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Mulher relata ofensa racista de vizinha no RJ: "Macaca aleijada"

Flávia Diniz diz ter sido chamada de "macaca aleijada" por vizinha no Rio de Janeiro - Arquivo pessoal
Flávia Diniz diz ter sido chamada de "macaca aleijada" por vizinha no Rio de Janeiro Imagem: Arquivo pessoal
do UOL

Marcela Lemos

Colaboração para o UOL, no Rio

05/12/2020 12h46

Uma mulher negra e portadora de necessidades especiais afirmou ter sido chamada de macaca aleijada durante uma discussão entre vizinhos no bairro de Marechal Hermes, na zona norte do Rio de Janeiro.

A produtora cultural aposentada Flávia Diniz disse em vídeo publicado na internet que foi chamada de bicho e teve a filha chamada de macaquinha pela mulher, que não teve o nome divulgado. Flávia tem uma página nas redes sociais que aborda temas como racismo e capacitação

A discussão começou quando a produtora cultura estava na varanda de casa, na quinta-feira (3), e começou a ouvir uma gritaria. Ela foi acusada de perturbar o sono da mulher com música alta.

"Eu até vejo vídeos de madrugada, mas é quieta, na minha, fazendo as minhas coisas. Ela falou assim: 'olha, a minha afilhada é juíza. Ela já está na sua cola, sabe de você e isso não vai ficar barato não. Você tem tirado minhas noites de sono. Eu falei: 'a senhora sabe que fico aqui em cima, que eu nem desço, praticamente não saio de casa'", disse.

Em seguida, Flávia relatou ter sido alvo de racismo. "Não sai porque é uma aleijada e aleijada tem que ficar aí em cima mesmo. Uma macaca aleijada, um bicho, bicho fica dentro de casa", disse a vizinha, segundo relato de Flávia, que estava muito emocionada e indignada no vídeo.

Em entrevista ao UOL na manhã de hoje, a produtora cultural estava abalada e informou que o caso foi registrado na delegacia como ameaça e injúria por preconceito. No termo circunstanciado, a aposentada conseguiu citar capacitismo - crime contra pessoas com deficiência. Emocionada, ela contou que a vizinha começou a persegui-la há um ano.

"Ela já tinha vindo aqui várias vezes. Sempre dizendo que eu tumultuo a vida dela, mas foi a primeira vez que ela usou essas palavras. Essas queixas eram sempre direcionadas a mim. O som do vizinho estava alto, ela vinha e me xingava. Me ameaçava. Dizia: 'você vai ver o que vai te acontecer'. Isso tudo começou depois que ela me viu voltando de um barracão [de candomblé] com roupa e pano na cabeça", recordou.

"Ela mora no bloco 5 e eu no 3, ela veio debaixo da minha varanda gritar. Todos ouviram", disse Flávia. Segundo ela, quanto mais argumentava, mais era agredida. Ao informar que chamaria a polícia, ela voltou a receber ataques racistas. "Chama, chama quem você quiser, sua neguinha, sua crioula, aleijada", disse a vizinha, de acordo com a produtora cultural.

Flávia contou ainda que tentou se defender das acusações de música alta e que chegou a alegar por mais de uma vez que ficava sozinha em casa. Neste momento, a vizinha se referiu a filha da produtora cultural como macaquinha. "Bicho fica sozinho. Até sua macaquinha não tá aí", disse a vizinha.

De acordo com Flávia, a Polícia Militar foi chamada, foi ao local, mas a vizinha suspeita de racismo não abriu a porta. "O policial militar era negro, ficou consternado com a situação. Os vizinhos disseram que ela [a vizinha] é louca. O policial disse: 'Não existe loucura, existe um crime de racismo aqui. Crime muito sério e ela não pode passar imune. Ela que procure um médico, um psiquiatra e ele foi lá e ela covardemente não abriu a porta. Ele falou que bateu muito e que ela não abriu a porta. Os vizinhos disseram: 'viu como é louca?'", lembrou.

Flávia comentou ainda como é difícil ter qualquer reação diante de um crime de racismo

O que me impressiona foi a minha falta de reação, coisa que eu sempre falei: se acontecesse isso comigo, eu ia fazer e acontecer. Mentira! O racismo te cega, é muito difícil ter reação, só fiquei com aquilo: você é bicho, aleijada, você é uma macaca e por isso tem que ficar aí dentro, e tudo isso rodando a minha cabeça
Flávia Diniz, comentando sobre as denúncias contra a vizinha

Flávia criticou ainda a postura dos demais moradores do prédio. Segundo ela, no dia seguinte, eles desistiram de testemunhar contra a vizinha. "Vi o pacto da branquitude como é forte. Como eles são fortes e unidos. São frouxos, que vem xingam e não abrem a porta na hora que a polícia bate. Eles são unidos em falar que ela é louca. Me digam ela é louca?", lamentou.

O vídeo gravado postado por Flávia na internet já tem mais de 10 mil visualizações nas redes sociais. Ela é aposentada por invalidez. Devido à dificuldade de locomoção ocasionada pela deficiência de sequela, a moradora precisa usar um andador.

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