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Governo Bolsonaro "é contra educação", diz ex-ministro da Educação de Dilma

do UOL

Janaina Garcia

Colaboração para o UOL, de São Paulo

12/08/2020 18h34

A atuação de uma sociedade civil forte e articulada pode servir como uma espécie de vacina às ações de um governo federal que "não dá a mínima para a educação; eu diria até que é contra a educação".

A avaliação é do filósofo e ex-ministro da educação Renato Janine Ribeiro, para quem a recente aprovação do Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação), na Câmara dos Deputados, em meio à pressão de diferentes setores sociais, ilustra a possibilidade por ele defendida ante uma gestão federal que acumula cortes de verbas e polêmicas - em um ano e meio, por exemplo, já foram três os ministros nomeados pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) ao comando da pasta.

"Dado o atual governo federal, os efeitos da pandemia na educação são uma tragédia", classificou o ex-ministro.

Janine foi o convidado da semana no ciclo "Conversas na Crise - Depois do Futuro", organizado pelo Instituto de Estudos Avançados (IdEA) da Unicamp em parceria com o UOL. Além do apresentador, o jornalista Paulo Markun, participaram do encontro Ana Carla Bermúdez, repórter do UOL especializada em educação, Fernando Almeida, professor da PUC-SP, e o poeta e linguista Carlos Vogt, presidente do Conselho Científico e Cultural do IdEA.

Ex-ministro por seis meses no governo de Dilma Rousseff (PT), em 2015, Janine defendeu não ser uma "medida minimamente sensata" a volta às aulas, neste momento, especialmente na educação básica, em meio a uma média diária ainda oscilando em torno de 1.000 mortos pela pandemia.

"Não sei se tem que esperar a vacina", avaliou, salientando que, na Europa, foram adotados protocolos pela retomada escalonada das atividades educacionais com base em número de novos infectados, redução de mortos em escala constante, por 15 dias, e disponibilidade de leitos comuns e de UTI (Unidade de Terapia Intensiva).

Embora, na avaliação do filósofo, "ensino médio e ensino superior funcionam melhor à distância", a subnotificação de casos no Brasil e uma média que pouco oscila para cima ou para baixo nos mais de 1.000 mortos/dia - "fica a dúvida sobre a veracidade desses dados", definiu - não possibilitaram um retorno às aulas no país neste momento. "Não creio que a volta às aulas sem esse cuidado, agora, seja uma medida minimamente sensata", ponderou.

"Pressão da sociedade"

O ex-ministro não poupou críticas ao governo Bolsonaro, o qual, afirma, foi eleito sem uma plataforma de educação, em contraste com as gestões federais anteriores. Na definição de Janine, o atual governo não estaria, por exemplo, disposto a combater a desigualdade na educação - explicitada, durante a pandemia, com o acesso remoto a aulas a uma parcela ainda minoritária dos estudantes brasileiros.

"Desde Itamar Franco [1992-1995], o Brasil foi testando políticas de inclusão social importantes. Com Itamar, Fernando Henrique Cardoso... e com o PT isso tomou uma grande escala", disse. "O problema é que esse governo é contra isso: não quer esse tipo de inclusão, e infelizmente vários governos estaduais eleitos na cola dele compartilham essas convicções."

Se é possível corrigir esse panorama? Para o filósofo, é uma tarefa "complicada", ainda que não impossível.

"Tem que haver uma pressão da sociedade muito forte; o caso Fundeb é exemplar", ilustrou Janine, admitindo, ao mesmo tempo, ser "muito difícil" recompor laços sociais tão desgastados no Brasil - sobretudo depois das manifestações de 2013 e do processo que levou ao impeachment de Dilma, em 2016.

"Tem muita briga entre os partidos; talvez a sociedade deva ter movimentos extra-partidários que busquem restabelecer diálogos, elos — a defesa da vida contra a morte é uma plataforma base. O emblema do presidente é uma arminha com os dedos, uma coisa totalmente louca (...). Colocar a questão da vida e da saúde é fundamental, e a educação básica pública unifica muito no Brasil, haja visto o Fundeb", afirmou.

Outra ação no âmbito social, defendida pelo filósofo, é o trabalho de informação com "não convertidos", ou seja, com pessoas que não pensem necessariamente da mesma forma, ou não compactuem dos mesmos valores.

"É preciso lembrar que, no Brasil, as pessoas não são muito politizadas. Se a gente conversar com elas pessoas não diretamente sobre Bolsonaro, PT, mas em cima de valores, projetos, questões como vida e algumas ações bonitas feitas por algumas pessoas, também para sair da depressão. São caminhos para a gente evitar a locomotiva no fim do túnel".

Confira a íntegra da entrevista

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