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Lava Jato ocupou prédio antes usado para distribuir propinas, segundo MP

Edifício Patriarca, em Curitiba, onde havia escritório da Lava Jato e também de empresa que pagava propina - Vinicius Konchinski/UOL
Edifício Patriarca, em Curitiba, onde havia escritório da Lava Jato e também de empresa que pagava propina
Imagem: Vinicius Konchinski/UOL
do UOL

Vinicius Konchinski

Colaboração para o UOL, em Curitiba

18/02/2019 04h02

O Edifício Patriarca, no centro de Curitiba, é a sede da operação Lava Jato no Paraná. As salas do oitavo do andar do prédio estão, desde novembro de 2014, ocupadas por membros do MPF (Ministério Público Federal) que atuam na força-tarefa. Há procuradores federais trabalhando também no segundo e sexto andares do imóvel.

Antes deles, entretanto, era neste prédio em que empresas que administram as rodovias com pedágios no Paraná se reuniam para organizar e recolher propinas pagas a membros do estado. É o que diz denúncia da Lava Jato contra supostos agentes do esquema.

De acordo com documento encaminhado por procuradores à Justiça Federal, entre 2012 e o fim do primeiro semestre de 2014, executivos de concessionárias de pedágio do Paraná encontraram-se no escritório da ABCR (Associação Brasileira das Concessionárias de Rodovias) no Patriarca para tratar de propinas.

Edifício Patriarca, em Curitiba - Vinicius Konchinski/UOL - Vinicius Konchinski/UOL
Imagem: Vinicius Konchinski/UOL

Numa sala do segundo andar do prédio, eles reuniram todo mês até R$ 240 mil em dinheiro vivo para depois repassá-los a membros do governo de Beto Richa (PSDB) em troca de mudanças em contratos de gestão das estradas favoráveis às próprias companhias.

O MPF apurou que as empresas Triunfo Econorte, Viapar, Ecocataratas, Caminhos do Paraná, Rodonorte e Ecovia integravam o esquema.

Elas entregavam recursos para o então diretor regional da ABCR, João Chiminazzo Neto, acusado de ser o responsável pela distribuição do dinheiro a membros do governo do Paraná, incluindo o próprio ex-governador Beto Richa.

Chegada da Lava Jato 

Hélio Ogama foi presidente da Econorte de 2007 a 2015. No ano passado, ele fechou um acordo de delação premiada com o MPF e detalhou como funcionavam as reuniões na ABCR. 

Segundo ele, os encontros para recolhimento de propina começaram em 1999, ainda durante governo de Jaime Lerner (1995 a 2003). Perduraram na gestão do ex-governador Roberto Requião (2004 a 2010). Naqueles anos, contudo, a propina paga pelas empresas era recolhida no antigo escritório da ABCR localizado no Prédio do Relógio, também no centro de Curitiba.

Em 2012, disse Ogama, as reuniões passaram ao escritório da ABCR no Edifício Patriarca. Acontece que, em 2014, membros da força-tarefa da Lava Jato passaram a trabalhar no prédio. Por conta da chegada deles, Chiminazzo decidiu mudar o escritório da ABCR de endereço, relatou Ogama.

A ABCR, então, passou a funcionar a cerca de um quilômetro de distância dos escritórios da Lava Jato. Segundo o MPF, os pagamentos em dinheiro vivo na associação cessaram em 2015.

Benefícios de até R$ 8,4 bilhões 

O MPF estima que ao menos R$ 35 milhões em propinas tenham sido pagas a membros do governo do Paraná durante todo o período investigado.

Em troca dos pagamentos, as empresas teriam deixado de realizar R$ 8,4 bilhões em obras inicialmente previstas nos contratos de concessão das rodovias.

De acordo com os procuradores, quando as empresas assumiram a gestão das estradas paranaenses, elas haviam se comprometido a duplicar 995,7 km de rodovias até 2016. Em 2019, segundo o MPF, só 273,5 km estão duplicados.

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Ao todo, 33 pessoas, incluindo o ex-governador Beto Richa, foram acusadas pelo MPF de integrar o esquema de corrupção. Membros do governo Lerner e Requião não foram denunciados.

Denunciados dizem ser inocentes 

Procurado pelo UOL, o advogado Walter Bittar, que defende Beto Richa, afirmou que o ex-governador é inocente. O advogado se disse surpreso pelo fato de outros ex-governadores não terem sido denunciados já que, segundo o MPF, o esquema de propinas teria funcionado de 1999 a 2015.

O MPF informou que crimes possivelmente cometidos em gestões anteriores já estariam prescritos. Por isso, nenhum membro do governo Lerner (1995 a 2003) ou de Roberto Requião (2004 a 2010) foi denunciado pelo órgão. Lerner e Requião afirmam que não houve pagamento de propinas por empresas durante seus governos.

A ABCR afirmou que a entidade não participou nem participará de qualquer atividade não republicana. A associação disse que colabora com as investigações e fechou seu escritório em Curitiba após a citação de Chiminazzo nas investigações. Ele desligou-se da entidade.

A Triunfo Econorte informou que demitiu Helio Ogama assim que soube das investigações do MPF. A companhia não quis comentar as denúncias, mas disse instaurou um comitê de investigação independente para apurar os fatos.

A Rodonorte também criou um comitê independente e disse estar colaborando com autoridades. A companhia ressaltou que investiu mais de R$ 3,2 bilhões em obras de melhorias, manutenção e ampliação das rodovias que administra.

Ecocataratas e Ecovia disseram colaborar com as investigações.

A Viapar informou que cumpre todas as regras legais e está comprometida em atender ao contrato de concessão de rodovias de forma ética e transparente. A empresa disse estar à disposição das autoridades.

A Caminhos do Paraná reafirmou a regularidade de todos os ajustes de contrato. Informou que várias obras e investimentos foram incluídos no contrato, o que não é citado pelo MPF. A empresa reiterou seu compromisso com a ética e a transparência e sua confiança na Justiça.

A reportagem entrou em contato com o advogado Adriano Bretas, que representa Chiminazzo. Bretas informou que a defesa do ex-executivo da ABCR se manifestará nos autos do processo.

Hélio Ogama cumpre hoje pena de prisão domiciliar. O regime é um benefício obtido por ele por ter fechado um acordo de delação com MPF. O advogado Gabriel Bertin representa o ex-presidente da Econorte. Procurado, Bertin afirmou que Ogama já colaborou com as investigações e não tem nada a declarar sobre o assunto.

Errata: este conteúdo foi atualizado
João Chiminazzo Neto foi diretor regional da ABCR, e não diretor-presidente.

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