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Como príncipe do Catar salvou carreira de brasileira campeã de rali

Helena posa com sua navegadora Joseane Koerich e o carro comprado com doação do príncipe do Catar - Acervo Pessoal
Helena posa com sua navegadora Joseane Koerich e o carro comprado com doação do príncipe do Catar
Imagem: Acervo Pessoal
do UOL

Vitor Matsubara

Do UOL, em São Paulo (SP)

19/09/2020 04h00

Resumo da notícia

  • Doação de Nasser Al-Attiyah veio após incêndio que destruiu seu carro no Rally dos Sertões
  • Helena Deyama tem 25 anos de experiência no automobilismo e grande vivência em ralis
  • Piloto se divide entre competições e trabalho como instrutora de pilotagem

O Rally dos Sertões de 2009 ficou marcado para sempre na memória de Helena Deyama.

Poderia ser por um incidente que quase terminou em tragédia. Ela e sua navegadora Joseane Koerich disputavam a vitória em sua categoria quando sentiram um forte cheiro de etanol de dentro de seu Mitsubishi TR4.

"Parei em uma área descampada fora da pista e só deu tempo de saltar do carro em meio às chamas", afirmou Helena, em entrevista a UOL Carros.

Pajero Helena 1 - Reprodução/Webventure - Reprodução/Webventure
Veículo foi completamente destruído em poucos segundos
Imagem: Reprodução/Webventure

Àquela altura, o fogo já havia consumido mais da metade de seu carro, que havia sido adquirido especialmente para participar da prova. "Eu ainda tinha umas cinco prestações do financiamento para pagar", lembra.

Desoladas, Helena e Joseane sentiram na pele a solidariedade tão presente no ralis quando os demais pilotos resolveram ajudá-las. Foi assim que elas decidiram rifar a única coisa que havia lhes restado: um jogo de pneus sem uso.

A rifa já havia virado um leilão após a cerimônia de premiação do rali quando Nasser Al-Attiyah perguntou o que estava acontecendo. Quando soube o motivo de tanto alvoroço, o príncipe do Catar (que participou da corrida pela equipe oficial da Volkswagen) tomou uma atitude que nunca será esquecida pelas atletas.

Helena e Nasser Al-Attiyah - Acervo Pessoal/Helena Deyama - Acervo Pessoal/Helena Deyama
Joseane Koerich (esq.), Nasser Al-Attiyah e Helena Deyama
Imagem: Acervo Pessoal/Helena Deyama

"Ele pediu para pararem o leilão porque queria me ajudar fazendo uma doação de US$ 20 mil para que eu continuasse correndo. Foi uma festa! Lembro que o jogaram para o alto e quando ele subiu ao palco comecei a chorar de emoção".

A atitude surpreendeu até o banco de Helena, que só creditou o valor em sua conta corrente após várias explicações. "Ele precisou mandar um e-mail falando que era uma doação".

Príncipe da Helena

Helena Deyama e sua L200 - Fabio Davini/Rally das Serras - Fabio Davini/Rally das Serras
'Príncipe' foi o nome dado por Helena à sua picape L200
Imagem: Fabio Davini/Rally das Serras

Apesar do gesto nobre, Helena ainda não tinha a quantia suficiente para adquirir um carro novo.

"O dinheiro dava menos da metade do valor de um carro porque na época ele custava US$ 50 mil. Mas eu precisava dar um jeito de conseguir o restante porque pensei que, se ele fez uma doação, eu não poderia desistir. Seis meses depois eu consegui comprar o carro e colei o brasão da família dele na carroceria. E foi assim que ele ficou conhecido como o 'Príncipe da Helena'", lembra, aos risos.

Lidar com os (altos) gastos do automobilismo sempre foi um desafio para a piloto formada em Artes Plásticas.

"Comecei a fazer alguns trabalhos de freelancer enquanto estava na faculdade, e graças a eles que comecei a conquistar meu patrimônio para realizar meus sonhos".

