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Texas: milhões de pessoas continuam com falta de água e luz após nevascas

Arquivo - No Texas, após uma semana de uma das piores ondas de frio dos últimos anos, milhões de pessoas ainda sofrem com a falta de água e milhares estão sem luz - 15.fev.2021 - Montinique Monroe/AFP
Arquivo - No Texas, após uma semana de uma das piores ondas de frio dos últimos anos, milhões de pessoas ainda sofrem com a falta de água e milhares estão sem luz Imagem: 15.fev.2021 - Montinique Monroe/AFP

Cleide Klock

Correspondente da RFI nos EUA

23/02/2021 07h36

No Texas, Estados Unidos, após uma semana de uma das piores ondas de frio dos últimos anos, milhões de pessoas ainda sofrem com a falta de água e milhares estão sem luz. A volta ao normal pode demorar semanas. O presidente Joe Biden deve visitar esta semana o estado, grande produtor de petróleo, que agora vive uma crise de energia.

Milhares de pessoas continuam em abrigos em meio à pandemia. Cerca de 8,6 milhões de pessoas ainda estão sem água nas torneiras e muitos dos que estão recebendo, a água não é potável. Em várias residências, a água congelou dentro dos canos, as canalizações estouraram, casas ficaram inundadas, com vazamento pelas paredes à medida que a água ia descongelando. Por isso também muitas residências não conseguem ainda receber água porque necessitam de reparos.

Além disso, muitas estações de tratamento ficaram sem energia e a água que chega às casas está imprópria para o consumo. Quanto às fatalidades já passam de sessenta, a cada dia novos casos aparecem de pessoas que morreram de diversas maneiras tentando se aquecer: sufocadas por monóxido de carbono em carros, ou pelo mau uso de geradores. Foram registrados incêndios com mortes e pessoas, incluindo crianças, morreram de frio. Algumas regiões ainda sofrem com a falta de abastecimento nos supermercados e mais de 17 mil residências continuam sem energia elétrica após uma semana.

O mercado de energia do Texas é privado e com pouca regulamentação. Para escapar da regulamentação nacional, o próprio estado tem sua agência e várias empresas privadas produzem e distribuem, o que sempre provocou uma grande concorrência e preços baixos. Mas justamente para concorrer com preços baixos, as empresas não investiram em tecnologias para prevenção e segurança. O sistema não aguentou.

Milhões de pessoas ficaram sem energia, mas outras tantas estavam felizes porque não tiveram cortes, porém agora chegou a conta. Nesse mercado livre há no momento pouca oferta e muita demanda, e o preço foi para as alturas. Para se ter uma ideia, de acordo com a operadora da rede elétrica do Texas o preço do megawatt/hora antes da tempestade era de US$ 50 e chegou a US $ 9.000 por megawatt/hora durante a maior parte da semana passada, que é teto imposto pelo regulador de energia do Texas ao mercado.

Esse pico de preços deixou pessoas com contas de luz na casa dos milhares de dólares. Consumidores receberam contas de U$ 20 mil, mais de R$ 100 mil. Agora as discussões estão acontecendo em várias reuniões emergenciais no estado e no Congresso são para regulamentar esse mercado de energia que deixa os consumidores tão vulneráveis em vários aspectos.

Já se fala em moratória, em impedir as empresas de mandarem as contas e também ajudarem as pessoas a pagarem essas dívidas. E esse aumento dos preços também atingiu fornecedores que garantem preço fixo ao consumidor e foram pegos de surpresa com essas contas astronômicas. Várias empresas estão quebrando com essas dívidas. Uma dessas, a canadense Just Energy, que opera no Texas, declarou que pode ter perdido US$ 250 milhões por causa dessa nevasca.

Tragédia anunciada

Em 2011, o Texas teve um apagão de três dias durante uma dessas tempestades de neve que acontecem com muita pouca frequência dessa maneira tão avassaladora, mas já aconteceu esse problema e o governo não fez nada em uma década. Ao invés de impor novas regulamentações ou ordem de melhorias, a agência estadual emitiu um conjunto de "melhores práticas" voluntárias.

Na verdade, preparar todo o sistema para o inverno teria sido caro. As empresas de energia não queriam gastar dinheiro e os políticos, cujas campanhas são financiadas por elas, também não queriam fazer essa pressão. O interessante é que esses políticos - do Partido Republicano - quando aconteceram apagões muito menores aqui na Califórnia no verão passado, encheram a internet de mensagens cheias de sarcasmo, do tipo: olhe o que acontece quando um democrata está no poder.

Guerra política

O senador Ted Cruz disse que a Califórnia era incapaz de realizar até mesmo as funções básicas da civilização, como ter eletricidade confiável. Na semana passada, Cruz voou para Cancún com sua família enquanto o caos se estabelecia. Agora esses mesmos políticos estão tendo que lidar com a fúria também de grandes empresas de tecnologia que migraram da Califórnia para o Texas em busca de um refúgio fiscal e inclusive por ter menos regulamentação e depararam com essa crise generalizada.

Ao travar uma guerra cultural - do conservadorismo contra o liberalismo - governar ficou em segundo plano para o partido Republicano contemporâneo, os líderes esquecem simplesmente de administrar. Como o Texas é historicamente republicano, a ausência de competição política gera complacência, mas pelo jeito, não por muito tempo.

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