Ela viu faturamento crescer 400% ao vender bonecas negras em negócio social
Jaciana Melquíades, de 35 anos, nasceu e foi criada em Belford Roxo, na Baixada Fluminense. Quando criança, além de brincar na rua com os vizinhos, ela tinha duas bonecas (uma Barbie e uma bebê, ambas loiras e de olhos azuis), mas em nenhuma delas Jaciana se via representada.
A bacharel em História e empreendedora social mal sabia que, anos mais tarde, a falta de representatividade em brinquedos se tornaria a porta de entrada para seu negócio e, principalmente, para o fortalecimento da identidade de crianças negras e a educação para um mundo menos racista.
A faculdade de História me fez criar senso crítico e, logo após a maternidade, entendi que precisava trabalhar a autoestima daquela criança desde cedo"
Jaciana Melquíades, empreendedora social
O começo da empresa
A "Era uma Vez o Mundo" nasceu dentro da casa de Jaciana. Com habilidades manuais e muita criatividade, ela começou a vender livros infantis feitos em tecido para amigos e familiares. "Eles me incentivaram muito e, em 2014, eu abri a minha loja online", afirma.
A empresária trabalhava na UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro) com a capacitação de profissionais de saúde para atender jovens de periferia - na maioria das vezes negros - e via, aos poucos, que sua segunda fonte de renda estava ganhando força, mesmo que ela exercesse o trabalho de vendas e marketing de forma intuitiva.
"Vivi a experiência de exercer duas funções até meados de 2017, quando percebi que não estava mais fazendo bem nenhum dos trabalhos. Como eu enxergava na 'Era uma Vez o Mundo' uma satisfação pessoal, preferi me dedicar à loja", explica.
Segundo a empreendedora social, seu grande objetivo é conseguir, de fato, impactar a educação: "Pensar nisso é o que me mantém".
Dedicando-se em tempo integral ao negócio, Jaciana, que já havia produzido três edições de livros, todas com temáticas raciais, viu a demanda pelos produtos e por oficinas de formação de professores aumentar. Ela contou com a ajuda do marido, que entrou como sócio, até que os bonecos Dandara e Zambi nasceram.
Faturamento explodiu em 400%
"Os bonecos nos trouxeram um caráter mais mercadológico. Percebemos que havia um nicho a ser explorado, principalmente por falta de interesse das grandes fabricantes de brinquedos, e resolvemos investir nesse caminho", conta a empresária.
Entre os bonecos e bonecas disponíveis no mercado, há apenas uma parcela de 7% negros. Havia um vazio que nós precisávamos preencher"
"Eu fui estudar para entender melhor esse mercado, fiz um MBA de Gestão de Negócios, desenvolvi uma metodologia de produção e fomos, aos poucos, ampliando a distribuição", afirma.
Segundo ela, o negócio social deu tão certo que, apenas neste ano, o faturamento teve um aumento de 400% em relação a 2018. "Eu faturava o equivalente a 100 bonecas por mês [cada uma custa R$ 80 ao consumidor final]. Neste ano, faturo 400. O objetivo, até o fim do ano, é que esse valor chegue a 1000 bonecas", explica.
O número de pessoas trabalhando no negócio de Jaciana também tem crescido. Ao final do ano passado, ela, o marido e a sogra se dedicavam à confecção dos produtos. Agora, outras seis costureiras também fazem parte da equipe.
Negócio transformador
Para Jaciana, o negócio de impacto social provoca uma série de mudanças não apenas em sua vida, mas na de crianças e adultos que podem, por meio do material, entrar em contato com um universo antes pouco desbravado.
"Quando a gente chega, seja através dos livros ou dos bonecos, às crianças negras, percebemos que elas começam a lidar de um modo distinto. Elas se percebem empoderadas. Já as crianças brancas, quando têm contato com a temática racial, olham para a diversidade sem preconceito, com respeito mútuo. E esse trabalho precisa ser estimulado sempre", afirma a empresária.
Não é só sobre vender um produto, mas sobre provocar transformação."
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