à maternidade: projeto fotográfico em Paris acompanha primas na Argentina há 25 anos

13/02/2024 11h45

Guille e Belinda são duas mulheres de 35 e 34 anos, respectivamente, que nasceram e cresceram na zona rural ao sul de Buenos Aires. A vida das duas primas passaria despercebida da maior parte do planeta se não fosse uma série de fotografias que as tornaram célebres no mundo da fotografia contemporânea, através das lentes de Alessandra Sanguinetti. As três estiveram em Paris para a abertura da exposição "As Aventuras de Guille e Belinda", na Fundação Henri Cartier-Bresson.

Patrícia Moribe, de Paris

Elas receberam a imprensa para a mostra que traz a essência dessa cooperação afetiva, com fotos que cobrem linearmente 25 anos, de 1999 até hoje. "O projeto continua", diz Sanguinetti, adiantando que prepara um filme a respeito, pois todas as sessões eram registradas em vídeo. A exposição conta ainda com uma parede decorada com fotos dos arquivos pessoais de Guilhermina Aranciaga e Belinda Stutz.

Alessandra Sanguinetti nasceu nos Estados Unidos em 1968. Aos dois anos foi morar com a família em Buenos Aires. Voltou aos Estados Unidos com 31 anos, onde estudou fotografia na ICP, em Nova York. Desde então ela vive entre os dois países.

Fotógrafa premiada, Sanguinetti é integrante da mítica agência Magnum. O encontro com as primas aconteceu de maneira orgânica, pois elas faziam parte do cenário rural onde a artista pesquisava para suas imagens. São instantes cativantes, engraçados e íntimos de duas meninas que viraram mulheres.

"Tudo começou quando eu estava fotografando os arredores da propriedade rural da minha família", ela conta. "Eu estava fotografando animais para um livro chamado 'No Sexto Dia', um trabalho que durou uns dez anos para ser realizado. Fotografei muito na casa de uma mulher chamada Juana, que tinha muitos animais e eu gostava muito dela muito. Juana é avó das meninas. Conheci as meninas quando elas eram pequenas. E a certa altura, quando elas já eram mais velhas e brincavam, comecei a fotografá-las", recorda Sanguinetti.

Sanguinetti conta brincando que no começo tinha que espantar as meninas, que queriam aparecer nas fotos. De repente, ela percebeu o potencial das duas primas.

Guilhermina e Belinda passaram a ser modelos de Sanguinetti por volta de 1999, quando tinham nove anos. As imagens mostram duas meninas curiosas num mundo de fantasia e brincadeiras lúdicas. Elas crescem juntas, viram mães, continuam no campo, mas a espontaneidade que mostram nas fotos ao longo dos anos é a mesma quando respondem a perguntas de jornalistas em Paris, com muitos cochichos de cumplicidade e sorrisos.

Guille conta que só se deu conta da repercussão das fotos durante a pandemia, quando o mundo todo se recolheu do mundo físico e ficaram muito tempo na internet.

"Foi muito louco ver as pessoas interpretando nossas imagens. É muito lindo que se identifiquem com a nossa infância, que tenha encantado tanta gente. Talvez porque vivam em cidades e que nos éramos livres e podíamos fazer o que quiséssemos no campo. Foi então que me dei conta da repercussão".

Já Belinda diz que nada mudou em sua vida. Como não está em nenhuma social, diz que ainda não se deu conta desse impacto das fotos. Sobre as que estão expostas, ela aponta como sua favorita uma em que aparece com um bebê. "Foi meu primeiro filho, eu era quase uma criança", conta.

Genocídio palestino

O site de Alessandra Sanguinetti traz a frase "Stop the Genocide" (Pare com o genocídio). Há também uma série de fotos sobre a Palestina. "Sou judia. Toda minha família do lado da minha mãe é judia sefardita. Por volta de 2002, quando já morava em Nova York, comecei a prestar muita atenção nas notícias. Israel sempre me pareceu um lugar seguro e maravilhoso", conta.

"Meus pais plantaram oliveiras em Israel, mas de repente, comecei a prestar atenção. Era a segunda intifada. Vi que não fazia sentido. Comecei a me informar, a ler e a conversar com pessoas e percebi que mentiram para mim toda a minha vida", explica a fotografa.

"Para fundar Israel foi necessário despovoar muita gente e a forma como os palestinos estavam sendo tratados era algo que eu não queria que me representasse. Então fui a Israel e à Palestina para ver isso com os meus próprios olhos. Foi a Palestina que me fez virar ativista para o resto da vida. Sou judia e americana. Os Estados Unidos fundaram Israel. Israel não pode fazer isso sem os Estados Unidos. Eu me sinto responsável. É um genocídio", argumenta Sanguinetti.

Sobre a Argentina, a fotógrafa prefere não se exprimir. "Não moro lá, meu depoimento seria superficial. Posso apenas dizer que a situação é muito ruim para o povo".

"As Aventuras de Guille e Belinda" está em cartaz na fundação Henri Cartier-Bresson até 19 de maio de 2024.

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