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Massacre de 100 civis por jihadistas é desafio para democracia no Níger

04/01/2021 10h50

O ataque do último sábado (2) contra dois vilarejos no oeste do Níger é um dos piores massacres de civis no país da África Ocidental, com frequência visado por grupos terroristas. Segundo último balanço, ao menos 100 pessoas foram assassinadas. A chacina ocorreu entre os dois turnos da eleição presidencial nigerina e é um desafio para a democracia de uma das nações mais pobres do mundo.

De acordo com Almu Hassan, prefeito do município de Tondikiwindi, onde estão localizados os dois povoados atacados, até agora foram registrados 70 mortos em Tchombangou e 30 em Zarumadareye. Esse balanço de mortos foi confirmado pelo governador da região à RFI. Ao menos 25 pessoas ficaram feridas.

Os dois lugarejos, separados por 7 km de distância, estão localizados a 120 km ao norte da capital Niamey, na região de Tillabéri, na fronteira com Mali e Burkina Faso. Conhecida como a região das "três fronteiras", ela é, há anos, um alvo de frequentes ações de grupos jihadistas.

O prefeito disse que "centenas" de terroristas, divididos em duas colunas, invadiram os locais em motocicletas. Eles cercaram os povoados e entraram atirando. Os vilarejos, e principalmente os locais de estocagem de alimentos, também foram incendiados. Uma verdadeira "tática de destruição total", apontou um observador.

Vingança

Várias fontes garantem que o ataque foi uma vingança pela morte de dois jihadistas que haviam tentado entrar anteriormente no vilarejo. Eles foram mortos por grupos de autodefesa da localidade.

Neste domingo (3), uma delegação oficial, liderada pelo primeiro-ministro Brigi Rafini e pelo ministro do Interior Alkache Alhada, visitou os vilarejos para "apoiar a população". As autoridades também levaram alimentos e medicamentos aos moradores

Em entrevista à enviada especial da RFI ao Níger, Magali Lagrange, o ministro do Interior, Alkache Alhada, reiterou que a invasão dos terroristas foi "um ato de repressão contra a resistência da população contra os jihadistas".

O presidente nigerino, Mohamadou Issoufou, postou no Twitter uma mensagem de condolências às vítimas de Tchombangou et Zaroumdareye. No tuíte, ele chamou os ataques de "covardes e bárbaros". O presidente chefiará uma reunião extraordinária do Conselho de Segurança Nacional nesta segunda-feira (4).

Ataque não foi reivindicado

Centenas de soldados nigerinos que participam da Operação Amahaoun que luta contra os grupos terroristas no país, já estão na região em busca dos responsáveis pelo massacre. Um militar, que descreveu os jihadistas como "violentos e sanguinários", declarou ser necessário "encontrá-los e neutralizá-los".

O ataque ainda não foi reivindicado. Mas o suposto chefe do grupo terrorista seria conhecido dos serviços de inteligência nigerinos. Ele seria natural de um vilarejo vizinho e pertenceria à mesma etnia que foi massacrada. A informação corrobora a tese de um acerto de contas.

Os moradores que conseguiram sobreviver à chacina fugiram em massa para a cidade de Mangaizé, 40 km ao sul, situada em uma zona segura. Um dispositivo foi montado para acolher os sobreviventes.

Mas alguns habitantes não quiseram abandonar suas casas e o ministro do Interior anunciou que um batalhão militar vai se instalar na região atacada para protegê-los. "Encontramos uma população devastada, mas corajosa e muito digna", afirmou Alkache Alhada.

Desafio para a democracia

O duplo atentado foi cometido no mesmo dia do anúncio do resultado do primeiro turno das eleições presidenciais no Níger de 27 de dezembro. O candidato do partido no poder (PNDS) e ex-ministro do Interior, Mohamed Bazoum, enfrenta o ex-presidente Mahamane Ousmane, do Partido RDR, no segundo turno previsto para 20 de fevereiro.

Após o ataque, Bazoum, que liderou o primeiro turno com 39,33% dos votos, prometeu fortalecer a luta contra os grupos "jihadistas". Ele disse que "este drama mostra que os grupos terroristas representam uma grave ameaça à coesão de nossa comunidade e um perigo que não pode ser comparado a nenhum outro".

A imprensa, a exemplo do jornal L'Événement Niger, também está preocupada. "O ano novo começa com uma má notícia para a segurança de nosso país. Esperemos que as autoridades tomem enfim as medidas adequadas para acabar com a barbaridade dos grupos terroristas", escreveu o diário em sua edição desta segunda-feira.

A inquietação vai além das fronteiras do maior país da África Ocidental. O jornal L'Observateur Paalga, do vizinho Burkina Faso, diz que "este duplo atentado reforça aos dois finalistas da presidencial nigerina que a prioridade das prioridades no país continua sendo a segurança". O diário Ledjely, da Guiné, destaca que, "democracia está sendo testada pelo terrorismo" no Níger que, pela primeira vez vive a possibilidade de ter "uma alternância de poder pacífica".

A história da ex-colônia francesa, de maioria muçulmana, é marcada por golpes militares desde sua independência em 1960. Subdesenvolvido, com mais de 75% de seu território coberto pelo deserto do Saara, o Níger é um dos países mais pobres do mundo e registra o pior Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do planeta.

Sua segurança tem influência em toda a região. O diário Aujourd'hui, do Burkina, lembra que o massacre contra os dois vilarejos se soma à morte de cinco militares franceses nos últimos dias no Mali, em um momento em que a França, mobilizada na região do Sahel contra os jihadistas, pretende diminuir sua participação na Operação Barkane.

Sucessão de ataques

Como outros países na área do Sahel, o Níger sofreu vários ataques jihadistas durante anos, especialmente no oeste e sudeste de seu território. Em 21 de dezembro, sete soldados morreram no oeste do país, onde são comuns os ataques do grupo Estado Islâmico do Grande Saara (EIGS). Em 12 de dezembro, na cidade de Toumour (sudeste) um massacre reivindicado pelo Boko Haram deixou 34 mortos.

A região de Tillabéri, local do duplo ataque do último sábado, está em estado de emergência desde 2017. Para combater os jihadistas, as autoridades proibiram em janeiro de 2020 o uso de motocicletas à noite e fecharam alguns mercados que, segundo eles, estavam fornecendo recursos para "terroristas".

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