Àquela altura, Helena tinha adquirido sua moto, que utilizava para ir estudar e viajar. Ela só deixaria as Artes um pouco de lado aos 36 anos, quando participou (e ganhou) sua primeira competição oficial.

"Depois de vencer descobri que o pessoal da prova achava que eu não ia conseguir chegar até o fim e que acabaria atrapalhando os outros competidores", afirmou. "Quatro anos depois consegui alguns patrocinadores e corri meu primeiro Rally dos Sertões".

Louca pelos Sertões

Helena Deyama 2 - Luciano Santos/Sigcom/Rally dos Sertões - Luciano Santos/Sigcom/Rally dos Sertões
Helena parte para seu 16º Rally dos Sertões em 2020
Imagem: Luciano Santos/Sigcom/Rally dos Sertões

Desde então, Helena admite que virou uma "viciada nos Sertões", tanto que, neste ano, ela parte para sua 16ª participação.

"Meu trabalho no ano inteiro é para correr o Rally dos Sertões porque eu gosto muito. Sabe quando você fala que se não for é como se faltasse uma parte de mim? É assim que me sinto quando não corro".

Helena havia participado todas as edições do rali de 2001 a 2013 quando sua patrocinadora decidiu retirar todos os acordos de patrocínio firmados no automobilismo. Para sua sorte, um convite fez com que Helena deixasse o "Príncipe" (ou melhor, seu carro) de lado para entrar no mundo dos UTVs - um veículo que é uma espécie de meio-termo entre um automóvel e um quadriciclo.

"Meu primeiro contato foi em uma etapa da Polaris Cup (torneio promovido pela fabricante Polaris com clientes e pilotos). Me propuseram uma parceria e fui campeã já no meu ano de estreia. E assim a parceria durou por mais três anos", conta.

UTV Helena Deyama - Vinícius Branca/4×4 Aventura/Vipcomm - Vinícius Branca/4×4 Aventura/Vipcomm
Deyama foi 1ª mulher a correr na categoria de UTVs
Imagem: Vinícius Branca/4×4 Aventura/Vipcomm

Depois de ficar dois anos sem competir por conta de problemas familiares, Helena voltou à prova em 2018, quando fez sua estreia nos UTVs.

"Era meu sonho (correr de UTV) porque a categoria estava crescendo e, como não consegui fechar parcerias, acabei alugando um carro já preparado. Fui a primeira mulher a correr o rali de UTV e consegui ir ao pódio. E neste ano, enfim, consegui fechar uma parceria com a Can-Am", celebra.

Polivalente

Helena Deyama no curso de pilotagem - Acervo Pessoal - Acervo Pessoal
Helena também é instrutora de pilotagem e palestrante
Imagem: Acervo Pessoal

Hoje, com 25 anos de experiência no automobilismo, Helena acumula inúmeras conquistas, incluindo o Campeonato Brasileiro de Rally Cross Country de 2005 e o bicampeonato do Brasileiro de Rally Baja.

Apesar de viver em prol da velocidade há pelo menos oito anos, Helena não deixou sua empresa de design gráfico de lado.

Além dessas atividades, ela também é palestrante motivacional e instrutora de pilotagem.

Helena conta que começou a ser instrutora em 2005, quando foi chamada para ministrar o BMW Driving Training (curso de pilotagem realizado com clientes da marca) por ninguém menos do que Ingo Hoffmann, ex-piloto de Fórmula 1 e multicampeão de Stock Car.

Perguntada sobre qual de suas profissões é a preferida, Helena não esconde seu amor pelo automobilismo, mas guarda um carinho especial pelos cursos de pilotagem.

"Ser instrutora de direção segura me dá uma satisfação muito grande porque estou transmitindo conhecimento para pessoas 'comuns' para que elas andem com mais segurança nas ruas. Então estou ajudando a salvar vidas", concluiu.

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