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Polícia investiga suspeita de outras torturas em mercado na zona sul de SP

Suspeita de outra tortura no supermercado Ricoy, na zona sul de São Paulo - Imagens cedidas por Igor Carvalho/Brasil de Fato
Suspeita de outra tortura no supermercado Ricoy, na zona sul de São Paulo Imagem: Imagens cedidas por Igor Carvalho/Brasil de Fato
do UOL

Alex Tajra e Luís Adorno

Do UOL, em São Paulo

05/09/2019 15h09Atualizada em 06/09/2019 14h43

A Polícia Civil de São Paulo instaurou inquérito, às 12h de hoje, para apurar a suspeita de que seguranças de um mercado da zona sul de São Paulo costumam torturar suspeitos de furto.

Além de um jovem negro, de 17 anos, chicoteado nu, por ter tentado furtar quatro barras de chocolate, há suspeita de que ocorrem ao menos outras duas torturas.

O site Brasil de Fato publicou reportagem que mostra fotos de um homem branco amarrado e com escoriações nas costas e um vídeo de um menino sendo ameaçado dentro do supermercado.

A equipe de policiais do 80º DP (Distrito Policial), na Vila Joaniza, tenta, a partir da tarde de hoje, confirmar onde e quando as vítimas foram vítimas das torturas física e psicológica. Não havia, até então, nenhum registro de ocorrência.

Em um dos novos casos que estão sendo apurados, seguranças empilharam produtos que a vítima teria tentado roubar no supermercado Ricoy, embalagens de linguiça e frango congelados, chicletes, desodorante e um xampu. Depois, a mesma vítima aparece com o rosto machucado, encostado em uma estrutura com o logotipo do supermercado.

A terceira vítima seria uma criança. Em um vídeo, um dos seguranças fala a ela: "Você vai ficar em uma cela cheio de moleques da sua idade, ou mais velho, tem uns lá que gostam de abusar de outro moleque. Olha que legal. Tem uns que vão te dar uma surra bem dada. Olha que legal".

A Justiça de São Paulo expediu mandado de prisão cautelar, válido por 30 dias, na noite de ontem, contra dois seguranças suspeitos de terem torturado o jovem de 17 anos, pelo caso que veio à tona na segunda-feira (2). Na manhã de hoje, nove investigadores, em quatro viaturas, foram à rua buscar os seguranças D.O.F., 37, e V.B.S, 49. Até a última atualização deste texto, eles ainda não haviam sido localizados.

Delegado diz que os dois são considerados foragidos. O advogado de um deles entrou na Justiça com pedido de revogação da prisão.

Na decisão judicial, a juíza Tatiana Saes Valverde Ormeleze escreveu que as investigações policiais "apontam para a possível ocorrência do crime de tortura". Nos autos, há ainda a informação, revelada pelo gerente do supermercado, Robson Tiago Silva, que um dos seguranças pediu desligamento no último dia 29 "por vontade própria".

A segurança no entorno do mercado foi reforçada hoje. Havia cinco viaturas da PM (Polícia Militar) próximas ao local. Policiais militares disseram à reportagem que o reforço ocorreu para evitar riscos de confusões, uma vez que os ânimos estão exaltados na região.

Jovem chicoteado por seguranças de supermercado - 03.set.2019 - Reprodução/TV Globo - 03.set.2019 - Reprodução/TV Globo
Jovem chicoteado por seguranças de supermercado mostra costas após sofrer agressões
Imagem: 03.set.2019 - Reprodução/TV Globo

Jovem torturado vai ao Conselho Tutelar

O adolescente de 17 anos torturado no mercado Ricoy esteve hoje, acompanhado de seu irmão Wagner Bispo de Oliveira, 30, no conselho tutelar da Cidade Ademar.

Segundo o advogado Ariel de Castro Alves, conselheiro do Condepe (Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana), o conselho tutelar encaminhará o adolescente para acompanhamento psicossocial junto ao Creas (Centro de Referência da Assistência Social) e ao Caps (Centro de Apoio Psicossocial).

"Um relatório sobre a situação de risco do menino, que vivia nas ruas e usava drogas, será encaminhado para a Vara da Infância e Juventude de Santo Amaro, que deve acompanhar o caso, inclusive para regularizar a guarda do jovem junto ao irmão Wagner, ou com algum dos demais seis irmãos. O pai do jovem faleceu no início desse ano e a mãe, conforme os familiares, sofre de alcoolismo e não foi localizada", disse o advogado.

À reportagem, o irmão do jovem disse hoje querer preservar o caso e o jovem, não permitindo entrevista, para que não haja prejuízos a ele. A polícia acredita que o caso deve estar sob sigilo em breve, uma vez que a vítima é menor de idade.

Ricoy - Reprodução / Google Street View - Reprodução / Google Street View
Supermercado Ricoy está sendo investigado por suspeita de ser local de tortura de suspeitos de furto
Imagem: Reprodução / Google Street View

Início das investigações

O caso veio à tona na última segunda-feira (2), quando o estudante denunciou o caso na Polícia Civil. Em uma manhã de julho, conforme o Boletim de Ocorrência registrado, ele teria tentado furtar quatro barras de chocolate quando fora abordado na saída do supermercado pelos seguranças.

O jovem foi levado a uma sala dentro do estabelecimento, amordaçado, despido e chicoteado com fios elétricos. No depoimento, consta ainda que o jovem não quis registrar a denúncia naquele momento, "pois temia pela sua vida".

"Na saída do supermercado, ouviu S. [um dos seguranças acusados] dizer que, caso falasse algo para alguém, iria matá-lo", diz o documento. Os seguranças gravaram em vídeo as agressões. O UOL teve acesso à filmagem e confirmou sua veracidade com o delegado Pedro Luis de Souza.

No vídeo, o jovem aparece quase inteiramente nu, com as calças abaixadas na altura do joelho, enquanto é agredido com uma espécie de chicote por um homem. No local onde o jovem fora torturado, é possível notar caixas lacradas e caixotes de plástico com frutas, no que aparenta ser um depósito.

O supermercado disse já ter afastado os seguranças, que prestavam serviço por meio de uma empresa terceirizada.

Em nota, a SSP (Secretaria da Segurança Pública) informou que os seguranças envolvidos no crime contra um adolescente não são policiais. "Os autores tiveram a prisão temporária decretada por 30 dias pela Justiça e estão foragidos. As investigações seguem para localiza-los assim como apurar novas denúncias envolvendo o supermercado."

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